Mantras da irracionalidade são dogmas, conceitos e valores repetidos e assimilados por nossa sociedade que foram injetados em nossa cultura por estratégias de comunicação. São mantras que não nos pertencem, e que não resistem à uma analise. Muitos se surpreendem de repeti-los e ficam ainda mais surpresos em perceber que eles nunca foram questionados e que nunca foram construidos pelos indivíduos. O mundo a nossa volta esta cheio disto, aos poucos vamos revelando por aqui.
Vamos pensar um pouco em prosperidade, quem é prospero ou não em nossa sociedade e como avaliamos isto. Prosperidade é ter ou parecer ter? Prosperidade é ser ou parecer próspero? Somos prósperos ou meros coadjuvantes em um perverso sistema de poder? Mas afinal o que é prosperidade?
Prosperidade (do latim prosperitate) refere-se à qualidade ou estado de próspero, que, por sua vez, significa ditoso, feliz, venturoso, bem-sucedido, afortunado
Apolônio e Esnóbio
Imaginemos dois irmãos, Apolônio e Esnóbio. Apolônio nunca deu valor ao consumismo, mora na mesma casa no subúrbio há anos, é uma casa simples, mas muito confortável e espaçosa. Seu carro é um velho modelo 2005, mas está em boas condições, atende às necessidades de sua família. Apolônio leva uma vida confortável e sem sobressaltos. Esnóbio sempre foi ambicioso, mora em um apartamento em um luxuoso condomínio, a duas quadras da praia, seu carro é um modelo do ano, e leva uma vida agitada, trabalha muito e tem pouco tempo para a família, ao contrário de seu irmão Apolônio que tem a família em primeiro lugar.
Creio que você que esta lendo este texto já tenha feito juizo, então pergunto: Qual dos dois irmãos é o mais próspero: Apolônio ou Esnóbio? Não precisa responder agora, vamos continuar a história.
A esposa de Apolônio estava comentando com ele, que todo mês o irmão quer fazer uma retirada extra na empresa da família, eles são sócios em uma empresa de auto serviço. Apolônio já cansou de aconselhar o irmão à mudar seu estilo de vida, que se continuasse assim não haverá dinheiro suficiente para atender seus caprichos. Esnóbio invariavelmente respondia ao irmão que ele pensava pequeno e que nunca iria sair daquela casa do subúrbio e ia continuar andando com aquela “lata velha”. Apolônio não se importava, afinal nunca pensou em sair dali, a casa era boa, espaçosa e a vizinhança bem agradável. Como são sócios ambos fazem retiradas iguais, inclusive as extras. Além da sociedade com o irmão, Esnóbio da aula na faculdade a noite, ele enche os olhos dos alunos, como modelo de sucesso.
Agora você que esta lendo este texto tem condições de avaliar qual dos dois irmãos é o mais prospero? Então vamos continuar:
Apolônio comenta com a esposa que o irmão estava pagando quase 2 mil Reais por mês de condomínio, e ainda tinha a prestação do apartamento e do carro, que o irmão estava na verdada afundado em dívidas, trabalhava atrás do dinheiro e não na frente dele. Apolônio não conseguia aceitar o estilo de vida do irmão, achava que ele estava se tornando um escravo do consumo. Com sua casa e carros quitados, as retiradas de Apolônio estavam indo para aplicações da família, que todo ano viajava para o exterior, em especial este ano que o filho de Apolônio estava se preparando para fazer faculdade na França. O casamento de Esnóbio estava por um fio, sua esposa não podia aceitar o fato de não poder comprar um novo vestido para ir à festa da amiga socialite, e o filho do casal ainda não havia chegado do cursinho pré-vestibular, o menino estudava feito um louco para passar para uma faculdade pública, já que o pai falou que não iria pagar faculdade para marmanjo.
Veja você minha cara leitora e meu caro leitor, creio que não haja dúvida sobre quem de fato é próspero e quem não é. Nossa sociedade é assim, temos uma tendência enorme ao reducionismo, por conta disto somos vitimizados pelos mantras da irracionalidade. Esnóbio apesar de ter uma renda maior que Apolônio e apresentar sinais externos de prosperidade é na prática muito menos prospero que o irmão suburbano Apolônio. Imagino que não haja surpresa nesta revelação, mas vamos aos fatos.
A casa e o carro de Apolônio já estão quitados, apesar de ambos valerem 1/3 do valor do apartamento e do carro de Esnóbio, neste quesito o patrimônio de Apolônio é maior. O sistema é perverso, mesmo que Esnóbio tenha quitado 2/3 das parcelas do financiamento do seu carro, ele ainda esta devendo o valor do carro, mas o valor de compra e não de revenda, deste modo tudo que ele pagou até então no carro não teve impacto no seu patrimônio. O mesmo se dá com seu apartamento, ele esta pagando, mas ainda deve dois apartamentos. No caso de Esnóbio, ele não tem patrimônio algum, ele trabalha para girar a perversa roda do sistema bancário, que oferece crédito como se estivesse oferecendo deliciosas guloseimas para as crianças.
Desde que me entendo por gente vejo a tecnologia mudar o mundo à minha volta, os homens foram a lua, satélites e mais satélites, robôs nas fábricas, computadores, inteligência artificial, e muita ficção científica. Desde então a sociedade assistiu seu espaço ser invadido pela tecnologia. Tudo em nome do progresso que não poderia parar. Tivemos de assistir nossos postos de trabalho serem aniquilados, profissões dizimadas, e a tecnologia pouco a pouco ganhar o centro das atenções. Sindicatos, associações e outros representantes de coletivos foram a luta, mas sem sucesso, afinal o progresso não pode parar. O progresso é aliado do capital, o trabalho é despesa, o objetivo é o lucro.
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: a fita cassete vai acabar com a indústria fonográfica!
Pela ótica do capital esta tudo correto, quem lembra da reengenharia, um conceito até interessante, mas que fora usado como artifício para provocar a maior onda de demissões de todos os tempos. O capitalismo sempre foi focado no lucro, tanto que mão de obra até hoje é entendida como insumo, assim como os materiais, um orçamento sempre foi composto de insumos e lucro. Lucro este desejado, a palavra de ordem é competitividade, temos de ser competitivos, afinal o capitalismo é selvagem, e somente os mais competitivos sobrevivem. Entenda que não é nada pessoal, dizia o patrão ao demitir funcionários de longa data, é a busca pela competitividade e sobrevivência da empresa que esta em jogo, empresas não podem ter coração…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: O video cassete vai acabar com a indústria cinematográfica!
A Arte da Guerra do Pai rico, que virou a própria mesa antes do Safari de Estratégias do Príncipe, na busca de um monge que virou executivo. Até hoje não sabemos quem roubou meu queijo, e nem quem foi o Fora de Série que chegou no Ponto da Virada em Caminhos e Escolhas na busca de um Freakonomics. Mesmo que o Marketing seja Lateral ou vá além do Buzz, ou gerenciamos a experiência do consumidor ou tentamos entender a cabeça do Brasileiro. O líder do Futuro faz uma Liderança Radical, diz que Sobreviver não é o bastante e não gosta de Sundae de Almôndegas. Tanta coisa fora sistematizada para alavancar o progresso, para girar a roda da fortuna em prol da competitividade e do lucro.
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: O CD vai acabar com o LP!
Meados dos anos noventa, o fim do mundo estava próximo, o bug do milênio que assombrava todo mundo, na verdade era apenas mais um mercado construído em cima de dúvidas e incertezas. Estávamos sendo usados mais uma vez. As profecias diziam: o fim do mundo esta próximo! A Internet chegou, uma nova parafernália eletrônica que chega para divertir os nerds e conectar os acadêmicos, um espaço de poucos. A Internet chegou!
Como falavam em globalização! O mundo como uma maravilhosa aldeia global, onde todos consumiriam alegremente, anunciavam o inevitável fim da cultura local, e enalteciam as maravilhas de mundo globalizado. Na prática estavam alinhavando novos mercados, o progresso não pode parar! Aquele tênis bacana é produzido no terceiro mundo por mão de obra escrava com uma marca registrada nos “Staites” que valia mais do que custava o sapato, que não valia nada. Era o tal do insumo que ficou pequeno perto do lucro, a ciência do preço agora contava com um fator de subjetividade ainda não entendido, mas pouco importa, felizes consumidores pagavam lucros exorbitantes para ostentar seu mimo. As corporações cresciam, cresciam como nunca…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: Pirataria é crime!
B2B, B2C, G2B, G2C, A2Z; A2Z,G2B,B2C,G2C,B2B, e-learing, e-enterprise, e-commerce, e-gov, e-tudo. e-Siglas e letras 3 letras povoaram o vocabulário corporativo. A Economia Digital ensinava a Vender seu Peixe na Internet e tudo Fazia Sentido. Webonomics levou ao Net Gain, mas We the Media ainda não haviam estabelecido as Novas Regras da Comunidade. O capitalismo virou bits, o free shop ficou à dois cliques de distância, que beleza! Globalização! O mundo agora ficou pequeno, e todo mundo achando tudo muito lindo, não percebiam a intenção latente, a nova ordem era transformar empresas em mega corporações, maiores e mais poderosas que as nações…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: Agora quem manda são as corporações, afinal oferecemos aquilo que o fizemos desejar.
Descobriram o usuário, a Internet ficou popular, ficou fácil para qualquer um produzir, criar e compartilhar, deixem eles brincar diziam as novas nações-corporações, afinal o Culto dos Amadores não podem nos ameaçar. Mas as Novas Regras da Comunidade mostravam o Valor das Redes que através de seus Trust Agents corriam em busca de Socialnomics, mas na verdade estavam muito mais interessados no Group Genius. Esta sociedade conectada, alinhadas por ideologias eram vistas como excelentes oportunidades de negócios, afinal nichos e mega nichos sempre seduziram qualquer corporação em busca de novos mercados. Eles “brincavam”, faziam mashups, blogs, e se conectavam através de redes sociais. Excelente dizia o establishment, nosso plano de dominação vai de vento em popa…
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: O mundo de pontas esta se alinhando com o Manifesto Cluetrain.
Inteligência coletiva, cognição interativa, pensamento globalizado, juntos os usuários ficavam mais inteligentes, mais inteligentes que a soma das suas inteligências. Inteligência coletiva, crowdsourcing, dinheiro P2P, mobilização coletiva e o povo foi para as ruas sem um lider específico, sem uma pauta específica, a indignação mostrou sua cara. Era a crise da representativade que estava em jogo, era o modelo atual do mundo que estava em jogo, como diz Rushkoff, eles querem trocar o sistema operacional do establishment e dar um reboot geral.
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: O povo unido jamais será vencido!
Precisamos parar este trem diz o establishment preocupado, vamos estudar esta tal de Internet que agora quer nos pegar, vamos mudar a regra do jogo, vamos controlar as informações, basta dizer que pobres velhinhos são roubados na Internet, ou falar de pedofilia, ou ainda de gente pelada na rede, o velho discurso da pirataria não colava mais, mas TPP vem ai para nos vingar. Enquanto isto vamos dominar a infra-estrutura dizendo que Internet é telecomunicações, dizendo que Internet é um espaço de negócios e que deve seguir as regras do mercado, assim calamos nossos inimigos, e voltamos a lucrar como nunca.
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: Quem manda no seu pais somos nós!!!
Para quem não sabe o Brasil é excelência e pioneiro no modelo multistakeholder de Governança da Internet, considerado o melhor e mais democrático modelo de governança da Internet. E ainda temos os projetos de leis mais progressistas e modernos do mundo, se bem que os Patetas Digitais do Planalto fazem de tudo para estragar isto, mas vamos conseguir. Estes projetos são:
Marco Civil da Internet – Projeto construido com a participação da sociedade em duas consultas públicas e diversas audiências públicas e seminários, é um projeto de princípios legais da Internet, único no mundo, e que tem uma grande expectativa da comunidade Internacional. Este projeto atualmente esta na Câmara dos Deputados e ganhou Urgência Constitucional e deve virar lei ainda este ano. Seus principais “INIMIGOS” são as empresas de Telecomunicações e a Indústria do Copyright.
Reforma da Lei de Direito Autoral – Projeto construido com a participação da sociedade em duas consultas públicas, é um projeto de modernização da legislação de direito autoral, para torna-la compatível com os tempos atuais, com vistas ao uso justo e respeito ao ambiente digital e a cultura do mashup e licenças de uso modernas e à gestão coletiva de direitos autorais. Este projeto foi sensivelmente piorado durante a gestão da Ministra Ana de Hollanda. O projeto tem justamente a Indústria do Copyright e o ECAD como principais inimigos e ainda esta no poder executivo.
Proteção de dados Pessoais – Projeto construido com a participação da sociedade com consulta pública, é um projeto que visa estabelecer regras de como as empresas e governos usarão nossos dados pessoais. Este projeto esta paralisado no poder Executivo.
Por fim, é interessante observar nos links dos projetos de lei, que incontestavelmente eles pararam na gestão da atual Presidente Dilma…
Estamos vivendo um momento extremamente crítico, movimentos globais nas quatro arenas (vídeo abaixo): Legal, Comportamental, Técnica e de Governança estão atuando em conjunto colocando em prática diversas estratégias para o controle da rede. Os atores deste processo são facilmente identificáveis: Na esfera corporativa são os “atravessadores” do direito autoral e propriedade intelectual, as empresas de Telecomunicações, os bancos e a velha mídia. Na esfera governamental são as policias (em geral Federal), o judiciário, o executivo e o legislativo conservador. Estes atores atuam formando uma espécie de tripé que os sustentam, o Tripé do Atraso“, suas motivações são diversas, mas podemos reduzir a duas: dinheiro e poder.
Esta estratégia global de controle esta sendo conduzida com muita pressa, nas quatro arenas, e com planos de contingência em diversos níveis. Veja por exemplo que na arena legal tivemos a derrocada do SOPA no Congresso Americano e o surgimento do CISPA, o ACTA morreu na Comissão Européia, sendo negado pelo Parlamento Europeu, mas o TPP segue. O maior risco à liberdade na rede está justamente na arena da Governança da Internet, pois em geral a sociedade desconhece os princípios de Governança da Internet (vídeo abaixo, e um movimento efetivo nesta arena pode realmente tomar o controle da Internet.
Ainda dentro do conceito de Governança da Internet residem conceitos sutis e mal interpretados são eles o conceito de neutralidade e a a separação entre serviço de valor adicionado e serviço de telecomunicações. Muita gente confunde neutralidade da Internet, que é um conceito técnico que se resume em isonomia no tráfego de dados, com conceitos como o da imparcialidade, dentre outros. No vídeo a seguir eu explico o conceito da Neutralidade, um princípio de extrema importância para a Internet e que precisa seguir estritamente as recomendações do CGI.BR, para continuemos com a Internet livre e universal. Deixar que governos e/ou empresas regulamentem a neutralidade pode ser um grave perigo para a rede, uma vez que apenas interesses econômicos e de controle serão os motores desta regulação.
No primeiro vídeo falo do conceito e da importância de separar o serviço de telecomunicações do serviço de valor adicionado, no Brasil por exemplo as empresas de Telecomunicações jamais deveriam poder prover acesso, mas como o fazem, querem agora através de um discurso leviano passar a mensagem de que nunca houve estas duas camadas, e isto justifica por exemplo o esvaziamento do CGI.BR que é o orgão normatizador responsável pela camada de valor adicionado. No Brasil esta distinção foi estabelecida pela Norma 4/95 da ANATEL. O atual Ministro das Comunicações, o Paulo Bernardo, defende a mudança na Norma 4/95, mesmo sobre fortes críticas, uma vez que estas mudanças seguirem os interesses das empresas de Telecomunicações poderão trazer graves danos à Internet.
Coincidências a parte, a tendência em modificar dois importantes conceitos de governança: neutralidade e a distinção dos conceitos de valor adicionado e serviço de telecomunicações, parece fazer parte de um movimento global e local, a própria ITU (UIT) agência da ONU responsável pelas telecomunicações esta desde fevereiro discutindo a portas fechadas mudanças no ITR, o regulamento global de telecom. Do que a sociedade civil já sabe, questões muito arriscadas tem surgido, inclusive a tendência de trazer a governança para debaixo dos governos. A consolidação desta discussão se dará em dezembro em Dubai, e ativistas do mundo todo estão preocupados com os resultados, uma vez que o ITU discute basicamente com representantes dos governos, e não envolve outros atores da sociedade em seus debates. De forma preocupante vemos que esta tendência não esta ocorrendo apenas no Brasil e na ITU, nos Estados Unidos, o FCC por enquanto declinou de reclassificar a Internet como serviço de telecomunicações, mas ainda há risco. Resumindo parece estar havendo um movimento global para substituir o modelo multisetorial de governança, consolidado mundialmente como o melhor modelo, por um modelo focado apenas numa parceria entre o governo e as empresas de telecomunicações.
O Brasil possui um grande trunfo nesta luta que é o Marco Civil da Internet, considerado pelo Tech Dirt como um projeto de lei Anti-ACTA, e na verdade o Marco Civil pode nos proteger contra a maioria das ameaças, ou nos entregar de bandeja, tudo depende da redação que irá se tornar lei. Ciente disto o Ministro Paulo Bernardo em parceria com as Empresas de Telecomunicações fizeram um forte lobby e conseguiram esvaziar a sessão que iria vota-lo na Câmara dos Deputado no último dia 11/07. Ainda com base na redação mais recente, a regulamentação da neutralidade por decreto precisa ser mais bem detalhada, pois pode abrir uma brecha para a presidência simplesmente delegar esta função à ANATEL, através de decreto.
Ao que parece, o establishment tem pressa, muita pressa, pois eles sabem que seus argumentos e discursos envelhecidos não irão encontrar eco frente à geração digital, que os interpretam da mesma forma como interpretamos o discurso dos “caçadores de bruxas” da Idade média. O ano de 2012 é o ano onde milhões de nativos digitais completarão 18 anos, e esta onda seguirá ano apos ano até que uma nova cultura possa se estabelecer… será que vai levar tanto tempo?
Uma tese é que ao mesmo tempo em que as corporações e governos se mobilizam em um movimento transnacional para controlar a Internet, a sociedade civil se mobiliza para resistir, o aquecimento desta tensão poderá antecipar o fenômeno da Singularidade das Multidões, trazendo à sociedade conectada uma capacidade cognitiva e coletiva jamais imaginada, provocando em curtissimo espaço de tempo profundas mudanças na sociedade, incluindo a quebra em massa de velhos paradigmas e a instalação de novos valores, vivenciaremos um choque geracional tão intenso que representará uma ruptura no que hoje entendemos por sociedade, economia, cultura e política.
Hoje vejo a velha roda do lado de fora da gaiola e fico pensando, para que fui fugir da gaiola?…
Olho para o lado vejo hamsters felizes girando a roda como se não houvesse amanhã, suas gaiolas, muitas douradas são equipadas com um monte de tralha, quanto mais bonita e vistosa a gaiola, mais rápido gira a roda. Impressiona ver o hamster cansado se jogar da roda no sofá e ligar o Imbecilizador, onde uma programação audiovisual o leva para um mundo de sonhos e consumo, que mostra o quanto é bom consumir, consumir, consumir… Veja como são belos e felizes os hamster consumistas, veja só aquele hamster do lado, diz a esposa, eles tem um cagador turbo, grande e confortável, e nos aqui neste cagador pequeno, você não tem vergonha não?!
Vendo isto o hamster olha para o relógio e pula na roda de volta e corre como se fosse alcançar o próprio rabo, um desespero por um cagador… Chega finalmente o cagador novo na gaiola de nosso amigo hamster, um hamster sério e trabalhador que não tem tempo para muita prosa. Hoje é domingo, e o hamster vai tomar uma cervejinha e ver um futebol, afinal ele merece. Chega em casa bêbado e acorda de ressaca com a cabeça latejando toma um “estupidex” e vai para a roda, gira como ninguém, mas dai começa a pensar, para que pensar??? O hamster para, toma uma birita a volta para a roda, acha o maior barato girar junto com ela, toma outra e decide girar a roda ao contrario e logo toma um esporro do Bank hamster. Como assim, girar ao contrário, você tem noção do perigo que é ser diferente? Consuma, consuma! O bom e nobre hamster volta a girar a roda novamente, a esposa hamster respira aliviada, pois já esta pensando em pintar a gaiola de ouro. O cagador turbo já “orkutizou”, chique agora é ter a gaiola dourada, é o novo conceito em moradia diz a esposa hamster. Conceito do caralho! Resmunga o marido hamster pensando em como foi divertido girar a roda ao contrário, ria da cara do Bank hamster.
Neste domingo foi diferente, o hamster não foi tomar cerveja e nem assistir futebol, ficou apenas contemplando a roda pensativo… Preocupada a esposa hamster o reprimiu: Você não sabe que pensar é perigoso?! Em seguida ligou o Imbecilizador para tentar distrair o marido hamster, este bateu a porta e saiu sem dizer para onde ia. Mais tarde ele voltou com um livro debaixo do braço: “A roda” de Hamster Max. A esposa hamster aos prantos ajoelhou na frente do marido e implorou para que ele devolvesse aquele livro, ela lembrou o fim trágico de todos que provaram daquela droga. Olha a miséria meu amor, eles abandonaram a roda e ficam debatendo e estudando o tempo todo, nem mesmo possuem uma roda na gaiola, quando muito uma gaiola, são uns verdadeiros perdedores! A esposa implorou e o marido fingiu aceitar. Mais tarde ele pegou as ferramentas e montou um dispositivo na roda, agora ele pode pedalar e ler enquanto faz a roda girar, a esposa morria de vergonha afinal os maridos das amigas dela corriam elegantemente dentro da roda, já o nosso hamster parecia um pensador pedalando e debochando…
Nosso hamster saiu novamente e comprou livros e mais livros, lia e pedalava sem parar, a pobre esposa não sabia mais onde enfiar a cara. O hamster comecou a pensar novamente, a esposa coitada, não podia comprar aquela ração “premium plus ultra du kacete”, teve de comer milho. O nosso hamster, resolveu sair e bateu de gaiola em gaiola convocando os vizinhos para conversar sobre uma idéia que ele teve.
No dia seguinte a esposa hamster acordou assustada pois tinham um monte de hamster na frente da gaiola, e o marido falou, fica calma vamos nos mudar, e começaram a alinhas as gaiolas, colocando uma ao lado da outra, mas o pesadelo estava por vir…. bom pelo menos para a visão consumista da esposa hamster, para o nosso heroi um sonho sendo posto em prática… Ela comeca a ver que os outros hamsters estavam retirando a roda de suas gaiolas e colocando na frente e enchendo de terra…. chegam na gaiola de nosso hamster e ele encontra a esposa de malas prontas, dizendo você decide: ou a roda ou eu! Não preciso dizer que a Sra Hamster teve de ir para a casa da mãe dela. Enquanto isto os hamsters plantavam nas velhas rodas nosso heroi havia criado uma comunidade capaz de suprir-se sem a necessidade de girar a roda indefinidamente, ele percebeu que consumia um monte de bobagem inúteis, que na pratica ele não necessitava. O Imbecilizador foi trocado por um Inteligentador conectado na Internet. Pouco a pouco a idéia maluca de nosso heroi peludo foi sendo disseminada, o tempo vago agora era preenchido com leituras, debates e a produção de conteúdo para seus blogs, sem contar que tinham tempo de fazer o mais importante, de compartilhar amor e afeto e ver os filhotes crescerem e participar disto, sem ter de terceirizar com babas e escola como no passado.
Mas o Bank hamster não estava gostando nada disto, as redes de imbecilização falavam diariamente dos perigos da Internet e do compartilhamento. Precisavam calar os hamsters revolucionários! Os Bank hamsters discutiram várias estratégias e começaram a coloca-las em prática, primeiro junto com a rede de imbecilização tentaram confundir as pessoas. Diziam que os hamsters revolucionários eram produtores de “ratotóxicos”, e em nome da segurança trabalharam o mito de que as sementes plantadas em casa eram perigosas e poderiam ate mesmo produzir alucinações, por isto quem as consumia eram diferentes, agiam diferente, pensavam! Não colou! Muita gente estava trocando o Imbecilizador pelo Inteligentador e viram que a rede de imbecilizacao estava mentindo. Maldita Internet pensavam os Bank Hamsters, temos de eliminar a concorrência!
Os velhos e gordos Bank hamsters reuniram se em seu covil para discutir formas de parar estes hamsters revolucionarios. Chegaram a conclusão de que o maior perigo não eram aquelas tribos de hamsters “sem rodas”, poder estava mesmo é na Internet. Descobriram que os hamsters comuns usavam seus inteligentadores conectados à interner com a mesma eficiência dos imbecilizadores e sua rede decadente.
Perceberam que apenas os velhos hamsters, eram os poucos ainda controlados pelo sistema de imbecilização. Iniciaram a mais implacável campanha contra os Inteligentadores e a Internet, inventaram o “vicio em internet”, e para dar consistência ao factóide mostravam hamsters que haviam abandonado a roda por causa da Internet. Mostravam hamsters esclarecidos como sendo uma terrível consequência do excesso de informação, teve ate mesmo o Hamster Keen que escreveu um livro criticando os “sem roda” conectados, tentando provar que o modelo imbecilizante era melhor.
Vendo que não estavam surtindo efeito, os Bank hamsters se reuniram novamente, desta vez teremos de ser mais efetivos, temos de pensar numa forma de usar dogmas inquestionáveis para ter motivos para controlar a Internet, e dai surgiram os “maleficios” da rede foi um tal de falar em pedofilia e que hamsters velhinhos perdiam suas economias por causa de golpes virtuais. Isto parece ter colado, mas será o benedito que ninguém parou para pensar que não existe pedofilia na Internet, e que os velhinhos são vitimas do desconhecimento e não da Internet. O que tem na Internet é pornografia infantil, resultado de um crime de pedofillia cometido em algum lugar, combater a pornografia infantil somente não vai resolver o problema. A Universidade de Hamstarvard fez um estudo mostrando que o aliciamento de menores pela Internet era insignificante, e mesmo assim as vitimas em geral já foram vitimas de aliciamento presencial. A culpa não era da Internet e sim dos pais hamsters, que so se preocupavam em rodar a roda, e terceirizavam a criação dos filhotes! Se não fosse isto teriam tempo de conversar com seus filhotes para orienta-los na Internet, mas como se eles mesmo não sabem usa-la?
Os Bank hasmters estavam conseguindo avançar, disseminaram medo, incertezas e dúvidas. Novas leia para “proteger” os filhotes e o hamsters velhos surgiam, e eram combatidas pelos “sem rodas”, que passaram a usar a rede como um canal de contra-informação.
Mais uma vez os Bank hamsters se reuniram no covil, desta vez decidiram montar um verdadeiro plano de guerra, contrataram os melhores especialistas em Internet para desenvolver suas estratégias, perceberam que tinham de atuar em novas arenas, pois na legislativa era complicado, pois os “sem roda” sempre conseguiam ser ouvidos. Descobriram que regulamentar era mais fácil do que legislar, pois regulamento não precisa ser debatido. Mudaram de foco, na verdade abriram outras frentes, descobriram a governança da Internet, agora precisavam de uma forma de centraliza-la, assim tomariam o controle da Internet antes mesmo que os “Sem roda” pudessem fazer alguma coisa. E assim decidiram juntar esforços com as empresas de telecomunicações, dando a elas mais lucro em troca de mais controle da rede. Só bastava agora colocar o plano em prática.
Bank hamsters do mundo todo decidiram formar acordos internacionais para controlar a Internet, o controle é importante contra os “sem roda”. Redes sociais encantadoras foram cooptadas por reunir milhares ou até milhões de hamsters, formando verdadeiros jardins murados…. uma vez posicionados, em todas as arenas, os planos foram postos em pratica de forma simultânea, como se fosse uma verdadeira guerra, uma guerra desproporcional e com o objetivo de controlar o que antes era livre, uma guerra que tem por objetivo perpetuar o modelo da roda, o modelo que já não faz mais sentido. Não tem logica girar a roda continuamente, não queremos mais isto, fala o hamster revolucionario. Os ataques dos Bank hamsters são implacáveis, ao ponto do nosso revolucionário olhar para o lado e pensar: Quero voltar a ser um hamster burro, lobotomizado, não porque eu concorde com isto, mas porque já estou cansado desta guerra insana. Ao mesmo tempo percebe que sua mente não é mais a mesma, que agora ele é dono da própria subjetividade, e uma verdadeira dissonância cognitiva toma conta de seu corpo e sua alma, que o captura de seu momento de vacilo, para retornar a luta, a construção de um ideal, de um novo mundo do mundo dos hamsters sem roda….
Nota: Este texto foi criado num momento em que eu estava com um bloqueio de escrita, e brincando no Twitter produzi este texto, em pequenas pilulas de 140 caracteres em poucas horas.
Estamos em 2012, o mundo acaba agora no dia 21 de dezembro, aproveite! O mundo já acabou tantas vezes nos últimos anos que a cada “fim do mundo” ficamos mais céticos, já foram 242 previsões furadas desde o inicio dos tempos. Só de 1999 à 2012 tivemos 42, mas se tudo der errado os profetas ainda estão prevendo o fim do mundo para 2016, 2043 ou 2047… Vai que um dia alguém acerta!
Expectativas alarmistas sempre são um bom negócio, tem gente por ai fazendo bunkers e arcas para sobreviver ao fim do mundo, quantos não estão faturando muito com este novo fim do mundo? Lembra do bug do milênio e quanto a industria de TI faturou com o mito no final dos anos 90?
Previsões furadas a parte, o ano de 2012 carrega em torno de si uma aura de mudança, um importante conjunto de fatos e eventos que de uma forma ou de outra fará dele um ano marcante, um ano de transição, ou como diz a sabedoria Chinesa um ponto de mutação.
“Ao término de um período de decadência sobrevém o ponto de mutação. A luz poderosa que fora banida ressurge. Há movimento, mas este não é gerado pela força… O movimento é natural, surge espontaneamente. Por esta razão, a transformação do antigo torna-se fácil. O velho é descartado, e o novo é introduzido. Ambas as medidas se harmonizam com o tempo, não resultando dai, portanto, nenhum dano”
I Ching.
O ano de 2012 é realmente o ponto de transição, não a transição completa, mas o início irreversível dela, são a conjunção de vários fatores e eventos que juntos estão configurando esta mudança, a briga entre o novo e o velho existe há anos, e os mundos já estão em colisão desde o início do século como bem descreveu Nemo Nox em seu clássico Mundos em Colisão. No texto Nemo apresenta dois mundos: Planeta Alpha, onde a população desfruta de um ambiente de comunicação aberta e colaborativa; e o Planeta Ômega, onde as corporações têm controle quase absoluto sobre a informação que circula entre os habitantes, toda ela levando uma etiqueta com o preço de compra e as rígidas instruções de uso. O interessante de toda esta metáfora do “Mundos em Colisão” é que na verdade os dois mundos são um só.
O advento da Internet foi tão rápido e intenso que nós, os imigrantes digitais, fomos obrigados à adotar metáforas para entender e explica-lo: mundo real x mundo virtual. Uma dicotomia que fundamentou todo o debate desde 1994. Esta dicotomia sustentou leviandades, sustentou imbecilidades e pavimentou uma enorme gama de abobrinhas propaladas pelos neoludistas. O problema maior é quando estes neoludistas são políticos ou juristas, o preconceito pode causar desastres enormes como o famoso embate “Cicarelli x Youtube”, ou projetos de lei estúpidos como o AI5digital, SOPA, Hadopi e Sinde, só para citar alguns.
Medo e o preconceito são ingrediente de qualquer mudança, assim como a esperança e indignação, temos de admitir que a Internet teve um catalizador poderoso, pois as mudanças vistas nos últimos anos foram profundas e intensas. Este catalizador foi a comunicação, quem detê a comunicação, detém o poder, e a comunicação em rede além de poderosa é extremamente democrática, permitindo a todos fazerem parte de uma extensa rede não só de comunicação, mas também de construção cognitiva de conhecimento, uma vez que a Internet não é volátil.
Na edição 26 da Espírito Livre escrevi um artigo intitulado “A singularidade das multidões” onde desenvolvo a tese de que a tão falada singularidade tecnológica não se dará através do avanço da inteligência artificial, e sim da inteligência coletiva; e não serão as máquinas que dominarão o mundo e sim os nativos digitais.
Mas o que esta em jogo em 2012? Desde 2008 o mundo vem assistindo à uma crise de dimensões apocalípticas, diversos países do hemisfério norte estão com altas taxas de desemprego, e com grave recessão. O Brasil foi o último país a entrar na crise e o primeiro a sair, mas os países afetados pela crise estão caminhando de forma assustadora para uma espécie de neocolonialismo baseado em copyright, ou seja, estão super valorizando a questão do combate à pirataria e proteção da propriedade intelectual e direito autoral. SOPA, ACTA, HADOPI, Sinde e o famigerado AI5digital são exemplos claros de tentativas de controle da rede em nome deste movimento neocolonial. Os argumentos anteriores: combate ao ciberterrorismo, cibercrime e pedofilia estão perdendo força, mas no final das contas, o objetivo principal é controlar a Internet. Mas porque?
Em 2012 a Internet comercial completará 18 anos e junto com ela milhares de nativos digitais irão atingir a maioridade, mas quem são eles? Esta imprevisibilidade pode ser um dos motivos, quem lembra dos etnógrafos enviados à Campus Party pela Intel em 2009, estavam lá para pesquisar o comportamento dos nativos digitais, dos conectados. Creio que ainda não chegaram a uma conclusão de fato, pois a metodologia da etnografia em tempos digitais ainda esta em discussão. Sem dúvida alguma eles são diferente de nós os imigrantes digitais, sem a necessidade de transitar na dicotomia real x virtual, eles conseguem vivenciar a questão de que a Internet naturalizou e é tudo uma coisa só, a Internet faz parte do seu ecossistema. Certamente eles lidam melhor com as interações e construções em rede, eles pensam em rede, é como se nos fôssemos um programa rodando em linguagem interpretada e eles em linguagem compilada, estão revolucionando tudo, um perigo para o establishment!
É preciso adicionar um elemento a esta discussão, nem todo jovem de até 18 anos é um nativo digital, o letramento digital faz parte da sua construção, e este gap esta sendo reduzido em países que já perceberam que o seu maior ativo futuro esta justamente nos nativos digitais. Enquanto o Brasil esta ampliando este gap com seu PNBL neoliberal a R$ 35, com uma franquia de 300 MB por mês, e a sua pálida e inócua Secretaria Interministerial de Inclusão Digital; A India por exemplo esta ofertando à sua população banda larga à R$ 9,00 e Tablets a R$ 90,00!
A pesquisa “Digital Alternatives”, do Instituto Hivos, quebra alguns dogmas criados em torno do nativo digital, mostrando que existe uma grande pluralidade nesta parcela da sociedade, enterrando de vez as possíveis conclusões dos etnógrafos ai de cima. Todos os sinais apontam para um cenário muito bom, a pesquisa “O Sonho Brasileiro”, realizada com jovens de 18 a 24 anos, mostra alguns detalhes interessantes: 89% sentem orgulho em ser Brasileiro, 71% usam a Internet para fazer política e 75% pensam em fazer algo para o coletivo.
O debate amplia quando olhado por outros ângulos, entre 5 a 10% da população mundial será composta por este novo adulto já neste ano, e a maior concentração se dará nos países de terceiro mundo, quase a metade da população destes países esta abaixo de 18 anos. Enquanto nos países do primeiro mundo, a população esta envelhecendo e tende a ser mais conservadora, nos países do terceiro mundo, elas estão mais jovens e tendem a ser mais progressistas. Isto costura um cenário curioso, pois se de fato a “singularidade das multidões” ocorrer, ela será mais intensa justamente nos países de terceiro mundo.
As mudanças provocadas pela Internet estão sendo tão intensas e profundas que o próprio MidiaLab ressalta que não há nada que não seja afetado por ela, os intermediários entraram em crise, todos eles desde os partidos, sindicatos e até as grandes corporações. Crises precedem grandes mudanças, este ano veremos uma luta declarada, diferente da luta velada de outrora, contra a liberdade na rede, e uma outra ainda mais intensa no sentido contrário contando cada vez com a Inteligência das multidões, que vença o melhor!
Ao pensarmos em multidão imaginamos o caos, desorganização, confusão, contra produção. Assim foi por muitos anos no espaço da racionalidade. Práticas educacionais e corporativas buscaram na padronização o caminho para o progresso, alinhados à cultura da produção em massa da Revolução Industrial. Até mesmo o lema da nossa bandeira: Ordem e Progresso; parece nos remeter a esta lógica, uma lógica profundamente entremeada nos valores e princípios da sociedade do século XX. Praticamente uma verdade absoluta e intangível que serviu de base para a construção das estruturas sociais e organizacionais até então conhecidas: Hierarquia vertical, comando em cascata, broadcasting e o gênio solitário.
No final do século XX, os EUA abriram a Internet à humanidade, até então uma infra-estrutura tecnológica em rede que servia para a comunicação e armazenamento de dados entre acadêmicos e militares. Tim Berners-Lee adicionou à esta camada uma nova camada de comunicação, a WWW. A apropriação da WWW livre e a consolidação dos conceitos de usabilidade e acessibilidade, pavimentaram o que hoje chamamos de web 2.0. Se observarmos “fora da caixa”, tudo que evoluiu na verdade configurou na redução da curva de aprendizagem, e consequentemente facilitou enormemente o acesso, tornando as camadas tecnológicas da rede invisíveis. A partir dai a Internet transformou-se em uma rede de pessoas, iniciando um processo sem retorno de profundas mudanças em todas as esferas da sociedade.
Crowdsourcing, as multidões fazendo acontecer
O Software Livre é sem dúvida nenhuma o caso mais notável de crowdsourcing. É uma construção caótica de software, com uma organização sem lideres, e sem hierarquias, jogando por terra valores e princípios “inegociáveis” do século passado. Muitos ainda não entendem como é possível produzir desta forma, outros tantos nunca irão entender, pois teriam de destituir-se de velhos e sedimentados princípios e valores, e muita gente não esta disposta à isto. Ainda são do tempo do “Em time que esta ganhando não se mexe”, azar o deles? Não, esta resistência à mudança tem sido a mola mestra do ACTA e outras práticas daninhas à rede como o AI5 digital. Estes neoludistas enxergam a Internet como uma ameaça, e nós como uma oportunidade única. Estamos em rota de colisão.
A nosso favor estão as pessoas de mente aberta, como o Rob McEwen CEO da GoldCorp, uma mina de ouro Canadense, que em 1999 estava à beira da falência. Depois de encantar-se pelo espírito livre e desbravador do Linux, que ele assistiu em uma conferência no MIT. Apesar de seus funcionários e especialista dizerem que não era mais possível extrair ouro da mina, ele acreditou que alguém poderia ter a solução. McEwen criou o concurso Goldcorp Challenge, que prometia distribuir U$575.000 aos que tivessem as melhores idéias para extrair ouro. Rob compartilhou dados secretos, como plantas, mapas, estudos e tudo mais que fosse necessário. O resultado do concurso foi fantástico, além da economia, equivalente a três anos de funcionamento, foram identificados 110 pontos de extração, e metade deles jamais haviam sido identificados pela Empresa. A GoldCorp pulou de um faturamento de U$ 100 milhões por ano para U$ 2 bilhões.
O caso da GoldCorp é emblemático porque é um caso que os analógicos entendem, é um exemplo incontestável do poder das multidões. Outros casos interessantes estão se construindo à nossa volta, como os diversos projetos de crowdfunding, onde indivíduos investem e decidem coletivamente como o capital será aplicado. A Wikipedia é outro caso fantástico, bem como as próprias redes sociais, elas não são nada sem nossa participação, sem nos o Facebook, Orkut, Youtube e outros não seriam nada, apenas uma boa idéia. E o mais incrível e que continuamos a agregar valor à estas redes, pois não visamos o retorno material, nossas motivações são outras. O documentário Us Now nos mostra vários casos de crowdsourcing, até mesmo um time de futebol, o Ebbsfleet united, com mais de 30 mil donos e técnicos que decidem de forma colaborativa até mesmo a escalação do time. Us Now também mostra exemplos de auto-organização que apontam para novas formas de governo, de democracia participativa.
Na esfera do governo, temos projetos inovadores no Brasil, como as consultas públicas do Marco Civil da Internet , Reforma da Lei de Direito Autoral e outras. Estas consultas foram feitas de forma livre à população pela Internet, um caso digno de registro de crowdsourcing no processo legislativo. Por falar em processo legislativo, temos também no Brasil o e-Democracia, uma rede social ligada à Câmara dos Deputados, que permite discutir temas em destaques e propor novos temas para debate. Ainda não temos nenhum projeto de colaboração como o Challenge Americano, onde diferentes órgãos do governo, apresentam problemas à sociedade e recompensam financeiramente àqueles que apresentam as melhores soluções.
O Crowdsourcing.org é uma rede social especializada no crowdsourcing, e identifica basicamente sete grupos de estudo do tema:
Crowdfounding – Financiamento coletivo;
Cloud Labor (Trabalho em nuvem) – Aproveitamento de grupos virtuais de trabalho, disponíveis sob demanada para a realização de tarefas e projetos;
Collective Creativity (Criatividade coletiva) – Uso de grupos de talentos para desenvolvimento original de arte, design, mídia e conteúdo;
Open Innovation (Inovação aberta) – Uso de fontes externas à entidade ou grupo para gerar, desenvolver e implementar ideias;
Collective Knowledge (Conhecimento coletivo) – Desenvolvimento de células de conhecimento e informação a partir de grupos distribuidos de colaboradores;
Community Building (Construção de comunidades) – Desenvolvimento de comunidades através de grupos que compartilhem das mesmas paixões;
Civic Engagement (Engajamento cívico) – As ações coletivas que tratem de questões de interesse público.
Como vemos, ainda estamos começando a usar o poder das multidões, as pessoas estão começando a entender que juntas possuem um poder ilimitado, que não dependem dos intermediários e representantes. Governos e corporações também estão entendendo…
Individuo coletivo
Nos meus tempos de criança acreditávamos na figura do gênio solitário, filmes e desenhos animados nos mostravam cientistas isolados do mundo e acompanhados de um assistente burro, uma bela metáfora. É impressionante, mas hoje em dia muita gente ainda acredita no gênio solitário, tivemos nossas subjetividades subjugadas como sempre. Felizmente o mito do gênio solitário esta sendo derrubado nos tempos digitais do século XXI, avise aos “analógicos” da sociedade! Scott Berkun, ex-engenheiro da Microsoft, em seu livro “The Myths of Innovation” joga este conceito por água abaixo, e de quebra ainda enterra a idéia de que grande inovações vieram por epifania. Berkun explora uma questão muito importante, e que nos simplesmente sublimamos: Não estamos sozinhos, o ser humano é um ser social. Seja qual forma as idéias irão tomar, se produto material, imaterial ou bem cultural, elas são da coletividade. As idéias são construídas em coletividade, o “dono” dela tem sido aquele que consegue sistematiza-las ou utiliza-la para um propósito específico. O legado do século passado ainda insiste no fato de que as idéias são do primeiro a registrar a sua patente.
Somos parte da multidão, somos construtores da subjetividade coletiva, assim como nossa subjetividade é produto desta construção. Para ser mais correto, podemos afirmar que somos prosumidores de nos mesmos e ao mesmo tempo de todos nossos peers, que também são nossos prosumidores. No século passado isto era entendido pelo provérbio que dizia que “o homem é produto do meio”, mas o meio mudou, e o provérbio mostrou-se incompleto. Hoje podemos dizer que “o homem é produto do meio e o meio é produto do homem”, isto num ciclo crescente de construção cognitiva e coletiva do conhecimento. Quanto mais conectada a sociedade, mas visíveis ficam velhos conceitos que estão sendo subjugados, estamos quebrando velhas regras com uma voracidade incrível. Hoje entendemos que somos feitos de células, e a nossa “alma” de colaboração. É preciso entender que somos todos “eu” coletivo, que carregamos em nos um pouco de cada um, e vice versa.. Isto vale para tudo, saber, negócios, política e informação, ninguém é alguém sozinho. É preciso entender que o conhecimento pertence à sociedade, e que esta, e somente esta, tem a capacidade e o direito de transforma-lo de forma nunca antes imaginada na história da humanidade.
Os seis graus que nos separam
O importante fator das profundas e definitivas mudanças que estamos passando em nossa sociedade é o fato de estarmos novamente conectados em rede, novamente porque muito provavelmente estivemos conectados em rede quando ainda selvagens. A natureza irracional e burra esta repleta de exemplos de estruturas em rede, colméias, formigueiros, movimentos dos mares, planetas, e até mesmo nossa estrutura celular e neural! O homem civilizado cometeu um grande equivoco ao confundir a seletividade evolutiva com a organização estrutural das diversas sociedades, aprendemos equivocadamente que necessitamos de uma estrutura de poder vertical, poucos pensam e muitos executam, mais uma bela metáfora do capitalismo. Estão sempre buscando lideres em tudo…
Albert-László Barabási é um estudioso de redes, matemático, sistematizou esta estrutura e conseguiu provar matematicamente a teoria dos seis graus de separação. Segundo Barabási, apesar de seremos milhões conectados em rede, estamos de fato, distantes de qualquer outro por apenas seis pessoas. Barabási explica que as estruturas de redes são complexas e os hubs são indispensáveis ao funcionamento destas estruturas. Hubs por exemplo são indivíduos com alto capital social, ou sites e serviços populares. Os hubs são atalhos entre os milhões de nós da rede, de qualquer rede.
Fritjof Capra, compila no livro “A Teia da Vida”, várias contribuições da física, da matemática e da biologia para a compreensão dos sistemas vivos e, especialmente, de seu padrão básico de organização. Capra identifica a rede como esse padrão comum a todos os organismos vivos. “Onde quer que encontremos sistemas vivos – organismos, partes de organismos ou comunidades de organismos – podemos observar que seus componentes estão arranjados a maneira de rede. Sempre que olhamos para a vida, olhamos para redes. (…) O padrão da vida, poderíamos dizer, é um padrão de rede capaz de auto-organização”. Em seu livro “As Conexões Ocultas”, Capra tenta aplicar os princípios apresentados em “A Teia da Vida” na análise de fenômenos sociais – como o capitalismo global, a sociedade da informação, a biotecnologia e os movimentos contra-hegemônicos da sociedade civil.
A singularidade será das multidões
Conforme a Wikipedia, singularidade tecnológica é a denominação dada a um evento histórico previsto para o futuro, no qual a humanidade atravessará um estágio de colossal avanço tecnológico em um curtíssimo espaço de tempo. Vários cientistas, entre eles Vernor Vinge e Raymond Kurzweil, e também alguns filósofos afirmam que a singularidade tecnológica é um evento histórico de importância semelhante ao aparecimento da inteligência humana na Terra. Ainda não existe consenso sobre quais seriam os agentes responsáveis pela singularidade tecnológica, alguns acreditam que ela decorrerá naturalmente, como conseqüência dos acelerados avanços científicos. Outros acreditam que o surgimento iminente de supercomputadores dotados da chamada superinteligência será a base de tais avanços.
Na minha opinião a singularidade não será tecnologia, e sim das multidões, quanto maior a penetração da Internet na sociedade e quanto mais intensa for apropriação do crowdsourcing, mais rapidamente teremos as mudanças. Estas mudanças tenderão a ser de forma exponencial, não significa que mais um participante produza um incremento unitário, mas sim que este incremento leve em conta que o crowdsourcing é um processo retro-alimentando. Desta forma, nesta equação temos de considerar o que já fora construído e o potencial agregador e construtor do novo player, considerando inclusive seu capital social. Capital social este determinado em função da rede de relacionamento e do poder interativo e comunicacional deste indivíduo. Esta singularidade se dará na intensa construção cognitiva e coletiva do saber, potencializando ao máximo o conceito da Inteligência Coletiva sistematizado pelo filósofo Pierre Levy. Este fenômeno se dará possivelmente no momento em que a geração digital atingir a maturidade. Esta geração terá todos os conjuntos de afinadades, dogmas e valores para o processo pleno da construção e uso da Inteligência Coletiva, caracteristicas estas que nos imigrantes digitais não temos e nunca teremos, mas teremos o privilégio de vislumbrar o nascimento de uma nova sociedade infinitamente mais inteligente que a nossa, e profundamente interconectada, mudando radicalmente o mundo que conhecemos.
Uma vez entendido isto, podemos imaginar o tamanho do poder que a sociedade conectada poderá vir a ter, numa matriz dos poderes instituídos, este seria o quinto poder. Hoje temos os três poderes do Estado: Executivo, Legislativo e Judiciário que são poderes locais, e o quarto poder que é o corporativo que é enorme e transnacional e atualmente exerce uma enorme força sobre os Estados. Se levarmos em conta de que das 100 maiores economias do mundo, 51 são corporações. Dá para sentir o tamanho da força do quarto poder, eles simplesmente são mais poderosos que as nações. Entretanto o poder das corporações é avaliado em função do capitalismo, e da cultura da escassez. Douglas Rushkoff avalia que o capitalismo é na verdade o “sistema operacional” da sociedade, e que assim como ele no passado substituiu o “sistema operacional” vigente, nada impede que ele venha a ser substituído em breve, e a minha tese da singularidade das multidões prevê isto como citado no parágrafo anterior. Thomas Greco, em seu livro “The end of money and the future of civilization” coloca mais lenha na fogueira, mostrando que o modelo capitalista é auto-destrutivo e insustentável e que a partir da crise de 2008, a coisa só tende a piorar. Greco aponta na direção que estamos tomando. Mas o que virá depois do capitalismo? Segundo o Professor Giuseppe Cocco o que esta se construindo é o Capitalismo Cognitivo, uma forma de capitalismo que tem o conhecimento e a informação como principais riquezas e valoriza as competências cognitivas e relacionais.
Mesmo antes da troca do “sistema operacional” da sociedade, veremos o quinto poder chegar a um patamar de igualdade ao quarto. Se configurarem as previsões, as mudanças serão profundas e alavancarão o quinto poder como o maior poder da sociedade, ou seja, a própria sociedade conectada será o seu maior poder. Temos movimentos políticos e sociais acontecendo pelas multidões conectadas, o Mega Não e o Ficha Limpa no Brasil, 15-M na Espanha, o Stop Acta a nível mundial e troca de poder no Egito só para citar alguns. Os sinais estão por ai, e os envolvidos estão cientes e tomando suas providências, eles tem pressa. Em 2012 teremos a maior idade de uma parcela significativa da geração digital, eles tem pressa, muita pressa.
Existe vida em um planeta muito distante, pesquisadores estudam a história de sua espécie. Descobriram que a vida inteligente surgiu do continente de Akuarelus, onde a milhares de anos, eram todos indivíduos verdes. Viviam inicialmente do extrativismo e eram nômades, e assim foram migrando pelo planeta. Aos poucos foram evoluindo, construindo ferramentas, descobrindo a agricultura a pecuária e deixaram de ser nômades, instalaram-se em diferentes locais do globo. Isto se deu ao longo de milhares de anos, e os indivíduos verdes foram evoluindo geneticamente, adaptando-se a sua nova condição e ao seu ambiente. Em alguns lugares ficaram amarelos, em outros azuis e em outros continuaram verdes, na verdade existia uma intensa matriz de cores entre o azul e o amarelo, mas todos, apesar da cor, eram biologicamente iguais, a cor era uma consequencia da adaptação ao meio ambiente.
Esta civilização continuou evoluindo, a liderança não se dava mais pela força, e sim pela habilidade intelectual, e principalmente pela sua experiência. Os indivíduos continuaram vivendo em grupos, e seus descendentes continuavam nas mesmas vilas, que logo se tornaram cidades. Nestas cidades culturas se formavam, cada cidade, cada pais com suas crenças e valores, e em sua maioria todos eram da mesma cor, eram todos “iguais”.
Alguns exploradores amarelos, agora providos de cavalos e curiosidade, seguiam viagem em busca de novas civilizações, em seu material genético e em sua história não constava mais a origem de sua espécie, não tinham como entender o movimento migratório que ela fez, e muito menos o que o motivou. Certo dia um grupo de exploradores encontrou uma vila, viu que nela existiam indivíduos azuis, ficaram curiosos em conhecer estes indivíduos, que logo demonstraram sua curiosidade recíproca. Se olharam, se tocaram, com a curiosidade de quem nunca havia imaginado que existiria indivíduos diferentes. Estavam ai descobrindo os diferentes, e com esta descoberta veio a dúvida: Quem será a civilização mais avançada?
Os exploradores amarelos observaram que os azuis viviam de forma mais simples, em casas menos arrojadas, e com simplismo concluíram que os azuis eram menos evoluídos, e pior, que eram inferiores. Por outro lado no sistema de valores dos azuis quem era menos evoluído eram os amarelos, que não sabiam mais caçar e muito menos seguir os rituais dos azuis. Eram civilizações diferentes, com crenças e valores diferentes, construídos por motivações exclusivas e ligadas ao ambiente em que estavam inseridos. Os exploradores amarelos retornaram a sua cidade, e ao chegar falaram de uma estranha civilização de azuis.
Não se falava em outra coisa, só se falavam dos diferentes, e assim um mito estava sendo construído, estavam conceituando os azuis, ou melhor estavam construindo um preconceito a cerca dos azuis. A ignorância e o preconceito construíram uma péssima imagem dos azuis, na verdade todo este preconceito já era direcionado aos diferentes, e ai neste contexto se inseriu um novo diferente, os azuis.
Anos depois um grupo de exploradores azuis chegou à cidade, achando que iriam encontrar os amáveis amarelos que conheceram, sua cultura concebeu um preconceito positivo dos amarelos, chegaram à cidade de peito aberto e foram recebidos sob intenso ataque. Perplexos recuaram e ficaram imaginando o que poderia estar acontecendo, porque razão eles foram recebidos daquele jeito? Porque tanta hostilidade? Os exploradores azuis retornaram a sua cidade e ao chegar falaram da hostilidade dos amarelos, e um novo preconceito se construira, era mal entendido sobre mal entendido, no final das contas a hostilidade agora era bilateral.
Como em toda sociedade, existem críticos e pensadores, que acabam construindo um sistema de crenças e valores diferente de seus iguais, curiosamente dois grupos de dissidentes, um azul e um amarelo resolveram deixar suas cidades para criar uma nova cidade, uma cidade onde a cor não faria parte do sistema de valores, e onde todos são iguais. Esta vila de azuis e amarelos cresceu e se tornou uma grande cidade de cidadãos verdes, diversos tons de verde, e com o passar do tempo poucos eram os indivíduos azuis ou amarelos. Os pouco que existiam eram imigrantes da cidade dos azuis ou da cidade dos amarelos, novos dissidentes.
A cidade dos verdes vivia pacificamente, enquanto a hostilidade entre os azuis e amarelos crescia sem parar, os cidadãos das duas cidades já agiam de forma irracional, atacavam qualquer diferente que via pela frente, os azuis não podiam entrar na cidade dos amarelos e vice-versa. A hostilidade estava ficando paranóica, os amarelos enviaram uma mensagem para os verdes para não acolherem mais indivíduos azuis, o mesmo fizeram os azuis que pediram aos verdes para não acolherem mais amarelos. Os verdes que não tinham hostilidade contra nenhuma outra cor, e muito pelo contrario, faziam questão de ignorar este detalhe da pele, responderam que além de não acatar com o pedido dos amarelos e dos azuis, estavam abertos para receber dissidentes das duas cidades.
Azuis e amarelos entraram em guerra, e dentro de um estado de excessão existe muita permissividade, soldados azuis se relacionavam com mulheres amarelas e soldados amarelos com mulheres azuis. No fim da guerra houve um intenso baby boom, de bebês verdes. As duas cidades agora tinham cidadãos diferentes, filhos de seus iguais com “aqueles malditos” soldados inimigos. As pobres crianças verdes sofreram todo tipo de discriminação, cresceram sob esta égide, eram culpados até prova ao contrário. Tudo que acontecia de errado era culpa dos malditos verdes.
Os verdes adultos casaram com amarelos, azuis, ou até outros verdes, misturando cada vez mais as cores, com o tempo existia um grande núcleo verde em cada cidade, mas infelizmente continuavam sofrendo preconceito, inclusive os azuis e amarelos que casavam-se com os verdes. Um sistema claro de separação de cores foi instalado, de forma a garantir que ainda existiriam azuis e amarelos puros, pois estes verdes eram os “vira lata” da sociedade.
As cidades dos azuis e dos amarelos não tinham o sistema de valores da cidade dos verdes que por não ter conflitos evoluia vertiginosamente. Com a evolução, com o poder, chegara a arrogância, agora os verdes eram de fato superiores aos amarelos e azuis, e passaram a ser a sociedade dominante, os diferentes agora eram os amarelos e os azuis. Não demorou muito para o poder dos verdes romper com os valores liberais construídos durante séculos, começaram a tratar os cidadãos amarelos e azuis como cidadãos de “segunda categoria”, passaram a impedir sua entrada em sua cidade.
Tudo isto acabou unindo as cidades dos azuis e dos amarelos, que ao longo dos tempos foram se relacionando até que poucos azuis e amarelos restaram no planeta. Todos voltaram a ser verdes, todos iguais, e agora? Quem são os melhores?
Rituais de magia branca de olhos azuis e amarela de olhos puxados ainda tentarão dar sobrevida ao defunto inutilmente. Seus comparsas, a mídia golpista (PIG) tentarão ocultar o cadáver, mas a sociedade conectada, o quinto poder, irão mostrar a todos onde esta o corpo fétido. O establishment irá negar enfáticamente sua culpa no assassinato:
– Foram os emergentes!
– Foram os emergentes!
Eles dirão na mais manjada estratégia Maquiavélica, afinal o Inferno são os outros ja dizia Sartre.
Seus orfãos, os Bancos e Mega Corporações irão tentar, através do legado da privataria promovida pelo neoliberalismo, instalar o “neocolonialismo“, tentando extrair vorazmente da turma de baixo suas riquezas. Entretanto o povo de baixo já não é mais tão subserviente ao império, e a queda 2.0 da nobreza colocará o mundo de cabeça para baixo.
O capitalismo cognitivo, onde as pessoas são o centro e não o dinheiro, vazara de baixo para cima, trocando o “sistema operacional” da sociedade como prefetizou Rushkoff, e veremos uma profunda e gratificante mudança na sociedade, onde o pensar e agir coletivo é a normalidade como bem diz Shirky.
A nota acima foi inspirada pelo infográfico da divida americana, que mostra a divida total de 114,5 trilhões de dolares. Segundo o infográfico, um cidadão médio levaria 92 anos para acumular U$ 1 milhão, logo seriam necessário que 114.500.000 de americanos trabalhem 92 anos para pagar a dívida. Como a estimativa de vida do Americano esta em 78 anos, uma regra de três simples nos leva ao número de 135.051.282 cidadãos, o que equivale a quase 44% da população daquele país. Some-se a isto a crise que assola a Europa, onde a dívida impagável da Grécia é apenas a ponta do Iceberg e veremos um quadro dantesco.
Thomas Greco em seu livro “The End of Money and the Future of Civilization” ja preconizava isto, afinal o capitalismo vive de endividamento, somos todos endividados e não prosperos como nos fazem crer. Estamos sempre trocando de dívidas, e isto leva a um ponto onde o endividamento se torna uma escala logarítmica, que tende ao infinito, promovendo uma verdadeiro “stall”.
Então prepare-se vamos entrar em uma grande turbulência, a aeronave vai cair, mas muitos sobreviverão…
Nota: Depois de publicar este texto aos sete ventos sem me certificar do valor da dívida americana, fui informado que ela é de U$ 15 trilhões e fui averiguar e vi que na verdade 114,5 trilhões de dolares é o valor emprestado a descoberto pelos bancos americanos, o que na prática acaba dando no mesmo. A figura acima mostra dois “edificios ao lado da estatua da liberdade, o menor é equivalente à pilha de cédulas de U$ 100,00 da dívida americana e o maior que o World Trade Center é o total do empréstimo à descoberto dos bancos americanos.
Para quem pensa que os ataques são o real perigo que ronda a Internet, vamos deixar claro que não, o perigo maior é a criação do Momento Hobbesiano que a mídia esta fazendo. Ela fala de “onda de ataques” antes mesmo dos sites brasileiros terem sido atacados, como quem segue um script, o clima midiatico nos faz ter esta percepção subjugando nossa subjetividade como já sabemos. A mídia, ou melhor o PIG, este mesmo que cria maniacos como o Assasino de Realengo, agora esta querendo criar mais um factoide, factoide este sumariamente dizimado pelo Altiere Rohr.
Veja o video abaixo que produzi para o Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas com base na palestra que proferi no Encontro Estadual de Blogueiros Progressistas em Belo Horizonte no início deste mês, e entenda as reais ameaças que cercam a Internet, e surpreenda-se.