A confirmação do assédio pelo Silvio Almeida foi tão surpreendente quanto a confirmação de Frank Le Rue. Ambos são figuras que construíram um capital simbólico a ponto de nos levar a questionar as acusações contra eles, em um primeiro momento.
Uma vez confirmado o assédio, inicialmente há a perplexidade, mas logo em seguida ela vai se transformando em receio e medo, pois afinal pessoas “acima de qualquer suspeita” foram capazes de tal ato. Os estereótipos caem por terra, e nos deixam mais cautelosos e menos preconceituosos, afinal assediador não tem cara, pode ser qualquer pessoa.
Pode-se culpar uma educação machista que eles tiveram, que eu tive, e muitos outros de minha geração. Todos construíram seus conjuntos de valores, a questão aqui esta no senso de humanidade destes valores, a humanização do outro nos torna mais humanos, nos grita que o outro é igual a você, esta é a diferença. E você não se agrediria.
Temos ai uma questão importante, humanizar o próximo, na contramão do individualismo e competitividade que são os alicerces do modelo neoliberal onde estamos inseridos, que produzem o que Mark Fisher denominou de Realismo Capitalista, que é a percepção de que neste campo as coisas são o que são, e não há nada a fazer.
Mas há sim! Podemos questionar as bases deste modelo, nos rebelar contra ele, impor nossa humanidade como principal linha de pensamento e ação. Ir conta a “gamificação” do trabalho, típico da economia de aplicativo, dar um game over nisso.
Podemos não perceber, mas a humanidade esta caminhando aceleradamente para sua extinção, acredite.
Noam Chomsky, em Internacionalismo ou extinção, detalha com profundidade a possibilidade de extinção da humanidade por uma catástofre nuclear, risco aumentado pela emergência do extremismo de direita, que se baseia em atribuir aos humanista (esquerda) os problemas do neoliberalismo.
Ainda sobre individualismo e desumanização temos chamado plano B do neoliberalismo, as igrejas neopentecostais da teologia da prosperidade, hoje teologia do domínio, e sua aproximação gutural com o extremismo de direita e o fascismo.
Entenda que o indivíduo é o resultado de suas decisões e ações ao longo da vida, o ambiente e a conjuntura contribuem ao limitar as possibilidades, mas não moldam o caráter.
Uma das maiores aberrações deste século são as igrejas neopentecostais. Não me detive a estuda-las a fundo, apesar de ter lido “A farsa da Igreja Evangélica“, sempre tive a percepção de que seguem um modelo detalhadamente planejado de cooptação intelectual. Marketing, psicologia e neurologia seguramente foram utilizados neste planejamento.
Uma suposta igreja que se diz seguir as ideiais de Lutero, que defendia a ideia de que justamente as igrejas e suas indulgências eram inúteis, que as pessoas poderiam apenas se unirem, mesmo que em prece, de onde estiverem, para praticar a “religação”.
Mas as aberrações neopentecostais se valem de templos que ostentam luxo e riqueza e comercializam suas caríssimas indulgências, desde meros feijões mágicos a terrenos no céu.
Outra questão curiosa e que criaram um modelo de competitividade, onde o individualismo através de sua aceitação e conquista de capital social em relação a seus pares passou a ser mais importante do que a “religação”. O pensar e agir coletivo mudou para o pensar coletivo e agir individual, isso explica como este modelo de igreja se tornou materialista. Seus membros não mais praticam a “religação!”, mas objetivam ganhos materiais individuais prometidos pelos lideres àqueles que se destacarem entre os seus.
Isto talvez explique como uma igreja que se diz cristã, se posiciona ideologicamente contra os princípios comunistas de Jesus, e o fazem de tal forma que encaram os “comunistas” como inimigos, engrossando o caldo daqueles que são contra o comunismo, mas não fazem a menor idéia do que de fato sejam as idéias comunistas.
Este deslocamento da Janela de Overton, dentro desta suposta religião é tamanha, que em 2018 não só fizeram campanha, com mão de arminha inclusive, como votaram num sujeito que sempre se mostrou a antítese do cristianismo. Agora além de termos cristãos anti-comunistas, temos cristãos anti-comunistas, armamentistas e facistas, que num paradoxo delirante, que na mesma intensidade se posiciona contra o aborto e apoia a idéia armamentista e a violência contra aqueles que rotulam de “satânicos”.
Isto é realmente perigoso, porque na lógica que se está construindo, qualquer um pode ganhar este rótulo de satânico, a começar pelos comunistas, que assim são rotulados sem nenhum critério concreto, apenas por discordarem deles.
Este perigo se mostrou evidente, quando da união impensável destas igrejas com o crime organizado e as milícias no Rio de Janeiro, uma verdadeira bomba prestes a explodir a qualquer momento.
Como se não bastasse um determinado político publicou um vídeo nas redes sociais fazendo justamente esta associação entre satanismo e comunismo, e de forma sutil pregando a eliminação destes pura e simplesmente. O assustador disto foi termos um líder de uma destas igrejas não só compartilhando estes vídeo, como incentivando tais idéias delirantes.
Por conta da emergência sanitária que vivemos, onde o Brasil se tornou o epicentro da crise com números absurdos de óbitos, e sob o risco de uma verdadeira catástrofe sanitária ainda maior, o lockdown se tornou uma das medidas urgentes e indispensáveis. E este lockdown incluiu as igrejas e templos religiosos, todos eles.
O mais impressionante foi uma ação movida por juristas evangélicos pela abertura das igrejas, indiferente à situação calamitosa que vivia o país. E de forma monocromática, o Ministro do STF, indicado pelo atual presidente da república acatou e determinou a reabertura destas igrejas.
O resultado disto, é que esta decisão bate de frente com outra decisão conjunta da corte, que da autonomia para prefeitos e governadores em suas politicas de combate a pandemia em suas regiões administrativas. E isto provocou um alvoroço nas redes sociais, onde usuários e principalmente robôs estão associando prefeitos e governadores que optaram por manter as igrejas fechadas, mesmo depois da decisão do ministro, de comunistas.
Estamos caminhando para um momento muito bizarro, onde o país governado por um sujeito que preza a morte e a tortura — inclusive não esconde este apreço de ninguém — é adorado por seguidores destas igrejas, que sob o comando de seus lideres, parecem estar caminhando para um perigoso conflito, em favor…. da morte….
Não podemos deixar de registrar, os ataques ao bispo de Aparecida, da Igreja Católica, ao proferir em seu discurso o combate a fome e a miséria, que foi logo chamado de comunista, por uma horda de imbecis bolsonaristas (que se intitulam patriotas, cristãos e conservadores), bêbados, segurando suas latas de cerveja e fantasiados de patriotas. Estes ataques se espalharam pelo país, numa sinalização clara de que uma guerra santa estava por vir, sob a égide do “mito”, que felizmente não foi reeleito.
O mais impressionante, é que estes templos neopentecostais que transformaram a fé, a “religação”, em algo semelhante a uma mistura do show do milhão com o baú da felicidade, e sempre encontraram o demônio em todo lugar, quando o encontram de verdade, o chamam de mito, e o seguem cegamente.
No passado surgiram falsos profetas no meio do povo, como também surgirão entre vocês falsos mestres. Estes introduzirão secretamente heresias destruidoras, chegando a negar o Soberano que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruição. Muitos seguirão os caminhos vergonhosos desses homens e, por causa deles, será difamado o caminho da verdade. Em sua cobiça, tais mestres os explorarão com histórias que inventaram. Há muito tempo a sua condenação paira sobre eles, e a sua destruição não tarda. 2 Pedro 2:1-3
Uma das maiores aberrações deste século, no meu entender, são as igrejas neopentecostais. Não me detive ainda a estuda-las a fundo, mas sempre tive a percepção de que seguem um modelo detalhadamente planejado de cooptação intelectual. Marketing, psicologia, neurolinguística e neurologia seguramente foram utilizados neste planejamento.
Uma suposta igreja que se diz seguir os ideais de Lutero, que defendia a ideia de que justamente as igrejas e suas indulgências eram inúteis, que as pessoas poderiam apenas unirem, mesmo que em prece, de onde estiverem, para praticar a “religação”.
Mas as aberrações neopentecostais se valem de templos que ostentam luxo e riqueza e comercializam suas caríssimas indulgências, desde meros feijões mágicos a terrenos no céu, passando por uma infinidade de objetos “ungidos”.
Outra questão curiosa e que criaram um modelo de competitividade, onde o individualismo através de sua aceitação e conquista de capital social em relação a seus pares passou a ser mais importante do que a “religação”. O pensar e agir coletivo mudou para o pensar coletivo e agir individual, isso explica como este modelo de igreja se tornou materialista. Seus membros não mais praticam a “religação!”, mas objetivam ganhos materiais individuais prometidos pelos lideres àqueles que se destacarem entre os seus.
Isto talvez explique como uma igreja que se diz cristã, se posiciona ideologicamente contra os princípios comunistas de Jesus, e o fazem de tal forma que encaram os “comunistas” como inimigos, engrossando o caldo daqueles que são contra o comunismo, mas não fazem a menor idéia do que de fato sejam as idéias comunistas.
O deslocamento da Janela de Overton, dentro desta igreja é tamanha, que em 2018 não só fizeram campanha, com mão de arminha inclusive, como votaram num sujeito que sempre se mostrou a antítese do cristianismo. Agora além de termos cristãos anti-comunistas, temos cristãos anti-comunistas e armamentistas, que num paradoxo delirante, na mesma intensidade se posicionam contra o aborto e apoiam a idéia armamentista e a violência contra aqueles que rotulam de “satânicos”.
Isto é realmente perigoso, porque na lógica que se está construindo, qualquer um pode ganhar este rótulo de satânico, a começar pelos comunistas, que assim são rotulados sem nenhum critério real, apenas por discordarem deles.
Este perigo se mostrou evidente, quando da união impensável destas igrejas com o crime organizado e as milícias no Rio de Janeiro, uma verdadeira bomba prestes a explodir a qualquer momento.
Como se não bastasse um determinado político publicou um vídeo nas redes sociais fazendo justamente esta associação entre satanismo e comunismo, e de forma sutil pregando a eliminação destes pura e simplesmente. E o assustador disto foi termos um lider de uma destas igrejas não só compartilhando estes vídeo, como incentivando tais idéias delirantes.
Por conta da emergência sanitária que estamos vivendo, onde o Brasil se tornou o epicentro da crise com números absurdos de óbitos, e sob o risco de uma verdadeira catástrofe sanitária ainda maior, o lockdown se tornou uma das medidas urgentes e indispensáveis. E este lockdown incluiu as igrejas e templos religiosos, todos eles.
O mais impressionante foi uma ação movida por juristas evangélicos pela abertura das igrejas, indiferente à situação calamitosa que vive o país. De forma monocromática, o Ministro do STF, indicado pelo atual presidente da república acatou e determinou a reabertura destas igrejas.
O resultado disto, é que esta decisão bate de frente com outra decisão conjunta da corte, que da autonomia para prefeitos e governadores para politicas de combate a pandemia em suas regiões administrativas. E isto tem provocado um alvoroço nas redes sociais, onde usuários e principalmente robôs estão associando prefeitos e governadores – que optaram por manter as igrejas fechadas, mesmo depois da decisão do ministro – a comunistas.
Estamos caminhando para um momento muito bizarro, onde o país governado por um sujeito que preza a morte e a tortura — inclusive não esconde este apreço de ninguém — é adorado por seguidores destas igrejas, que sob o comando de seus lideres, parecem estar caminhando para um perigoso conflito, em favor…. da morte….
A começar pela vida, não estamos de mimimi e nem se trata de uma gripezinha, mais de três mil liberdades individuais estão sendo perdidas todos os dias. Muitas delas como você, usufruíram da liberdade individual de não se proteger, e foram infelizes ao pagar com as próprias vidas, mas outros não tiveram escolhas, foram vitimas da sua liberdade individual, que não sabendo ser assintomático, ou até sabendo estar doente, contaminou aquele com quem interagiu.
É a pobre coitada que trabalha no caixa do supermercado que se contaminou de você que já não aguentava mais usar a máscara e a colocou no queijo e tabulou um papo animado com a sua próxima vítima.
Mas pode ser também a liberdade perdida do papai, da mamãe, tios ou avós, que pagaram com a vida, o seu direito de viver! Que mal tinha em tomar uma cervejinha com os amigos no boteco não é verdade?
Aquela balada clandestina, onde você beijou geral, e agora está ai entubado, jovem, e não pensou que receberia uma altíssima carga viral no beijo da morte daquela gata sensacional.
Alias sorte daquele que consegue ser entubado, mesmo que 80% dos que são entubados morrem de Covid, conseguir uma vaga na UTI está se tornando impossível, uma vez que os hospitais públicos e privados estão no limite.
Alias existe um sério problema aqui, pois hospitais e UTIs não funcionam sozinhos, ainda não chegamos a este nível de automação, existem humanos como você, que estão literalmente presos por conta da sua liberdade. São médicos, enfermeiros e toda equipe de limpeza e manutenção dos hospitais que estão com suas liberdades suspensas, porque você não pôde abrir mão da sua liberdade nem por um momento.
São humanos que tem família, amigos e amam as vida assim como você, mas estão na frente desta luta, como heróis anônimos, abrindo mão de estarem em casa com as pessoas que ama, para cuidar até de você, que pegou Covid na balada. Se você esta estressado com isso tudo, imagine eles? Que passam o dia todo no limite, expondo-se o tempo todo ao vírus, tentando salvar mais uma vida, e tendo de se conformar com aquelas que não pode salvar. Pense que eles não irão poder chegar em casa e abraçar a família, beijar os pais e filhos e cônjuges, pois estão sempre na iminência de estarem contaminados.
São pessoas como você, só que não descansam e nem desfrutam de um minuto de prazer, estão no limite, muitos adoecem e até morrem, na luta pela sobrevivência de pessoas como você.
Já estamos ha mais de um ano nesta luta, consegue imaginar-se, mesmo que por um segundo sendo um destes heróis?
Pois é, e ainda temos de implorar para que os governos tomem uma providência, aqui no Rio de Janeiro, por exemplo, juntaram feriados e serão dez dias de lockdown, “nas coxas”, porque fora do município do Rio, bares e restaurantes estarão abertos, mas até mesmo aqui, academias de ginástica e igrejas abrirão ao público. Nem para fazer um lockdown decente nossos governantes prestam. Estes lockdowns “Nutela”, não resolvem o problema e ainda ajudam na construção da narrativa de que lockdown não funciona. Funciona sim, se bem feito, Araraquara que nos diga.
A mídia, de forma totalmente irresponsável chamou o lockdown do Rio, de super feriado, e pessoas que amam suas liberdades individuais caíram nas estradas, lotando cidades vizinhas, espalhando o vírus de forma ainda mais eficiente.
Não sei onde isso vai parar, mas se continuar assim, é sentar e esperar até a hora em que não existam mais brasileiros…
Não sou fã de reality shows, tenho muitas críticas a estes tipos de entretenimento, mas em casa minha família acompanha todos eles. É BBB no almoço, na janta e depois também. As conversas sobre o reality são constantes por aqui. Não tenho como ficar de fora, muitos temas sensíveis surgem nestas conversas, e esta edição em especial está com um contingente grande de participantes negros. Segundo o IBGE, 54% da população brasileira é negra, e esta edição do reality tentou manter esta proporção.
A questão não é meramente matemática, mas sim o que está acontecendo na casa.
Não conheço o processo de seleção, mas acredito que devam existir avaliações psicológicas e psicograficas que permitam à direção do programa conhecer profundamente a personalidade dos participantes. Uma vez conhecidos, montar as possíveis dinâmicas esperadas no programa é uma questão simples para profissionais especializados em psicologia e sociologia.
O jovem e simpático Lucas foi o primeiro negro a ser ofertado ao achincalhe dos participantes, em especial dos participantes negros, que formaram o que esta sendo conhecido por “eixo do mal”. Lucas foi “cancelado” a partir dos ataques da psicologa e ativista Lumena, e sofreu assédio moral da cantora egocêntrica Karol Konca. O ataque ao Lucas se tornou ainda mais intenso a partir do momento em que ele e o Gilberto se beijaram. A pressão insuportável feita pelo eixo do mal, em especial pela própria Lumena, se deu em torno do questionamento da orientação sexual do rapaz, que não aguentou a pressão e pediu para sair do programa.
O episódio provocou uma verdadeira ebulição emocional no público que acompanha o reality. Se isto fosse um filme, é nesta hora a câmera iria cortar para mostrar o regozijo do vilão. Por falar em vilão, lembrei do fato, onde um vazamento mostra o audio do “Boninho” falando com o Projota sobre o Lucas, e ele diz: “O Lucas é um bom menino, mas ele omitiu que tinha problemas com a bebida. Quando ele bebe se transforma num monstro”.
Vamos parar um pouco, e olhar para os detalhes…
A refundação dos estereótipos
É impressionante a capacidade de refundar e reforçar estereótipos justamente quando a intenção é desconstrui-los. Pode ter sido a intenção da produção do programa criar uma oportunidade para trazer estas questões para o debate público, mas o que tem ocorrido tem sido o oposto.
Existem no âmago da sociedade brasileira inúmeros estereótipos que são repetidos e reforçados diariamente num processo recursivo que os fixa em nosso inconsciente, a ponto de acessa-los de forma automática.
Leonard Mlodinow no livro Subliminar diz que 95% da nossa capacidade cognitiva funciona de forma automática, e é para este campo da automação que estes preconceitos sedimentados vão.
Um exemplo interessante deste processo recursivo de consolidação de estereótipos em precoceitos pode ser tirado do livro Weapons o math destruction da Cathy O’Neil. Em determinado momento ela cita o PredPol, um sistema de inteligência artificial capaz de prever onde estão ocorrendo mais crimes com base no registro de delitos. O sistema foi usado pela policia de Los Angeles, que acabou delimitando as regiões de população mais pobre e negra como as regiões violentas. Isto ocorreu porque o próprio preconceito dos policiais foi assimilado pelo sistema, ao relatarem qualquer delito destas regiões, mesmo aqueles irrelevantes como pequenos furtos, e ao mesmo tempo relevarem delitos até mais graves em outras regiões, eles enviesaram os dados do PredPol.
Existem outras questões subjetivas que nos fazem reforçar nossos preconceitos, como diz o estudo da “Espiral do Silêncio” conduzido pela pesquisadora Elisabeth Noelle-Neumann em 1974. Segundo o estudo as pessoas optam por omitir-se, aceitando a opinião vigente do grupo, com receio de serem isoladas socialmente. Ou seja, aceitam os estereótipos e preconceitos construídos por seu grupo social, como medo de serem excluídas.
Ainda pelos submundos da mente humana, nosso processo cognitivo é repleto de automações, que nos fazem processar informações e tomar decisões de forma mais rápida. Estes processos são chamados de “heurísticas”, e já foram identificadas mais de 100 tipos diferentes, e estas heurísticas acabam reforçando nossas crenças, sedimentando ainda mais nossos preconceitos. Você já deve ter ouvido fala do “Viés de Confirmação”, que é uma heurística, que diz que tendemos a aceitar como verdade aquilo que dialoga com nossas crenças, e refutar tudo aquilo que a contraria. Outra heurística que acho pertinente aqui, é o viés da disponibilidade, que diz que tendemos a tomar decisões e conclusões com base nas informações imediatamente disponíveis em nossos esquemas mentais. Se estamos o tempo todo recebendo reforço de nossos preconceitos, é fácil concluir quais serão estas informações.
Percebe-se ai, o quanto estes estereótipos reforçam preconceitos, e quão profundo estes preconceitos permeiam o tecido social e a mente do indivíduo, dificultando muito sua desconstrução.
Ain! Que gente chata!
O primeiro passo para avançar contra estes estereótipos é enfrenta-los e desconstrui-los. Na prática toda luta de vitimas destes estereótipos se baseia nesta tarefa. E na verdade, todos somos vitimas de estereótipos e preconceitos em algum nível, nos colocando na posição de indignado.
Indignai-vos! Uma breve obra onde Stephane Hessel, explicita a necessidade de nos mantermos indignado. Para ele, muito da indignação é atrelada a eventos histórico, tornando-a pontual, porém defende que a pior das atitudes do ser humano é a indiferença, e a capacidade de indignar-se é completa quando integrada a capacidade de construir um altruísmo através da empatia. Stephane defende também a não violência e a insurreição pacífica como caminhos a serem trilhados nessa luta chamada vida.
Na prática, o processo de reação e desconstrução é pleno em emoções, e cria uma atmosfera pesada, colocando todos os demais no lugar comum de algoz. Desta perspectiva surgem as expressões como luta contra o patriarcado pelas feministas, ou luta contra as regras da branquitude no tema em questão. Isto em um micro ambiente social, como a casa do BBB acaba criando um ”clima pesado”, levando os participantes a pisarem em ovos, cuidando para serem politicamente corretos.
Para quem está do lado de fora, a leitura é “Ain! Que gente chata!”, não pode nada!
E é exatamente esta narrativa que esta sendo construída, a leitura fora do contexto de construção de políticas públicas é exatamente este. Não que este comportamento seja errado, ele é desejado, em políticas públicas o papel dos radicais é importante para podermos deslocar a janela de consenso para uma posição mais favorável.
Mas dentro de um reality é a pior coisa a ser feita, parafraseando Paulo Freire, o sonho do oprimido é tornar-se opressor, mas só o amor constrói. Se tivesse um participante experiente em políticas públicas, como o Diplomata Rômulo Neves que participou em outra edição, ele certamente faria o papel de mediador, transformando os embates em produtivos debates.
A experiência em politicas públicas nos faz perceber a distinção entre os indivíduos e suas representações no embate, nos permitindo separar as pessoas de suas personas. Outro aspecto é compreender que o dialogo é a raiz do consenso, e que o consenso é a única forma de evoluir. Todo resto é desperdício de energia.
Talvez a primeira coisa que os ativistas deveriam buscar compreender são todos os aspectos que forjam estes estereótipos e preconceitos, e não apenas os aspectos cognitivos como descrevi acima, mas também históricos, culturais, sociais, regionais, econômicos e políticos.
Mapeando os atores de suas interlocuções poderiam identificar formas de expor os efeitos de uma cultura opressora dentro de um contexto que o próprio opressor, ou representante do grupo opressor, possa perceber, ativando sua empatia.
Por exemplo, certa vez li um relato em uma rede social de uma menina que toda vez que pegava um taxi ou um Uber, ao entrar fingia estar falando com alguém, passando os dados do carro e do motorista, e avisando que chegaria em tantos minutos. O relato dela passava por outras práticas de segurança comuns em festas e até mesmo para andar sozinha na rua. Aquilo me assustou, eu sou homem hetero, faço parte do estereótipo do patriarcado. Mas eu senti mesmo, e me impressionei quando vi a quantidade de comentários e interações de outras meninas relatando suas práticas ou confirmando fazer o mesmo, aquilo me encheu de vergonha de pertencer a um estereótipo opressor, e mudou completamente a minha compreensão do que é ser mulher em uma sociedade machista.
Este é o gancho, este é o caminho pelo amor, como diz Paulo Freire, e não violento como apregoa Stephane Hessel.
Em resposta, quando Lumena falou que era desconstruída, e que não queria cozinhar porque cozinhar esta associado ao estereótipo do negro, a resposta dos outros participantes deveria ser a negação do estereótipo, melhor que desconstruir um estereótipo, é dissolve-lo em conjunto com todos, independente de quem for. E esta dissolução é trabalho de formiga, e deve começar em casa, em primeiro lugar deixando de usar a palavra “negro” como adjetivo…
Não estou querendo acabar com a festa de ninguém não, mas 2021 não vai ser fácil, mesmo que tenhamos milhões de doses de vacina contra o coronavírus disponíveis já em janeiro.
A ausência de um plano de vacinação dialoga perfeitamente com um ministro da saúde que não é da área, e com um presidente que brinca de rei e acredita mais nas abobrinhas de sua mente do que na ciência. Estes irresponsáveis fizeram um estoque de cloroquina para mais de 100 anos, quando deveriam estar fazendo estoque de agulhas e seringas.
De nada adianta termos milhões de doses de vacina se não temos como aplica-las, segundo especialistas serão necessárias ao menos 300 milhões de conjuntos de seringa e agulhas para vacinar a primeira dose da população pouco superior a 200 milhões de brasileiros. As vacinas escolhidas até então no país necessitam de duas doses, e o governo também comeu mosca nos acordos com outros fabricantes, se fosse um governo sério teria feito acordos com todos.
Os fabricantes necessitam de SETE meses para fabricarem 300 milhões de seringas, se ao invés de cloroquina, o governo tivesse feito estoque de seringas estaríamos numa boa, mas agora iremos esperar na melhor hipótese até Agosto de 2021 para voltarmos a normalidade.
Mas estes não é o único problema, o país nunca fez uma campanha de vacinação desta dimensão, é uma empreitada única, e ao que parece o MS deu ao um veterinário a coordenação da tarefa.
Vacinação não é um ato individual, é necessário imunizar entre 60 à 90% da população para atingir o efeito desejado e erradicar a cepa atual do coronavírus, quanto maior a cobertura imunizatória, maiores as chances de não termos novas ondas com novas mutações do coronavirus, tal qual na gripe. Mas estamos vendo ai o próprio presidente, do topo de sua ignorância, fazendo campanha contra as vacinas e contra o ato cívico de vacinar-se.
Da para continuar dissertando sobre as falhas e riscos, muita coisa pode dar errado, e com esta falta de compromisso, estratégia e especialistas, esta chance é muito maior, e seria um luxo imaginar que teremos planos de contingência.
O governo esta dando muita chance ao azar, e provavelmente também seremos reconhecidos mundialmente como a nação com o pior plano de imunização do planeta. E provavelmente continuaremos isolados do mundo, uma vez que presumo que assim como hoje é com a febre amarela, o certificado internacional de vacinação contra a COVID será exigido nas fronteiras deste mundão. E teremos condições e credibilidade para emitir este certificado?
O ato de egoísmo dos promotores do MP de São Paulo ao tentarem buscar previlégio para vacinação pode ser um sinal de que esta disputa poderá se multiplicar, e tem uma razão para isso, pode faltar vacina pra muita gente. Não sei se isto poderá provocar algum tipo de convulsão social, mas a possibilidade é bem concreta.
A estratégia de vacinação atende a critérios científicos e técnicos, mas é difícil prever isto em um país governado por um presidente que despreza a ciência e tem aparelhado as instituições estratégicas da saúde, cultura e educação, com replicadores de sua própria ignorância.
Não consigo imaginar um bom cenário para 2021, vejo mais quebradeira, mortes, e a economia caindo a níveis nunca vistos, isto porque é impossível prosperar e consumir em um ambiente tão incerto.
A conta vai ser muito alta, acredito que o país levará décadas para se recuperar… de sua própria ignorância…
Eu cresci na zona sul, e depois em um condomínio de classe média alta e jacarepaguá, e confesso que analisando o “ambiente” em que cresci, compreendo claramente esta viralatice insana que ganha as redes.
A adoração aos Estados Unidos sempre esteve nos centros dos debates de nossos pais e vizinhos, porque lá era lindo, porque a faxineira americana tinha carro, porque lá as coisas funcionavam, porque o povo era limpinho, porque lá não tinha pobreza. E este discurso passava de pai para filho, toda minha geração foi contaminada com esta perspectiva cultural. Alias ai está o gancho!
Desde o pós guerra, os Estados Unidos exportaram seu mais importante ativo, a cultura americana. O engrandecimento da indústria cultural americana, e digo cinema, música, e até basicamente tudo que liamos quando criança. Eu mesmo lia todas as publicações das Disney e tinha todos os manuais que foram publicados. O sonho do viralata americano começava desde pequenino.
Ícones, valores e símbolos americanos permearam a cultura da tal classe média de uma forma que a única forma de se sentir no primeiro mundo era se tornando americano, abdicando da própria nacionalidade brasileira. Me lembro de minha tia comentar perplexa que a vizinha dela na Gávea ostentava orgulhosa a foto do filho brasileiro, com uniforme da marinha americana. Muitos amigos sonhavam mudar para os Estados Unidos, até eu sonhava em ser americano.
Não percebia como estes valores eram entregues nos filmes, revistas em quadrinhos e até nas músicas, só achávamos aquilo fantástico. We love america! Tínhamos vergonha de ser brasileiros, isto criou uma imagem curiosa, ninguém podia ver alguém falando inglês, sem lhe dar logo o status de celebridade. Quantos americanos das classes mais baixas não se sentiram assim em terra brazilis?
Muitos de minha geração foram para a “america”, e agem como se americanos fossem, apesar de estarem presos entre dois mundos, o de que nunca serão americanos de fato, e o de que nem brasileiros. São os intermundos, mas se estão felizes, que sejam.
Esta mesma classe média, ou seria melhor, mérdia, foi incapaz de se enxergar como primeiro mundo, quando no governo Lula, o Brasil se tornou a 6a maior economia, e tínhamos um respeitoso reconhecimento como nação emergente e progressista, eu mesmo vi isto por várias vezes nos fóruns da ONU que participei por anos. Essa classe mérdia pedia desculpa por nossa ousadia, pois até o ministro da Cultura, o Gil revolucionou o valor da cultura brasileira mundo afora, que ousadia!
Curioso ver que esta mesma classe mérdia que achava o máximo a faxineira andar de carro nos EUA, ficava indignada com a faxineira andando de carro e avião por aqui, e a gota d´água foi quando o filho da faxineira entrou na faculdade e o da patroa não.
Na verdade dentro deste ambiente social se cultivava uma noção de status e valores que não condiziam com os nosso valores brasileiros, brasilidade passou a ser brega, chique mesmo é ser americano. Isto criou uma estranha vergonha de nossos valores.
Olha, mérdia por mérdia, eu acho os EUA uma merda, a única coisa boa de se fazer por lá é compras, eu descobri isto depois de rodar o mundo, até a Africa é mais interessante, e a Europa, não da nem para comparar com os EUA, sem dúvida, depois do Brasil, a Europa é um continente interessante.
No fim das contas, vamos o país ser destruído por um presidente totalmente despreparado, mas legitimo representante desta classe mérdia da barra da tijuca, que prefere ser viralata dos EUA do que ter orgulho de ser brasileiro. Isto explica comportamentos bizzaros da família que conduz o país a deriva, e seu amor subserviente aos EUA, e as manifestações pró Trump dos viralatas que não aceitam ser brasileiros, mesmo que nunca serão americanos, apenas idiotas úteis…
Recentemente Leandro Demori publicou um texto no The Intercept,
apontando evidências de que a emergência extremista é um projeto
global. No texto ele aponta algumas coincidências nos discursos de
representantes dos governos Italiano, Húngaro e Brasileiro.
Segundo
Demori, na Italia, assim como no Brasil há uma perseguição contra a
educação, e o que eles chamam de doutrinação marxista. Ainda segundo
Demori:
Salvini,
Bolsonaro e Orbán são políticos da nova onda de populismo de extrema
direita. Não é coincidência que seus inimigos sejam os mesmos:
professores (e jornalistas, “o comunismo”, George Soros etc). Todos
estão seguindo um manual extremamente previsível de anti-iluminismo.
O texto de Demori não é muito longo, mas apresenta pistas que precisam ser investigadas.
Também
não há dúvidas da influência pela manipulação das mídias sociais,
através de fake news impulsionadas por bots e perfis fakes, com a
precisão cirúrgica do microtargeting, tendo como principal mentor Steve Bannon, que esteve envolvido na campanha de Donald Trump nos EUA e Bolsonaro no Brasil. e há forte evidências de seu envolvimento no Brexit.
Para
colocar mais um elemento nesta questão, o economists Eduardo Moreira
denuncia em um vídeo no Youtube, que o governo brasileiro está querendo
sumir com as informações oficiais.
No
vídeo o Eduardo demonstra que os links que pesquisava sumiram do
Google, antes os resultados eram os primeiros, depois sumiram. O fato me
chamou a atenção para um detalhe.
O que pode esta havendo com relação ao Google e estas informações que estão sumindo, pode ter relação com o decreto 9756/19,
que “centraliza” os endereços de internet de diversos órgãos do governo
(URLS). Isto somado a mudança do nome de alguns ministérios impacta
sensivelmente em muitas URLs do governo, mudando-as completamente. Pelo
decreto, projetos, secretarias, e outros que possuíam seus próprios
endereços de Internet, passam a ser meras pastas sob o endereço do
ministério. É importante destacar que para desaparecer com informações
na Internet, basta eliminar os links, e no caso do Google isto é feito
internamente quando há alguma denuncia ou ordem judicial, ou pela perda de relevância do conteúdo linkado.
O
decreto muda significativamente diversas URLs e URIs do governo
federal, derrubando sua visibilidade em ferramentas como o Google. Ao
mudar as milhares de URLs e URIs, elas perdem “relevância” no Google,
pois os webcrawlers que constroem e mantém a sua base de dados, irão
encontrar uma enorme quantidade de links quebrados, que levam à página
não encontrada ou conduzem a um excesso de redirecionamento, como no
exemplo do fazenda.gov.br que agora é economia.gov.br.
O
índice de visibilidade do Google, se assemelha ao ranking de artigos
acadêmicos, ou seja, quanto mais citações melhor a avaliação. Como os
endereços das citações quebraram, o ranking das informações procuradas
cai.
O
decreto, com validade a partir de sua publicação em 11 de Abril de
2019, em edição extra do Diário Oficial, parece atender ao timming
perfeito, dificultando o acesso a informações importantes relacionadas
aos temas relevantes como a Reforma da Previdência e Reforma Tributária.
Além de inúmeros temas secundários. Os endereços do governo brasileiro
na Internet vão levar algum tempo, que pode se estender por alguns
meses, para recuperar sua relevância e visibilidade na Internet.
Coincidências
ou não, o que parecia ser um decreto inútil e sem sentido, esta
servindo como uma gigantesca cortina de fumaça para esconder informações
relevantes do governo.
Se
há ou não um cérebro invisível por trás desta emergência extremista, é
importante identificá-lo o quanto antes, sabe-se lá o que está por trás
desta onda de anti-iluminismo descrita por Demori, espero que não seja
uma nova idade das trevas…
O General Villas Boas gerou um grande desconforto, ao dizer em uma entrevista, que a “legitimidade do novo governo pode até ser questionada”, despertando a preocupação com uma possível nova ditadura. Na sequência, o General Mourão diz que uma constituição não precisa ser feita por eleitos do povo. A despeito dos questionamentos políticos, legais e constitucionais relacionados à estas declarações, temos uma preocupação adicional: Como seria a vigilância em uma ditadura no Brasil de hoje?
Uma ditadura no Brasil de hoje provavelmente seria menos violenta, porém, através do uso massivo de inteligência, seria implacável, sutil e invisível, detectando rapidamente qualquer movimento ou padrão que signifique ameaça, muito antes de se tornar uma. Em termos de matriz de força será extremamente desproporcional, com todo poder ao vigilante e quase nenhum ao vigiado, um verdadeiro pesadelo para qualquer cidadão e qualquer democracia.
A intensidade e profundidade desta vigilância será limitada pela permeabilidade obtida pelo governo ditatorial junto às empresas de aplicações de Internet, operadores de rede, comunicação e segurança. Uma simples mudança de protocolo, ou instalação compulsória de dispositivos, burlariam qualquer restrição técnica ou legal deste acesso, por parte do governo.
Em termos práticos, seremos vigiados 24 horas por dia, sete dias por semana, inclusive à noite, enquanto dormimos. A intensidade e profundidade desta vigilância será limitada pela permeabilidade obtida pelo governo ditatorial junto às empresas de aplicações de Internet, operadores de rede, comunicação e segurança. Uma simples mudança de protocolo, ou instalação compulsória de dispositivos, burlariam qualquer restrição técnica ou legal deste acesso, por parte do governo.
No contexto atual, a mobilidade e o crescente desenvolvimento tecnológico, são os motores do sofisticado sistema de vigilância. Algumas das novas armas da ditadura serão a Análise de Redes Sociais (ARS), Homofilia, Psicometria, inteligência artificial, machine learning, muita mineração de dados, e construção de padrões por deep learning. Em linhas gerais todo e qualquer cidadão brasileiro estaria suscetível a esta nova vigilância, dificilmente alguém estaria fora de seu alcance.
É um padrão de vigilância que você provavelmente nunca imaginou, nem nos seus piores pesadelos. Imagine que o governo saberá que você está lendo este texto agora, a partir de qual dispositivo, qual a sua localização, se existem outras pessoas próximas a você, quem são, e se estão acessando algum serviço on-line, ou mesmo assistindo TV.
Além disto, o governo, por conhecer seu perfil psicométrico, suas particularidades, princípios, valores, e sua rede de relacionamento, saberá valorar o texto que esta lendo, e como você o processará cognitivamente. O governo também saberá quais pessoas de sua rede de relacionamento leram o texto, e qual valor deram a ele, e quais interações se deram em torno dele.
Por falar em rede de relacionamento, estas poderão ser mapeadas, mesmo que nunca tenham sido configuradas explicitamente, mesmo que você nunca tenha adicionado determinadas pessoas em sua rede social, na sua agenda de telefones, e somente as tenha contatado pessoalmente, é possível pelas tecnologias atuais inseri-las em suas redes, simplesmente por estarem próximas a você, seguindo um padrão posicional.
Em linhas gerais, você não fará nada sem que o governo saiba, ele pode não estar focado em você, mas os seus dados estarão sendo coletados, tratados, comparados, transmitidos e armazenados.
O governo saberá o que você vê, lê, ouve, compra, com que frequência, e com quem se relaciona, por onde anda, onde trabalha, mora, estuda, se diverte, se tem carro, ou como se desloca no meio urbano, ou seja, saberá toda sua rotina. O governo também saberá sobre seu relacionamento, estado civil, orientação sexual, se tem um ou mais parceiros, DST, problemas e dificuldades de relacionamento. Também terá acesso a seus dados fisiológicos e de atividades físicas, se você utiliza smartwatch ou faz algum registro online destas atividades. Em linhas gerais, você não fará nada sem que o governo saiba, ele pode não estar focado em você, mas os seus dados estarão sendo coletados, tratados, comparados, transmitidos e armazenados.
Este padrão de vigilância trabalha sobre o big data, e não sobre o indivíduo, e o foco da vigilância se dará sobre os padrões, ou seja, se você adotar algum padrão comportamental suspeito, se algum local que você tenha estado, ou se alguém de algumas de suas redes de relacionamento estiver no foco da vigilância, todos da rede e/ou todos que estiveram no local também serão alvo de vigilância.
O governo lhe conhecerá melhor do que você mesmo, construirá padrões de previsibilidade, saberá quando um determinado padrão significa uma ameaça, de que tipo e intensidade, e agirá para impedir um ilícito que poderia ser cometido, lembrando que ilícito em uma ditadura é um conceito muito ambíguo.
Você também poderá ser preso, por exemplo, por curtir publicações sobre “patinho amarelo” ou sobre o cultivo de bromélias. Isto, simplesmente, porque eventualmente um padrão identificou que pessoas que seguem as publicações do “patinho amarelo” tem 46% de chances de serem “subversivas”, e se também curtem publicações sobre o cultivo de bromélias esta probabilidade aumenta para 86%.
Você poderá ser preso simplesmente por ter estado em determinado local, e próximo à uma das pessoas envolvidas, por algumas vezes. Você também poderá ser preso, por exemplo, por curtir publicações sobre “patinho amarelo” ou sobre o cultivo de bromélias. Isto, simplesmente, porque eventualmente um padrão identificou que pessoas que seguem as publicações do “patinho amarelo” tem 46% de chances de serem “subversivas”, e se também curtem publicações sobre o cultivo de bromélias esta probabilidade aumenta para 86%. Estes padrões não são tão simples assim, mas atendem à uma lógica, que humanamente não parece fazer sentido, são padrões criados por homofilia, que significa comparar pessoas e seus hábitos, estabelecendo uma lógica relacional, e são construidos através de sofisticados processos de machine learning e deep learning, a partir de uma quantidade gigantesca de comparações.
As possibilidades vão além da vigilância, a tecnologia atual permite um sofisticado controle social, pois como praticamente toda interação com mediação tecnológica se dá através de sofisticados algoritmos, torna-se possível controlar a informação que chegará ao indivíduo, a visibilidade de seus grupos e amigos, ocultando ou exibindo estas informações de acordo com as intenções da ditadura.
As possibilidades vão além da vigilância, a tecnologia atual permite um sofisticado controle social, pois como praticamente toda interação com mediação tecnológica se dá através de sofisticados algoritmos, torna-se possível controlar a informação que chegará ao indivíduo, a visibilidade de seus grupos e amigos, ocultando ou exibindo estas informações de acordo com as intenções da ditadura. Esta prática distorcerá seu entendimento de senso comum, você poderá ter amigos extremamente ativos “subversivamente” e nem se dará conta disto, pois os algoritmos lhe apresentarão conteúdo e pessoas que estão de acordo com os interesses do governo.
Este controle social pode ir além das redes sociais e das ferramentas de busca, estamos cedendo nossa autonomia para os aplicativos, hoje o usamos até para saber a melhor rota para um caminho usual, ou qual o melhor restaurante perto, ou qual o par perfeito para você, além de outras atividades banais do dia-a-dia.
É importante lembrar que o governo também conhecerá em detalhes todas as suas fraquezas e vulnerabilidades, e as explorará em benefício próprio.
É importante lembrar que o governo também conhecerá em detalhes todas as suas fraquezas e vulnerabilidades, e as explorará em benefício próprio. Alias não só as suas, mas também as fraquezas e vulnerabilidades dos grupos que pertence, e as exploraria da mesma forma, inclusive produzindo harmonia e discórdias quando necessário através da interação com os algoritmos.
Este poder existe, mas está contido e distribuído. A pesquisadora Cathy O’Neil chama de cardeais dos algoritmos, aqueles que detém o controle dos complexos algoritmos e gigantescas bases de dados de indivíduos, ou seja, a “biomassa humana” nas palavras de Maria Wróblewska. Como dito, este poder esta contido e distribuído, o Facebook e o Google por exemplo detém o controle sobre suas “biomassas humanas”, mas utilizam recursos como trackers, pixels e parcerias para romper, mesmo que parcialmente estas barreiras. Desta forma por exemplo, você recebe publicidade de um item recém pesquisado na Internet em seu Facebook. Se o governo ganhar o acesso amplo a todas estas redes, tornando-se um “mega cardeal do algoritmo”, se tornará praticamente um deus, com amplos poderes sobre os indivíduos, e como dito anteriormente, este poder pode ser tomado, facilmente em um regime de exceção.
Todo este controle, permitirá à ditadura perpetuar-se por anos, décadas, sem que nada venha ameaça-la, a não ser que as forças “subversivas” consigam desvencilhar-se deste complexo organismo de vigilância. Apesar de assustador, este cenário é extremamente real e possível, com os recursos tecnológicos atuais.
A vigilância do século XXI
Para que você consiga compreender o cenário, é necessário mudar completamente o seu conceito de vigilância, que é o que tentarei nos próximos parágrafos.
Quando se fala em vigilância, logo vem a mente a imagem de uma câmera, com alguém observando atrás dos monitores. Sistemas de vigilância são naturalmente vistos desta forma, com centrais cheias de telas, e pessoas de olho nestas telas. É um modelo obsoleto, ineficiente, e está fadado a desaparecer em poucos anos, sendo substituído por uma “vigilância cega”.
O modelo de vigilância do Panóptico de Benthan, descrito por Foucault em “Vigiar e Punir“, é similar ao modelo de vigilância da obra distópica 1984 de George Orwell, representada pela “teletela”, um dispositivo que ao mesmo tempo em que funcionava como uma TV com programação exclusiva do “partido”, servia de olhos e ouvidos para o “Grande Irmão”. O modelo panóptico baseia no par ver ser visto, a partir de um ponto de observação central, tendo o vigilante ampla visão do vigiado, e este nenhuma visão do vigilante, presumindo estar sendo vigiado. O Panóptico descrito por Foucault, por esta premissa, torna-se mais um instrumento de controle, do que propriamente vigilância. Um controle leve, eficiente, sem grades, invisível, e pela pressuposição de estar sendo vigiado.
O panóptico, que representa o modelo de vigilância vigente até o século XX, tornou-se obsoleto no século XXI. Zigmunt Bauman em “Vigilância Líquida” apresenta o conceito do “panóptico pessoal”, em que o indivíduo torna-se vigilante de si e de seus pares, e cada um carrega seu próprio Panóptico, materializado por Bauman como seus smartphones e dispositivos conectados. O que Bauman descreve, dialoga com o que Fernanda Bruno, em “Máquinas de ver, Modo de Ser. Vigilância Tecnologia e Subjetividade“, descreve como “Vigilância Distribuída”, que tira a centralidade da vigilância, principal característica do panóptico. A Vigilância Distribuída se dá a partir de vários dispositivos conectados, e não somente por um, configurando o que classifico como meta dispositivo de vigilância, que são dispositivos interconectados, como por exemplo, um smartphone conectado a um smartwatch.
O advento do big data substituiu o modelo panóptico pelo panspectro. O panspectro é uma expressão cunhada por Manuel DeLanda em 1991, no livro “Guerra na era das máquinas inteligentes”, e posteriormente usado por Sandra Braman no livro “Change of State – Information, Policy, and Power“. O foco do panspectro não é o indivíduo em particular, ele esta focado nos dados, em todos os dados, e sua ação focal se dá em resposta à padrões, como já foi descrito anteriormente. A mineração dos dados, o uso de machine learning e deep learning, configuram a vigilância cega, uma vigilância com foco em padrões onde sua visibilidade se torna necessária apenas como resposta à padrões desviantes ou ressonantes, estes dados são coletados através dos dispositivos e meta dispositivos de vigilância.
Dispositivos e meta dispositivos, pela perspectiva da Vigilância Distribuída, configuram um complexo Organismo de Vigilância, onde cada um representa um dos bilhões de nós deste organismo. É como se estivéssemos literalmente imersos em um mega dispositivos de vigilância com alta capilaridade e invisível. São smartphones, tablets, computadores, smartwatch, wearables, câmeras de vigilância, drones, RFID, redes abertas, redes de telefonia móvel, e qualquer outro dispositivo tecnológico conectado, doravante conhecido por “dispositivo”.
Para você ter uma ideia do potencial de vigilância dos dispositivos, os smartphones mais populares, como o iPhone e o Galaxy S possuem sensores como GPS, beacon (que são sensores que identificam a proximidade de outros dispositivos), altímetro barométrico, acelerômetro, giroscópio, sensor de proximidade e de luz ambiente, assistente inteligente, microfone, alto falante, câmera frontal e traseira, e alguma forma de identificação biométrica. Além de possuírem conectividade por Wi-fi, Bluetooth, 3G e 4G. Estes dispositivos estão na maioria das vezes coletando dados, de forma involuntária, e muito caros ao indivíduo e sua privacidade.
Temos hoje um organismo de vigilância com mais de 12,3 bilhões de dispositivos, ou seja, 1,6 dispositivos por habitante do planeta.
Em termos de grandeza concreta, segundo o Internet World Stats, em Dezembro de 2017, 4,1 bilhões de pessoas tinham acesso a Internet, considerando que o relatório da Cisco projeta que em 2020, existirão em média 3,4 dispositivos conectados à Internet por usuário, e considerando a média de 3 dispositivos, temos hoje um organismo de vigilância com mais de 12,3 bilhões de dispositivos, ou seja, 1,6 dispositivos por habitante do planeta, considerando a população atual em 7,7 bilhões, sem contar os demais dispositivos de vigilância como câmeras, drones, e outros, e sem esquecer que cada dispositivo pode ter vários sensores.
Dificilmente damos conta que carregamos conosco um dispositivo de vigilância tão poderoso, a ponto de muitos ativistas chama-los de “dispositivo de vigilância que permite fazer ligações telefônicas”. Eles nos rastreiam mesmo quando não estamos conectados à Internet, como demonstra esta matéria da Fox News.
Mas não são somente estes os dispositivos e tecnologias que podem acabar literalmente com a nossa privacidade, em caso da instalação de uma ditadura no país. Nossos hábitos na internet também produzem dados sobre nós, além das relações mediadas por algoritmos, são cookies, trackers, remarketing que capturam dados sobre nós.
O Facebook, por exemplo, faz uso de trackers para saber o que você faz na Internet, quando não esta nele, mas também usa dados do WhatsApp e Instagram, por serem empresas do mesmo grupo. Na verdade o Facebook e o Google são a mais clara representação do que Shoshana Zuboff chama de capitalismo de vigilância. Este complexo mecanismo de captura, coleta, tratamento, analise e armazenamento de dados chamado Facebook, foi explorado em profundidade pelo ShareLab, e descrito em forma de monólogo pela Panoptykon Foundation, no vídeo a seguir.
https://youtu.be/WJ7s5heakqE
Como pode perceber, não podemos pensar em um modelo de vigilância e controle no século XXI, com a mente do século XX, o formato e conceito de vigilância mudaram. Do Panóptico de Foucault, onde primava o par ver ser visto, ao Panspectro de Braman, onde prima a coleta indiscriminada de dados, e a vigilância se manifesta em respostas a padrões. Os dados que produzimos podem dizer muito mais sobre nós do que a simples vigilância. O modelo atual, representado na figura abaixo, tem as características visuais do Panóptico, mas apenas como elemento complementar ao vasto potencial de vigilância do Panspectro.
Vamos tomar por exemplo um caso real, o Norte Shopping, no Rio de Janeiro. Este shopping instalou um moderno sistema de câmeras de segurança que faz o reconhecimento facial de todos que transitam em seu interior, o que possibilitou inclusive a prisão de dois criminosos procurados. O sistema, segundo a empresa que o fornece, como descrito na matéria, faz o reconhecimento facial do indivíduo e o compara com um banco de dados.
Imagine então que você entre neste shopping, o sistema irá fazer uma leitura da sua face, sem que você perceba, em seguida consultará uma base de dados, e se não encontrar registro, irá criar um novo com o modelo matemático de sua face, dando o identificador hipotético “IND18A7F8E7”. O sistema então passa a registrar seu deslocamento dentro do shopping, por onde andou, em que lojas parou para ver a vitrine, em quais entrou, quanto tempo demorou, etc. Tudo isto é feito sem nenhuma interação humana, mas tudo fica registrado, eu suponho.
Neste momento você pega seu smartphone e resolve conectar à rede wifi do shopping, que em geral pede dados cadastrais como nome, cpf, e número de telefone para conceder o acesso. Supondo que os sistemas sejam interligados, a partir deste ponto, utilizando a triangulação dos pontos de acesso wifi, sua posição pode ser determinada, e comparada com a posição do registro da câmera de vigilância, associando seus dados ao usuário IND18A7F8E7. Novamente lembramos que tudo é feito sem nenhuma interação humana.
Agora imagine, em uma ditadura, que sistemas como estes sejam interligados, e os dados sejam acessados pelo governo. Mesmo que você não esteja carregando nenhum dispositivo, sua identificação será possível por sistemas deste tipo.
Alias não precisamos ir muito longe, ainda no Rio de Janeiro, a CodingRights fez um estudo sobre o bilhete único carioca, e chegou a conclusão que os dados dos usuários, inclusive os biométricos de reconhecimento facial, são compartilhados com a polícia e a secretaria municipal de transportes. Imagine então que nem no ônibus é possível viajar incógnito. Junte a estes sistemas de reconhecimento de placas de automóveis, que possuem câmeras espalhadas pela cidade, a nova placa com chip e QR Code, e seu carro poderá ser rastreado, os limites da vigilância não terminam ai.
Estamos há anos trocando nossa liberdade, nossa privacidade e autonomia pelo conforto da tecnologia, e pela segurança que esta proporciona, o preço desta prática só será percebido quando em uma ditadura nos tornarmos prisioneiros dela.
BAUMAN, Z. Vigilância Líquida. In: MEDEIROS, C. A. (trad.). [s.l.]: Zahar, 2014. 160 p. ISBN: 978-8537811566.
BRAMAN, S. Change of State – Information, Policy, and Power. Nature Publishing Group. London, England: The MIT Press, 2006. 570 p. ISBN: 9780262025973.
BRUNO, F. Máquinas de ver, modos de ser: vigilância, tecnologia e subjetividade. 1 ed. Porto Alegre: Sulina, 2013. ISBN: 9788520506820.
FOUCAULT, M. Vigiar e Punir o nascimento da prisão. 29 ed. São Paulo: Editora Vozes, 2004. 266 p. ISBN: 8532605087.
O’NEIL, C. Weapons of Math Destruction, How big data increases inequality and threatens democracy. New York: Crown Publishing Group, 2016. 307 p. ISBN: 9780553418828.
ORWELL, G. 1984. In: JAHN, H. ; HUBNER, A. (trads.). [s.l.]: Companhia das Letras, 2009. 416 p. ISBN: 978-8535914849.
ZUBOFF, S. Big other: Surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, [s.l.], v. 30, no 1, p. 75–89, 2015. ISBN: 02683962, ISSN: 14664437, DOI: 10.1057/jit.2015.5.
Não estamos falando de fé religiosa, estamos falando da fé em si, daquele sentimento interno que nos faz manter alguma esperança, daquele fio de teimosia que nos faz crer que apesar de toda adversidade, alguma coisa vai dar certo.
Estamos falando daquele sentimento que nos faz emergir olhando para a frente para vislumbrar uma pequena luz bem distante.
Estamos falando daquele sentimento que nos faz crer que hoje será melhor que ontem, que este mês melhor que o mês passado, que este ano será melhor.
A fé que nutrimos repleta de simpatias no Reveillon frente a um ano novinho em folha que desperta. A fé que nos faz pensar em yin-yang, a filosofia taoista da dualidade, onde os opostos andam juntos e nos faz perceber que sempre o bom é o outro lado do ruim, e que basta olhar por outro ângulo para vermos o bom, se não o vemos, ao menos podemos acreditar que ele está ali.
A fé… a fé que move montanhas pelo simples fato de que acreditamos que isto seja possível.
A fé que cura, a fé que nos acalenta, a fé que nos mantém vivos.
Ter fé não significa religiosidade, ter fé significa acreditarmos em nós, ter fé significa amor.
Amor por si, pelos seus, pelo próximo, pelo mundo. Amor pelo próximo significa praticar o altruísmo e a empatia. O exercício de dar ao próximo a fé que ele busca, pelo simples fato de saber que alguém o compreende, que alguém de alguma maneira se preocupa com ele.
A fé acalenta, a fé acalma, mas a fé pode falhar pelo simples fato do homem deixar de acreditar em um futuro possível. Quando todas as luzes distantes parecem ter se apagado, e o amor vai dissipando, e com ele a sua capacidade de ser um homem de fé. O homem sem fé é amargo, o homem sem fé é um homem aprisionado em si mesmo, preso em uma cela que não o permite ver a luz distante por mais intensa que esta seja.
Alguns chamam isto de depressão, mas na verdade é falta de fé.
Dê fé a quem precisa, exercite seu altruísmo e sua empatia, é dando que se multiplica.