No fim, todos voltaram a ser verdes…

Existe vida em um planeta muito distante, pesquisadores estudam a história de sua espécie. Descobriram que a vida inteligente surgiu do continente de Akuarelus, onde a milhares de anos, eram todos indivíduos verdes. Viviam inicialmente do extrativismo e eram nômades, e assim foram migrando pelo planeta. Aos poucos foram evoluindo, construindo ferramentas, descobrindo a agricultura a pecuária e deixaram de ser nômades, instalaram-se em diferentes locais do globo. Isto se deu ao longo de milhares de anos, e os indivíduos verdes foram evoluindo geneticamente, adaptando-se a sua nova condição e ao seu ambiente. Em alguns lugares ficaram amarelos, em outros azuis e em outros continuaram verdes, na verdade existia uma intensa matriz de cores entre o azul e o amarelo, mas todos, apesar da cor, eram biologicamente iguais, a cor era uma consequencia da adaptação ao meio ambiente.

Esta civilização continuou evoluindo, a liderança não se dava mais pela força, e sim pela habilidade intelectual, e principalmente pela sua experiência. Os indivíduos continuaram vivendo em grupos, e seus descendentes continuavam nas mesmas vilas, que logo se tornaram cidades. Nestas cidades culturas se formavam, cada cidade, cada pais com suas crenças e valores, e em sua maioria todos eram da mesma cor, eram todos “iguais”.

Alguns exploradores amarelos, agora providos de cavalos e curiosidade, seguiam viagem em busca de novas civilizações, em seu material genético e em sua história não constava mais a origem de sua espécie, não tinham como entender o movimento migratório que ela fez, e muito menos o que o motivou. Certo dia um grupo de exploradores encontrou uma vila, viu que nela existiam indivíduos azuis, ficaram curiosos em conhecer estes indivíduos, que logo demonstraram sua curiosidade recíproca. Se olharam, se tocaram, com a curiosidade de quem nunca havia imaginado que existiria indivíduos diferentes. Estavam ai descobrindo os diferentes, e com esta descoberta veio a dúvida: Quem será a civilização mais avançada?

Os exploradores amarelos observaram que os azuis viviam de forma mais simples, em casas menos arrojadas, e com simplismo concluíram que os azuis eram menos evoluídos, e pior, que eram inferiores. Por outro lado no sistema de valores dos azuis quem era menos evoluído eram os amarelos, que não sabiam mais caçar e muito menos seguir os rituais dos azuis. Eram civilizações diferentes, com crenças e valores diferentes, construídos por motivações exclusivas e ligadas ao ambiente em que estavam inseridos. Os exploradores amarelos retornaram a sua cidade, e ao chegar falaram de uma estranha civilização de azuis.

Não se falava em outra coisa, só se falavam dos diferentes, e assim um mito estava sendo construído, estavam conceituando os azuis, ou melhor estavam construindo um preconceito a cerca dos azuis. A ignorância e o preconceito construíram uma péssima imagem dos azuis, na verdade todo este preconceito já era direcionado aos diferentes, e ai neste contexto se inseriu um novo diferente, os azuis.

Anos depois um grupo de exploradores azuis chegou à cidade, achando que iriam encontrar os amáveis amarelos que conheceram, sua cultura concebeu um preconceito positivo dos amarelos, chegaram à cidade de peito aberto e foram recebidos sob intenso ataque. Perplexos recuaram e ficaram imaginando o que poderia estar acontecendo, porque razão eles foram recebidos daquele jeito? Porque tanta hostilidade? Os exploradores azuis retornaram a sua cidade e ao chegar falaram da hostilidade dos amarelos, e um novo preconceito se construira, era mal entendido sobre mal entendido, no final das contas a hostilidade agora era bilateral.

Como em toda sociedade, existem críticos e pensadores, que acabam construindo um sistema de crenças e valores diferente de seus iguais, curiosamente dois grupos de dissidentes, um azul e um amarelo resolveram deixar suas cidades para criar uma nova cidade, uma cidade onde a cor não faria parte do sistema de valores, e onde todos são iguais. Esta vila de azuis e amarelos cresceu e se tornou uma grande cidade de cidadãos verdes, diversos tons de verde, e com o passar do tempo poucos eram os indivíduos azuis ou amarelos. Os pouco que existiam eram imigrantes da cidade dos azuis ou da cidade dos amarelos, novos dissidentes.

A cidade dos verdes vivia pacificamente, enquanto a hostilidade entre os azuis e amarelos crescia sem parar, os cidadãos das duas cidades já agiam de forma irracional, atacavam qualquer diferente que via pela frente, os azuis não podiam entrar na cidade dos amarelos e vice-versa. A hostilidade estava ficando paranóica, os amarelos enviaram uma mensagem para os verdes para não acolherem mais indivíduos azuis, o mesmo fizeram os azuis que pediram aos verdes para não acolherem mais amarelos. Os verdes que não tinham hostilidade contra nenhuma outra cor, e muito pelo contrario, faziam questão de ignorar este detalhe da pele, responderam que além de não acatar com o pedido dos amarelos e dos azuis, estavam abertos para receber dissidentes das duas cidades.

Azuis e amarelos entraram em guerra, e dentro de um estado de excessão existe muita permissividade, soldados azuis se relacionavam com mulheres amarelas e soldados amarelos com mulheres azuis. No fim da guerra houve um intenso baby boom, de bebês verdes. As duas cidades agora tinham cidadãos diferentes, filhos de seus iguais com “aqueles malditos” soldados inimigos. As pobres crianças verdes sofreram todo tipo de discriminação, cresceram sob esta égide, eram culpados até prova ao contrário. Tudo que acontecia de errado era culpa dos malditos verdes.

Os verdes adultos casaram com amarelos, azuis, ou até outros verdes, misturando cada vez mais as cores, com o tempo existia um grande núcleo verde em cada cidade, mas infelizmente continuavam sofrendo preconceito, inclusive os azuis e amarelos que casavam-se com os verdes. Um sistema claro de separação de cores foi instalado, de forma a garantir que ainda existiriam azuis e amarelos puros, pois estes verdes eram os “vira lata” da sociedade.

As cidades dos azuis e dos amarelos não tinham o sistema de valores da cidade dos verdes que por não ter conflitos evoluia vertiginosamente. Com a evolução, com o poder, chegara a arrogância, agora os verdes eram de fato superiores aos amarelos e azuis, e passaram a ser a sociedade dominante, os diferentes agora eram os amarelos e os azuis. Não demorou muito para o poder dos verdes romper com os valores liberais construídos durante séculos, começaram a tratar os cidadãos amarelos e azuis como cidadãos de “segunda categoria”, passaram a impedir sua entrada em sua cidade.

Tudo isto acabou unindo as cidades dos azuis e dos amarelos, que ao longo dos tempos foram se relacionando até que poucos azuis e amarelos restaram no planeta. Todos voltaram a ser verdes, todos iguais, e agora? Quem são os melhores?

Postado em 2009 no Trezentos

Seu site por R$ 199,90

Certo dia, após uma breve leitura dos classificado de Informática, um determinado empresário decide que esta na hora de ter sua presença na internet, e liga para um anuncio que lhe chamou a atenção: “Seu site por R$ 199,90

Empresário: – Alô ?
Empresário: – De onde fala?
Anunciante: – Ô tio, é o Marcão, o webdesigner.
Empresário: – Marcão, eu vi seu anuncio que você promove empresas na Internet.
Anunciante: – Ô tiozão é isso mesmo, meu trabalho é bom e barato. Faço um site irado e ainda divulgo ele pela web.
Empresário: – E tudo isto por R$ 199,90?
Anunciante: – Tio, este é o preço justo, mais que isto é um roubo. Estas empresas cobram uma grana porque são mercenárias, meu serviço é irado.
Empresário: – Mas vai ficar bom?
Anunciante: – Tio, vamos usar tudo que é novidade: AJAX, XHTML, Flash, CSS e ainda vamo botá” um AdSensezinho.
Empresário: – E vão divulgar?
Anunciante: – Tio, webmarketing é nois! Tenho 10 milhões de e-mails cadastrados, a gente avisa a todo mudo do seu site. Vai ser show!
Empresário: – Ok, tá fechado.

Empresário pensa: – AJAX para que? Será que precisa limpar o monitor?

Diariamente, empresários mal informados são vitimas destes amadores. Ferramentas de publicação na internet são cada dia mais interativas e fáceis de usar, levando ao mercado uma enxurrada de curiosos despreparados.

Para o mercado profissional isto não é novidade, me lembro dos idos tempos de formação do PROMIT em 96, que este problema já existia. Alias o amadorismo é um problema recorrente em nossa sociedade, já nos habituamos à informalidade, temos amadores em basicamente todas as áreas. Com certeza ninguém se submeteria à uma cirurgia com um médico amador, mas constroem casas com base no know how prático de profissionais de construção, ou consertam seus carros com o quebra galho da esquina que também faz manutenção no aquecedor de gás.

Serviços amadores podem dar certo, o paciente pode sobreviver, a casa pode não cair, o carro e o aquecedor podem não colocar vidas em risco, mas não deixa de ser uma roleta russa. Para alguns um risco calculado, para a maioria pura ignorância.

Por que na hora da presença na internet isto tem de ser diferente? Alguns podem argumentar que muitos clientes simplesmente não necessitam de algo além do “site a R$ 199,90″. Pode até ser, mas estamos vivendo cada vez mais conectados, e os tempos do “web site corporativo estático” já eram. Hoje é preciso participar, interagir e relacionar. Um site estático esta condenado à invisibilidade digital, se não possui valor agregado e não presta nenhum serviço à seus visitantes então é um natimorto.

Ainda é comum as empresas delegarem assuntos de internet para seus departamentos de TI, mas existe uma tendência crescente de empresas que passaram seus assuntos de internet à seus departamentos de marketing. É preciso encarar um projeto de internet como um investimento, que irá proporcionar um retorno (ROI) de 300% em um ano, segundo a Closed Loop Marketing. Obviamente este ROI não é uma afirmativa, e sim uma probabilidade que tem como componentes mais importantes quem contrata e quem é contratado. Internet hoje em dia é assunto do departamento de marketing das corporações, e deve ser tratado com empresas especializadas em marketing digital, desta forma um ROI de 300% torna-se bem plausível.

Segundo a pesquisa “Business to business survey 2007″ da Enquiro, 83% das empresas usam a Internet para localizar potenciais fornecedores. Um site bem construído é “achavel”, “usável” e “acessível”, para isto é necessário uma equipe especializada e não mais um profissional que sozinho produza todo resultado. Gerente de projetos, Arquiteto de informação, Webdesigner com enfase em webstandards, webdeveloper com ênfase em aplicações client e server side, Gerente de Marketing digital com ênfase em SEO, além de outros especialistas formam uma equipe para desenvolver um projeto de internet de resultados, e você ainda acha que dá para fazer isto tudo à R$ 199,90 ?

O dinossauro e o Barcamp

Figueiredo é o presidente de uma grande gravadora, a Anta Records. Figueiredo dedicou a sua vida à Anta Records, entrou lá como office boy e fez carreira até chegar à presidência, se orgulha de cada passo, cada degrau que escalou para chegar onde chegou. Seu Figueiredo fez uma carreira vertical, antigamente era assim. Com uma forte dose de romantismo, a carreira vertical, é um sinônimo corporativo do “aprender com os próprios erros”. Mas o tempo passou, ainda bem! Hoje as carreiras são horizontais, muitos empregos, muitas culturas, tornam as empresas e os executivos mais competitivos.

A Anta Records é tudo na vida do seu Figueiredo, ele se orgulha de ter lançado diversos sucessos, orgulha-se de sua relação com as radios e sua eficiente rede de distribuição, orgulha-se de possuir os melhores estudios do mercado, afinal tem realmente do que se orgulhar. Seu Figueiredo chegou lá, esta tranquilo, realizado, mas seu novo assistente, o Junior Silva vem tirado seu sono.

Junior Silva é um garoto antenado, filho de Apolônio Silva, o Junior sempre gostou de música e tecnologia. Conseguiu o emprego na Anta Records como assistente do seu Figueiredo. Seu Figueiredo pode ser um “dinossauro”,  mas percebe que alguma coisa esta acontecendo e que o filho do seu vizinho moderninho, poderia lhe mostrar o caminho. Apesar disto, seu Figueiredo é um cara “osso duro de roer”, ao mesmo tempo que quer inovação tem pavor de perder seu “status quo”.

Um belo dia Junior percebeu que a oportunidade para “digitalizar” o analógico seu Figueiredo havia surgido, e então correu para a sala do seu Figueiredo, abriu a porta esbaforido e falou:

– Seu Figueiredo, tenho otimas ideias para o senhor, vai acontecer um Barcamp no próximo sábado e imagino que podemos encontrar grandes oportunidades para Anta Records.

Figueiredo fitou o Junior pensativamente, levantou suas fartas sobrancelhas alternadamente, colocou a mão no queixo, parecia pensativo. Depois de alguns segundos soltou um sorriso e exclamou:

– Junior, em que um acampamento de manguaceiros pode nos ajudar?

Ai meu Deus! Pensou Junior,  ja vi que vou ter de explicar detalhadamente ao Seu Figueiredo, haja paciência, mas vamos lá:

– Seu Figueiredo, de onde você tirou a ideia de que vamos à um acampamento de manguaceiros?

– O que mais poderia ser “Bar Camping”, que não um acampamento em um bar, deve ser nojento isto. Que tipo de gente frequenta um negócio destes?

– Seu Figueiredo, estes eventos são frequentados por profissionais de diversas áreas, blogueiros, formadores de opinião, hubs de mídias sociais, e gente de todo tipo. E não é um acampamento num bar.

– Junior, este pessoal pode ficar acampado, mas eu estou muito velho para acampamentos, prefiro que você peça a dona Terezinha para reservar um Hotel para mim, ao menos eu vou ao “Bar do hotel”. Alias para que eles vão levar hubs para o acampamento? E o que é este tal de “Bar Camping” afinal?

– Seu Figueiredo, hub é o nome dado à formador de opinião, são elos chaves no Buzz Marketing. Barcamp é uma desconferência.

Seu Figueiredo solta uma sonora gargalhada, e fala:

– Junior, desconferência seria uma conferência ao contrário? Seria o público no palco e o palco no público? Vamos ter de chegar la falando nossos nomes de trás para frente?

– Boa Seu Figueiredo ! É quase isso, na verdade é uma espécie de conferência onde não existe pauta, e qualquer um pode debater, não existe uma linha clara entre público e palestrante,  o evento é bem informal, mas é bem interessante.

– Tudo bem Junior, acho que estou entendendo; mas me diga, este negócio de midia social é coisa daquele presidente barbudo?

– Não seu Figueiredo, não é não, depois eu explico ao senhor. Agora preciso me inscrever no Barcamp.

– Também quero ir Junior, me inscreve também no Bar Camping, quero ver de perto como é que são estes hubs e o que é esta tal de mídia social.

– Tudo bem seu Figueiredo, vou inscrever o senhor também.

Duas semanas se passaram e amanhã é dia de BarCamp, as sugestões de temas estão quentissimas, mas Junior esta preocupado, tem certeza que o seu Figueiredo vai meter o pé na jaca, principalmente porque um dos temas é o caso do Radiohead, a gravadora RCRD LBL e outros inovadores…

(continua…)

Nota: Isto é uma obra de ficção, qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

Ensaio sobre a beleza

Venho desenvolvendo um trabalho de gerenciamento na reforma do Theatro Municipal, um belissimo edifí­cio histórico no centro do Rio de Janeiro, e ir ao centro para mim é uma eventualidade, e por ser fora da rotina é relativamente prazeroso. Costumo observar pessoas, o tempo todo, sou um observador nato, presto atenção em tudo que consigo: Nas pessoas, nos lugares, nos veículos, paisagem urbana, e tudo mais que estiver no meu campo visual, ou seria melhor dizer no meu campo sensorial? Afinal temos cinco sentidos para interagir com o mundo e obviamente um estimulo acaba chamando outro. Não costumamos cheirar o que vemos ou tentamos ouvir o que tocamos, muito menos tocar, o que na verdade gostarí­amos, e estamos vendo, mas estaríamos invadindo o espaço de outra pessoa, e isto deve ser consentido.

Definir o que é belo é uma missão complexa, o belo não pode ser associado apenas aquilo que vemos, pois afinal se fosse assim, os portadores de deficiência visual não teriam o direito de achar nada belo. A beleza é um atributo sensorial, o cego julga a beleza com o tato, com o olfato e a audição. Talvez definir que belo é aquilo que nos proporciona prazer sensorial, seja o mais próximo da definição efetiva que possamos chegar.

O cheiro agradável, o sabor delicioso, a textura suave, o som emocionante ou paisagem incrí­vel, são sinônimos de beleza, ou seriam os seus componentes?   O atributo sensorial é na verdade o chamariz, e um belo chamariz provoca uma reação em intensidade proporcional, atrai, chama a atenção, mas não é tudo, acho que a percepção da verdadeira beleza esta na conjunção dos sentidos, o que chamamos popularmente de “quí­mica”, algo como “rolou uma quí­mica” para justificar um intenso relacionamento.

Esta quí­mica é na verdade uma harmônica conjunção destes sentidos, uma mistura perfeita, que percebemos como a beleza. A complexidade é muito maior de que simplesmente a mistura sensorial, não se trata de alquimia, existem outros componentes como a emoção e o prazer que acabam retroalimentando esta percepção, percepção esta que varia de um indivíduo para outro.

Tentando ser mais claro, é como se a percepção do belo tivesse além do aspecto sensorial, o tempo, relacionamento e repetição. Analisando por ai temos que a percepção da beleza vai do evidente para o sutil com o passar do tempo. Isto explica por exemplo a preferência por alimentos doces e com consistência e sabor mais evidentes na infância e preferência por alimentos com consistências, docura e sabores mais sutis na fase adulta. Lembre-se que adolescentes escolhem seus parceiros por padrões meramente Aristotélicos, a beleza precisa ser evidente, ja o homem maduro percebe as mais discretas sutilezas na mulher, enxerga muito além das formas, é uma percepção muito mais elaborada. Isto não quer dizer por exemplo que o homem maduro não seja atraido pela beleza Aristotélica, mas isto deixa de ser a única regra, o fator tempo, repetição e relacionamento expandem a percepção do belo.

Esta lançada a questão, afinal, o que é a beleza para você?

Um livro misticamente indicado

Você ja teve aquela sensação de dejavue? Ja esteve antes em algum local novo e sentiu que ja estivera la antes? Ja pensou ou sonhou com pessoas e fatos que acabaram se configurando como uma espécie de premunição?

Existem muitas perguntas sem respostas, entrar nesta seara pode abrir diversas teorias, de cunho religioso,  mistico, sensorial, energético ou transcendental.

Na verdade não podemos deixar de levar em consideração que existe algo alem do material. Alguns chamam de energia, espirito, santo ou entidade, o nome mesmo não tem muita importância, o que importa mesmo é reconhecer esta presença.

Mundo espiritual, céu, quarta dimensão, será que os mundos se sobrepõem e se interceptam contrariando as leis da física de que dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço?

Provavelmente sim, em se tratando de um universo paralelo, energético ou espiritual, nada impede que duas histórias corram no mesmo tempo e no mesmo local, compartilhando inclusive os mesmos cenários, mas não necessariamente na mesma era. Partindo da premissa da quarta dimensão, o futuro, passado e presente podem coexistir no mesmo momento cronológico e no mesmo espaço físico.

Ainda no universo das suposições, novas descobertas cientificas seriam necessárias para transforma-las em teses, Einstein fez boa parte deste processo, uma análise critica da sua classica equação E = mc² nos leva a concluir que massa e energia transitam facilmente de um lado para outro quando levado a condições como a velocidade da luz ao quadrado.

Poderia continuar escrevendo sobre as hipoteses de uma quarta dimensão ou um mundo espiritual, mas não é exatamente o objetivo deste post, mas o que aconteceu comigo foi no mínimo curioso, me chegou há mais de um ano como um pensamento, algo como:

Pi… A vida de PI…

Somente isto, nada mais, somente estas palavras sem muito sentido, não dei muita importância, mas não me saiu da memória.

Depois de muito tempo fui pesquisar pela frase “A vida de PI” e descobri que existia um livro com este título. Uma pergunta no Shelfari me deixou ainda mais curioso a respeito, 360 pessoas me recomendaram ler o livro e apenas 21 disseram não valer a pena.

Finalmente, no final do ano passado comprei o livro, quando chegou fui logo comecando a ler, e vi que se trata de uma interessante fábula sobre superação e fé. O personagem, um jovem indiano, que adotou para si três religiões: hindu, o Islã e o catolicismo, morava dentro de um zoologico. Em um determinado momento o pai vende o zoologico e partem de navio para o Canada, no meio da viagem o navio afunda e ele se vê num bote salva vidas com um tigre, uma zebra ferida, uma hiena e um macaco. Depois de muita chacina resta a bordo apenas o tigre e o jovem PI. Desenrola-se ai uma historia interessante, que culmina na constatação de que para ele a melhor coisa que aconteceu foi estar com um tigre a bordo. Se não fosse a preocupação com o tigre, provavelmente o tédio e a depressão teria matado PI, mas a eminência de ser morto por um felino selvagem, fez com que Pi colocasse sua sobrevivência em primeiro plano.

De fato eu precisa ler isto…

Por esta e por outros, agora fico mais atento aos pequenos sinais que o universo nos passa, não a ponto de desenvolver uma mania, mas digamos que os “receptores” estão mais sensíveis.

Mantras da irracionalidade

A indústria cultural é predatória, apropria-se da cultura popular, a reconfigura e a vende como produto travestido de cultura popular. A sociedade de consumo assimila esta cultura enlatada como se fosse sua, e ainda critica a cultura popular, que deu origem à sua nova “cultura”. Com consumidores assim fica fácil, à industria cultural e a mídia, a disseminação de “trojans intelectuais”, que mantendo a analogia com a tecnologia, são trojans que se instalam nas mentes das pessoas destituindo-os de seus sensos críticos.

Dentre as características mais veementes da indústria cultural, destaca-se seu poder em destituir dos indivíduos a autonomia em julgar e decidir. Se a revolução industrial mecanizou a relação entre homem e trabalho, a indústria cultural mecanizou a relação entre o homem e sua própria subjetividade.
Érica Fernandes Silva

Curioso é ver o quanto irracional nossa sociedade esta ficando, enquanto não estão consumindo a cultura de massa, estão trabalhando para ter recursos para consumi-la, isto no mais irracional dos círculos viciosos. Estupidamente estupendo, mas é a pura verdade, vivemos numa sociedade tão hedonicamente consumista, que é mais importante ter o bem do que proriamente usufrui-lo. A dissonância cognitiva pós compra não se da mais sobre o aspecto de que a compra foi ou não bem sucedida, ela vem perdendo sentido, para o consumista irracional, toda compra é bem sucedida, por mais estúpida que possa parecer. A nova dissonância é a depressão pós-compra, onde o vazio de possuir imediatamente inicia um novo ciclo no processo.

A tecnologia trouxe grandes benefícios à sociedade, eu amo a tecnologia, mas nem por isto deixo de ser crítico. Vivemos numa era dinâmica, a espiral evolutiva vem sufocando o nosso tempo, a velocidade das coisas e digo ai todas as coisas tal como a tecnologia, os negócios, a vida, tudo, vem aumentando de forma exponencial, e sem sinal de que isto vai mudar. Mas vai, tudo se da por relações complexas das mais diferentes matizes que nem sempre tendem à uma combinação perfeita, os comportamentos são senoidais (ainda publico aqui esta teoria), é como se sistematicamente entrássemos em uma via sem saída, e tenhamos de retornar e tentar novamente, mas sempre aparece um atalho no meio do caminho… Isto esta claro na atual conjuntura, onde o consumismo sufocou o capitalismo, num ato auto-imune, pois a relação consumo x capital perdeu a sinergia. Isto foi exatamente o que aconteceu nos Estados Unidos, para aumentar o consumo aumentou-se o crédito, e ai deu no que deu. Agora corre o risco do consumismo consumir o mundo ou a nós mesmos, é viver e assistir.

Em uma sociedade assim é fácil a disseminação do “trojan intelectual”, como a Érica citou, a indústria cultural mecanizou a relação entre o homem e sua própria subjetividade, é como se os “trojans intelectuais” minassem nosso senso crítico de forma tão sutil que nem nos damos conta disto. Mas existe cura, a cura esta na internet, a internet é a cura, a pluralidade de informações democraticamente disponíveis e díspares  no ciberespaço nos leva a leitura e reflexão, na reconstrução de nosso senso crítico e analítico para que possamos avaliar qual informação é de fato relevante, ou quais partes de cada uma compõe um conjunto sensato.

Muitos críticos irão dizer que a cura para o trojan intelectual esta nos livros e eu digo que não, por uma razão muito simples, os livros fazem parte da indústria cultural, no modelo de publicação atual, com base no copyright, faz do editor uma espécie de filtro de conteúdo, com amplos poderes para decidir o que deve ou não ser publicado. Quando o autor for o legitimo detentor dos direitos sobre sua obra, e quando ele tiver o poder de decidir a publicação, ai sim teremos um quadro onde os livros também farão parte da cura.

Dentro desta visão crítica que estou criando a nova categoria do blog, a que decidi chamar de mantras da irracionalidade, onde farei uma leitura crítica de diversas máximas que muitos usam como verdadeiros mantras emitidos irracionalmente.

Educação, ainda precisamos do velho modelo?

Irapuan Martinez, um velho amigo, sempre defendia a tese de que Internet se aprende na Internet, esta afirmativa ja faz quase dez anos. Por muito tempo argumentei que não era bem assim, afinal eu tinha um Centro de Treinamento Macromedia, e precisava defender o argumento de que aprendendo comigo era mais rápido.

Mas o tempo passou e meu filho cresceu digitalmente livre, nunca instalei nenhum software de controle, e ele sempre teve o proprio computador. Ensinei-o a se defender digitalmente, e sobrevivemos. Ele usou esta liberdade para aprender à aprender. Na web ele aprendeu Perl, Ruby, C#, ActionScript 3, Modelagem de jogos, aprendeu a gerenciar e construir servidores de MMORPG, modelagem de mundos virtuais e agora estava no quarto aprendendo modelagem no Maya, e a cada dia me surpreende com uma novidade.  Tudo isto com poucos livros, alias os poucos livros sobre o assunto continuam novinhos, ele não os usa, aprendeu tudo na Internet. O espirito do consumismo hedônico da nova geração nele se deu pelo conhecimento, ele é um devorador de conhecimento, mas não demonstra nenhum apego com ele, joga fora projetos sem a menor cerimonia.

Meu filho costuma chamar a escola dele de Jurássica, apesar de ter lousas digitais, não permite que o aluno use nenhum equipamento eletrônico em sala de aula. Ele não quer um notebook, pois não pode rodar os seus jogos prediletos, nem um mini notebook porque não o deixarão usar na sala de aula.

O que acabei de relatar do meu filho, é um retrato do que vem por ai, ele não é a media, faz parte de uma minoria digitalmente alfabetizada, a grande maioria das pessoas ainda utilizam a tecnologia sob a égide do preconceito midiaticamente construido, desta forma sempre tiveram a internet sob uma visão distorcida, uma internet como um mundo de perversidade e maldade, e repleta da bobagens e com nada para ensinar, azar o deles.

E é no conflito destes dois mundos que foco meu artigo, que não tem objetivo conclusivo, apenas de levantar a discussão. A semente da questão se deu pelo último Descolagem de 2008, foram várias palestras interessantes e a do Luli, apesar dele aplicar uma dinâmica de locutor às suas palestras, pesquei muitos insights interessantes. Um deles foi sobre o que acontece com a tecnologia no ambiente educacional foi mais ou menos assim:

O educador não entende a tecnologia, o desconhecimento apresenta-se como uma ameaça, e esta ameaça é respondida como o entendimento de que a tecnologia é nociva. Dai surge o bordão de que na Internet só tem bobagem, e que ela “come criancinhas”.

Na verdade sugiro que você leia sobre o Descolagem #3 Educação, e vejam os videos disponíveis, todos os palestrantes tiveram insights interessantes, foi um compartilhamento sublime de conhecimento.

Voltando à discussão, em breve mais crianças serão digitalmente alfabetizadas, com a ubiquidade do acesso à Internet, o computador é o único vilão que os papais dinossauros enxergam. Mas onde iremos chegar?

Simples, muito simples, como diz o Luli, as escolas são verdadeiras redes sociais, ninguem vai para a escola para aprender, vai para encontrar com os amigos, aprendem como consequencia. Alias é justamente no aprender e ensinar que esta a questão.

O modelo falido de educação no Brasil pode ficar pior, e corre o risco das crianças surpreenderem seus professores com informações e novidades que eles mesmos não sabiam. Alguns mitos foram e serão quebrados, e isto demanda uma reação rapida por parte dos educadore e escolas, é uma questão de sobrevivência, antes que eles se tornem obsoletos:

  1. Ensinar a aprender – Para muitos não existe outra opção, o professor precisa mastigar a informação e deposita-la na cabeça do aluno, mas isto é uma herança do secular sistema educional, onde um professor fala e os alunos escutam. É um mal tão sedimentado em nossa sociedade, que quando o professor tenta ser diferente, ensinando a aprender por exemplo, é criticado. Mas o certo é isto, é ensinar à aprender, aprendendo à aprender o aluno aprende a filtrar as informações, mas se o aluno aprender sozinho para que serve o professor?
  2. Orientador e motivador – O professor passa a atuar como um orientador e motivador, um instigador da curiosidade, ensina ao aluno a buscar informações relevantes, a confrontar as discordantes e principalmente o ensina à tirar suas próprias conclusões.
  3. Internet só tem bobagem – Acho que não tem bobagem maior do que esta afirmativa, e o pior é que as crianças estão descobrindo que estão sendo enganadas por seus professores, afinal não é bem assim. Tem bobagem sim, mas tem muita coisa relevante.
  4. A informação precisa ser sistematizada – Esta ai um caso curioso, a sistematização da informação para aplicação em sala de aula é uma herança do tempo que o acesso ao conhecimento era elitizado, hoje em dia muita gente compartilha informação relevante na web, e esta informação esta acessível a qualquer um. A essência esta em ensinar ao aluno à sistematizar estas informação, quem sabe um roteiro de pesquisa não ajude?
  5. Tecnologia tira a atenção do aluno – Na verdade o aluno esta acostumado a interagir, e a buscar informações com velocidade, a nova geração esta ficando multitarefa, é aquela geração que usa o computador assiste TV e ainda pode estar ouvindo música, tudo ao mesmo tempo, “zapeando” de um para o outro na hora em que um tiver algo relevante. Imagine este mesmo aluno sentado numa carteira assistindo a um único discurso vindo de uma única fonte, no caso o professor. Esta na hora de virar a tecnologia a favor da educação.
  6. Use as novas tecnologias – Não evite as tecnologias, a proibição de celular em sala de aula é uma grande bobagem, a nova geração é conectada, e diferente do que se preconizava, tem intensa vida social online, e tem boa parte do seu lazer digital em grupo. As escolas deveriam aprender com a industria dos Games, porque não uma aula por semana no Second Life? Porque não adaptar um MMORPG para ensinar história? Porque não pedir um trabalho de Geografia no Google Maps, ou modelo de física no Flash?

A questão é que não faço ideia de como pode ser o novo modelo de educação, não sou educador, sou publicitário e professor eventual, posso estar falando um monte de bobagens, mas ao menos emito minhas opiniões, compartilho minhas ideias, gosto de uma boa e construtiva discussão.

E você acha que o velho modelo educacional ainda sobrevive quantos anos?

Reescrevendo a história da democracia Brasileira

“Não são as pessoas que tem grandes idéias que mudam o mundo, e sim as que acreditam nelas”.

Esta curiosa frase veio à minha cabeça na minha caminhada vespertina, ela de certa forma sintetiza tudo que esta acontecendo em termos de ciberativismo no Brasil.

O movimento ciberativista vem de muito tempo, eu me engajei em 2006 quando combatiamos o então projeto do Azeredo, éramos verdadeiros Quixotes, poucos se interessavam, muitos criticavam. Continuávamos acreditando na Internet livre, o Senador Eduardo Azeredo revelou-se inimigo numero um da Internet livre, dai a razão dos ataques às suas idéias e projetos. Projetos alias que não perecem ser de fato elaborados pelo Azeredo e suas assessorias diretas, pois em entevista recente o Senador não sabia o que era um DRM por exemplo, e vem cometendo outros lapsos, deixando cair a pele de cordeiro que oculta o lobo de suas intenções.

O movimento ciberativista tem sua beleza não nas ações individuais, ele não tem por objetivo construir ícones, mas sempre quem acaba se envolvendo mais acaba ficando em evidência, mas o importante mesmo é o trabalho em rede, a disseminação em rede. Um trabalho de pesquisa, publicação e articulação é importante num movimento destes, mas o simples trabalho de disseminação, quanto mais em rede é tanto ou mais importante. Disseminadores são hubs, uns são hubs melhores que outros, mas muitos hubs fracos com um pequeno grupo de contados, pode atingir um hub mais forte ou até um super hub que ajudam a disseminar com mais intensidade e até na formação de novos núcleos ciberativistas.

Para tentar explicar este movimento, vou usar uma metáfora, imagine que a internet seja um lago, e os usuários (hubs) estivessem na margem (ponta). Um deles joga uma pedra azulada, alguns usuários percebem a começam a jogar pedras azuladas, umas maiores outras menores, a cada pedra novos usuários começam a jogar as suas, até um momento em que o lago tenha se transformado em um intenso maremoto. Como o lago é muito grande, depois de algum tempo as ondas chegam em outras margens (pontas), e um novo movimento de pedras azuis é iniciado, e um novo maremoto se forma, em outras pontas novos movimento se iniciam, até um ponto em que o maremoto seja intenso e cubra uma enorme extensão do lago. Neste ponto temos o que chamamos de “meme“. Volta e meia neste processo, a mídia, que é um super hub, joga as pedras azuis também, em geral joga pedras bem grandes, que colaboram em muito com o maremoto informacional, mas em momento algum, um único hub mainstream, mesmo que ele seja um super, ultra mega hub, conseguira produzir um maremoto destes, com esta intensidade e uniformidade.

Dai a importância do trabalho em rede, dai a importância do menor esforço de cada um, o que importa mesmo é a soma destes esforços, todos são importantes, todos mesmo, todos estão fazendo a história, estamos assim dizendo, escrevendo uma nova página na história da democracia Brasileira.

O que estamos fazendo agora, e o que esta acontecendo na sociedade Brasileira, será ensinado nas escolas daqui à alguns anos, acredite. Não sei que nome darão a este movimento ciberativista, mas ele terá um nome, ou diversos, e falará do dia em que pessoas conectadas conseguiram fazer um Senador (Mercadante) colocar treze emendas em um projeto extremamente totalitário, reduzindo seu impacto. Este mesmo enorme grupo conseguiu uma audiência pública na Câmara, e não foram os representantes que protocolaram a audiência que a conseguiram sozinhos. Foram cada um, cada assinatura na petição, cada blogueiro, cada twittada, cada boca-a-boca, cada cidadão que juntos pavimentaram as condições ideais para esta audiência. Nesta audiência, um de nossos ilustres representantes, Sérgio Amadeu, teve uma participação gloriosa, que fora fortemente ampliada e defendida pelo Deputado Paulo Texeira, onde no final das contas, o manto de cordeiro do projeto caira definitivamente, revelando-o totalmente nú como um projeto que beneficiará os bancos e a indústria cultural.

Os próximos passos ainda não podemos precisar, mas o delicioso gosto da vitória esta hoje, na boca e na mente de cada “formiguinha” que acreditou e trabalhou neste sentido. Para todos os ciberativistas, e futuros ciberativistas, meus parabéns, estamos reescrevendo a história da democracia no Brasil.

Este post é uma colaboração para o dia da blogagem política, recomendo que você participe da rede ciberativismo e assine e divulgue a petição online contra o vigilantismo.

Acessibilidade, a mesma mancada 10 anos depois

Há pouco mais de dez anos, tempo em que o ICQ bombava e a conexão era em 14.400 bps, uma turma de jovens entusiastas: Eu, o Nando Pereira, e a Keka Marzagão faziamos experiências com o Flash, alias era o que mais faziamos naquela época. Dai surgiu a ideia de criar um site em Flash para deficientes visuais, o projeto “Blindness”.

Era um projeto aberto, dentro do Flash Brasil, e todo mundo poderia participar, a interface era negra e com molduras duplas sensiveis, que se acionadas no sentido de fora para dentro, a gravação da voz de minha irmã falava: – Entrando, caso contrário falava : – Saindo. Na época, o Flash não suportava MP3, nem mesmo video, fizemos uma montagem com o Real Flash, onde o Flash através de artifícios executava um audio no formato Real Audio. Quadrados com gravações em audio davam as noticias.  Na época, em 1997, nem se falavam em usabilidade e acessibilidade e la estavamos nos orgulhosos de nossa obra, que no nosso ver extendia os tentáculos da web aos portadores de deficiência visual. Estávamos fascinados e prontos para anunciar ao mundo nosso projeto genial.

Mas antes disto, o Nando Pereira sugeriu fazermos alguns testes de campo, e foi atrás do pessoal da UFRJ do Intervox, que entendiam do assunto, foram eles os desenvolvedores do DOSVOX, programa de leitura de tela, e muitos eram portadores de deficiência visual. A primeira resposta que o Nando recebeu não fora muito animadora, os portadores de deficiência visual não usam o mouse, o mouse é um dispositivo de apontamento, e para apontar é preciso ver, de forma que eles utilizam basicamente o teclado, uma vez que mesmo que o teclado não possua recursos de braile em suas teclas, a posição das mesmas nunca muda, facilitando a memorização.

Tendo em vista o enorme erro que cometemos, a unica saida era senão, abandonar o projeto, que apesar de muito bacana, não tinha funcionalidade prática alguma para o público alvo, os portadores de deficiência visual. O projeto ficou algum tempo disponível no site, como um case de equivoco, e depois simplesmente o tiramos do ar.  Tal equivoco nos serviu de lição, eu vivo falando destas mancada em minhas palestras, falei dele até na classica palestra da Dinastia do Flash no Brasil que proferi online em 2006.

Para minha surpresa, recebi um email do meu amigo Caparica, onde o Jornal da Paraíba apresentava uma interface bem parecida com a do defunto projeto Blindness, incrédulo fui conferir e verifiquei que haviam resucitado o monstro, só que agora provido de mais recursos, tais como sintetizador de voz e menu alfabético. Onze anos se passaram, e conseguiram repetir a mancada!

O projeto do Jornal da Paraíba, foi anunciado no próprio jornal como inovador, bom alem de não ser inovador como ideia, também não é inovador como mancada, afinal ja haviamos cometido a mesma besteira em 97.  Mas veja o que falam na noticia:

[..]O Jornal da Paraíba lança mais um projeto inovador: a primeira edição digital para deficientes visuais do país. A novidade, que será lançada na quarta-feira (8), a partir das 8h no Garden Hotel, em Campina Grande, vai disponibilizar diariamente o conteúdo completo do jornal através de um recurso multimídia que oferece aos deficientes visuais a oportunidade de ouvir as notícias na íntegra, da mesma forma que são publicadas na versão impressa. Uma iniciativa pioneira que deve facilitar a vida de mais de três milhões de pessoas com limitações visuais no Brasil.[..]

[..]O coordenador de Métodos e Sistemas do JORNAL DA PARAÍBA, Washington Lima, responsável pelo desenvolvimento do projeto, conta que a tecnologia do sistema foi toda elaborada na própria empresa com o objetivo de apresentar à sociedade um produto que permitisse ouvir as notícias a partir de uma tela com leitura eletrônica.

“O setor de desenvolvimento criou uma tela sintetizada que emite sons a partir do movimento do cursor, denominado módulo de leitura eletrônica. Através deste recurso, o mouse passa a ser fundamental para quem quer se atualizar via internet, mas não tem visão ou não teve oportunidade de aprender a ler”, explica Washington Lima sobre o mais novo projeto de responsabilidade social do veículo.[..]

Acho que erraram nos dois alvos, o portador de deficiência visual não utiliza mouse e o analfabeto não saberá ler os botões.

O grande MAQ, Marco Antônio de Queiroz, o chamo de grande, pois é uma pessoa espetacular, um exemplo de determinação e persistência para contornar os obstáculos que a vida colocou no seu caminho, é um consultor em acessibilidade, e portador de deficiência visual. Quando inicia suas aulas de acessibilidade, a primeira coisa que ele manda fazer é tirar os monitores e mouses dos laboratórios.

Meu amigo Caparica, alem do link para a “novidade” do Jornal da Paraiba, ainda me mandou um link para um tópico no Forum Acesso Digital, e eis que encontro uma mensagem do MAQ a cerca do projeto:

[..]Nenhum cego tem a experiência de entrar no Windows ou Linux sem ativar seu leitor de telas, pois estaria inteiramente perdido sem ele. Assim, o fato de contarem que nós entremos no jornal sem o nosso software já é algo inteiramente fora do padrão. Se um de nós estivermos em uma lan house, sem nosso leitor de tela em um pen drive, como chegaremos até o jornal, mesmo que neste já haja sintetização de voz? Somos dependentes da navegação via teclado em conjunto com nosso leitor de tela. Sem esse, ficaríamos dependentes de quem enxerga para chegar até o jornal. Lá no jornal, como os procedimentos para manipulação da sintetização, fundamental para nós, é toda diferente do que estamos acostumados, ou seja, por via do mouse, ficamos dependentes de alguém que enxergue para ir nos dizendo como fazer cada jogada, leitura, etc. Quem sabe os amigos não incluém em sincronia com o mouse, a navegação via teclado e, assim, o jogo e a leitura  poderiam ter um acesso universal?

Nenhum cego tem o costume de utilizar o mouse, nossa navegação é via teclado. Alguns de nós, nem mesmo tem mouse. Isso de não ter mouse e monitor é um radicalismo de alguns, alguns que moram sozinhos e tem como amigos, em sua maioria, pessoas também cegas. Mas, tudo bem, vamos que alguns se impolguem tanto que entrem na página do jornal, desliguem seus leitores de tela e comecem a manipular os comandos e sintetização do jornal. A curva de aprendizagem será enorme, pois toda ela é baseada na experiência de um usuário que enxerga, pois arrastar algo com o mouse clicando ao mesmo tempo é coisa que eu, por exemplo, desde 1995 na internet, nunca fiz com um mouse! No entanto, é coisa corriqueira para quem enxerga. Não seria mais interessante aproveitarem  a nossa experiência de teclado e criar um link que cada vez que déssemos enter o volume fosse aumentando?[..]

Pronto, e agora Jornal da Paraíba? Podia ter ficado sem este “mico preto” e ter economizado uma grana do lançamento do inovador recursos, para tal bastaria ter feito o que qualquer profissional de marketing, faria, estudar melhor o público alvo.