Eu cresci na zona sul, e depois em um condomínio de classe média alta e jacarepaguá, e confesso que analisando o “ambiente” em que cresci, compreendo claramente esta viralatice insana que ganha as redes.
A adoração aos Estados Unidos sempre esteve nos centros dos debates de nossos pais e vizinhos, porque lá era lindo, porque a faxineira americana tinha carro, porque lá as coisas funcionavam, porque o povo era limpinho, porque lá não tinha pobreza. E este discurso passava de pai para filho, toda minha geração foi contaminada com esta perspectiva cultural. Alias ai está o gancho!
Desde o pós guerra, os Estados Unidos exportaram seu mais importante ativo, a cultura americana. O engrandecimento da indústria cultural americana, e digo cinema, música, e até basicamente tudo que liamos quando criança. Eu mesmo lia todas as publicações das Disney e tinha todos os manuais que foram publicados. O sonho do viralata americano começava desde pequenino.
Ícones, valores e símbolos americanos permearam a cultura da tal classe média de uma forma que a única forma de se sentir no primeiro mundo era se tornando americano, abdicando da própria nacionalidade brasileira. Me lembro de minha tia comentar perplexa que a vizinha dela na Gávea ostentava orgulhosa a foto do filho brasileiro, com uniforme da marinha americana. Muitos amigos sonhavam mudar para os Estados Unidos, até eu sonhava em ser americano.
Não percebia como estes valores eram entregues nos filmes, revistas em quadrinhos e até nas músicas, só achávamos aquilo fantástico. We love america! Tínhamos vergonha de ser brasileiros, isto criou uma imagem curiosa, ninguém podia ver alguém falando inglês, sem lhe dar logo o status de celebridade. Quantos americanos das classes mais baixas não se sentiram assim em terra brazilis?
Muitos de minha geração foram para a “america”, e agem como se americanos fossem, apesar de estarem presos entre dois mundos, o de que nunca serão americanos de fato, e o de que nem brasileiros. São os intermundos, mas se estão felizes, que sejam.
Esta mesma classe média, ou seria melhor, mérdia, foi incapaz de se enxergar como primeiro mundo, quando no governo Lula, o Brasil se tornou a 6a maior economia, e tínhamos um respeitoso reconhecimento como nação emergente e progressista, eu mesmo vi isto por várias vezes nos fóruns da ONU que participei por anos. Essa classe mérdia pedia desculpa por nossa ousadia, pois até o ministro da Cultura, o Gil revolucionou o valor da cultura brasileira mundo afora, que ousadia!
Curioso ver que esta mesma classe mérdia que achava o máximo a faxineira andar de carro nos EUA, ficava indignada com a faxineira andando de carro e avião por aqui, e a gota d´água foi quando o filho da faxineira entrou na faculdade e o da patroa não.
Na verdade dentro deste ambiente social se cultivava uma noção de status e valores que não condiziam com os nosso valores brasileiros, brasilidade passou a ser brega, chique mesmo é ser americano. Isto criou uma estranha vergonha de nossos valores.
Olha, mérdia por mérdia, eu acho os EUA uma merda, a única coisa boa de se fazer por lá é compras, eu descobri isto depois de rodar o mundo, até a Africa é mais interessante, e a Europa, não da nem para comparar com os EUA, sem dúvida, depois do Brasil, a Europa é um continente interessante.
No fim das contas, vamos o país ser destruído por um presidente totalmente despreparado, mas legitimo representante desta classe mérdia da barra da tijuca, que prefere ser viralata dos EUA do que ter orgulho de ser brasileiro. Isto explica comportamentos bizzaros da família que conduz o país a deriva, e seu amor subserviente aos EUA, e as manifestações pró Trump dos viralatas que não aceitam ser brasileiros, mesmo que nunca serão americanos, apenas idiotas úteis…
Há muito tempo venho avaliando a sociedade atual como sendo econocêntrica, aquela que tudo percebe pela ótica da economia, ou em outras palavras, a economia é a estrutura pela qual a sociedade avalia o mundo que a cerca. O Brasil, um país onde mais de 90% da população tem uma renda mensal inferior aos R$ 4.377,73, que são concedidos à titulo de auxilio moradia aos juízes, não parece fazer o menor sentido nos preocuparmos com o fato do índice BOVESPA ter caído ou o dólar ter subido, ou ainda que a projeção do PIB subiu 0,01%, quem dirá com a taxação de grandes fortunas. Ainda mais se levarmos em conta que 61,2% das famílias brasileiras estão endividadas, e 25,2% estão inadimplentes.
Criaram a “classe média” para apaziguar quem iria se rebelar se percebesse que somos todos pobres: precisamos trabalhar para mantermos nosso estilo de vida e não morrermos de fome.
A polêmica se deu pela reação desmedida de alguns leitores ao título — “A quem interessa uma classe média que não se vê como pobre?”-, e ao conteúdo, crítico e realista. Mas esta noção de realidade é difícil para todo mundo, você por acaso se imagina pobre? Então deixa eu te mostrar uns dados e gráficos que extrai do PNAD de 2017 e algumas matérias por ai. Segundo o PNAD, o rendimento médio mensal do Brasileiro foi de R$ 2.178,00, menos da metade do auxilio moradia de um juiz. Assim como apenas 4% da população ganha em média R$ 9.782,00 e apenas 1% ganha em média R$ 27.213,00, vejamos o gráfico que montei a seguir:
Como você pode ver, a tal elite que representa o famoso 1% da população não são estes que ganham em média R$ 27.213,00. Olhando este gráfico, você que está na classe A ou B, se sente um milionário, visto que 65% da população ganha em média R$ 1008,00, então você ganha em média entre 9 e 27 vezes este valor.
Mas sabemos que tem gente ganhando muito mais de 27 mil por mês, provavelmente o IBGE expurgou os supersalários. Tomemos os juízes por exemplo, 71% ganha acima do teto constitucional que é de R$ 33.763,00 configurando um salário médio de R$ 42.505,66. Temos ainda os CEOs de grandes empresas, que ganham em média R$ 142.000,00 por mês. E não podemos deixar de incluir os apresentadores de TV, os 10 mais bem pagos, ganham em média a bagatela de R$ 1.000.000,00 por mês, tem ainda os donos e executivos das emissoras, jogadores de futebol, mas vamos ficar só com estes aqui mesmo. Colocando esta turma no gráfico anterior temos um cenário interessante:
Observe como as classes B e C, a dita classe média ficou insignificante, até mesmo a classe A, e visualmente pouco distante das demais classes abaixo dela. Se tirarmos uma média dos supersalários temos R$ 394.835,00 que é 14,5 vezes maior que o salário médio da classe A, 40,36 vezes maior que o salário médio da classe B, 75,73 vezes maior que o salário médio da classe C e 181,28 vezes maior que o salário médio do brasileiro em 2017!
Mas mesmo eles não são a tal elite, todos trabalham, a elite, ou seja, os ricos, não possuem salário, pois não trabalham, vivem literalmente do mercado financeiro, e suas riquezas permeiam diversas empresas, institutos e organizações que custeiam suas despesas e detém seus bens.
Porque somos uma sociedade míope?
Acredito que agora você compreenda melhor quem são os detentores das grandes fortunas que tanto se quer taxar, e que a sua distância social para a do trabalhador que recebe um salário mínimo é insignificante frente à sua distância para os mais ricos. Mas mesmo assim, boa parte da sociedade não enxerga isto, enxerga por uma perspectiva míope, ou seja, uma perspectiva imaginária e distorcida, mas que é diariamente estimulada por todos os meios de comunicação e valores culturais e históricos que pavimentam a sociedade brasileira.
Diferente da visão de igualdade e pertencimento do europeu, que consolidou com o pacto social do pós guerra, na reconstrução dos países e do continente, o brasileiro herdou uma cultura do desprezo de classe da época da escravidão em conjunção com a visão de subserviência de um país que ainda não perdeu a identidade de colônia, nossa visão de sociedade em muito se assemelha com o sistema indiano de castas.
Enquanto não rompermos com esta perspectiva, e guturalmente nos percebermos como uma nação, onde cada um tem um papel importante na sociedade, que merece ser admirado e respeitado pelo que representa, nunca sairemos desta espiral negativa que nos assombra periodicamente.
O Brasil está neste momento numa das piores espirais negativas que vi em meus pouco mais de 50 anos, nunca vi tanta intolerância, preconceito e ódio de classe. Também nunca vi nossa sociedade tão desorientada, generalizando o mal, e personificando o bem, reduzindo questões complexas a perspectivas cartesianas e polarizadas, como se estes assuntos fossem passíveis de resolver por uma lógica booleana.
Depois o impeachment, ou melhor do golpe de 2016, por causa deste comportamento assistimos passivamente o maior desmonte do Estado da história, nem mesmo na ditadura se chegou à tanto, mas nossa sociedade segue entretida, numa troca de papéis, sentimentos e ofensa, ora movido pela vergonha, ora pelo ódio, como se de fato fôssemos responsáveis pelo que esta acontecendo.
Somente se pararmos a espiral negativa conseguiremos enxergar com clareza e reagir a tempo de salvar o pouco que resta de Brasil, faça as pazes com seu amigo ou parente que você brigou por causa de bobagem, mostre que estamos do mesmo lado, que é bom que tenhamos opiniões divergentes, mas principalmente que agora estamos aberto a debater, com calma e sabedoria. Vamos aplicar uma visão crítica às informações e noticias que nos chegam, isto significa olhar com desconfiança, buscar o controverso, debater, ouvir, concluir e ainda assim, estar disposto a mudar novamente. Vamos fazer um exercício…
Pouca areia pro nosso caminhãozinho
Quando falei lá no inicio que não fazia sentido nos preocuparmos com a variação do dólar, do índice BOVESPA e do PIB, é porque este indicadores não nos afetam diretamente, vamos falar de caminhão e petróleo para você perceber o que estou dizendo.
O locaute ou greve dos caminhoneiros, que vem promovendo uma crise de abastecimento crescente, não só de combustível, mas também de produtos frescos como hortifrutigranjeiros, e agora a greve dos petroleiros, revelando um grave problema que passou despercebido. Enquanto a grande mídia responsabilizava o governo anterior por subsídios excessivos no preço dos combustíveis, a realidade vinha de dentro da petrolífera. Na gestão de Pedro Parente, desde outubro de 2016 a Petrobras adotou o pareamento com o preço internacional do Petróleo, por esta razão os combustíveis subiram tanto. Segundo a Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET), esta política que vem ganhando o apelido de “America First!”, beneficiando as petrolíferas Americanas, estamos exportando quantidades enormes de petróleo bruto e importando quase todo combustível, tornando nossas refinarias ociosas.
Com o desemprego beirando os 14%, a política de preços da Petrobras só piora as coisas, indústrias de capital intensivo como a petrolífera, giram um verdadeiro ecossistema econômico em seu entorno, produtos e serviços auxiliares, por exemplo. Com a ociosidade das refinarias teremos em breve ainda mais desempregos. Só por esta razão o subsídio seria de longe a melhor alternativa, ainda assim, a AEPET destaca em sua nota que o subsídio dos governos anteriores nunca afetaram a geração de caixa. Mas a grande mídia cumpre seu papel, fazendo a população acreditar que foram os subsídios do governo anterior os responsáveis pelos sucessivos aumentos do preço dos combustíveis, escondendo a verdade, ou pelo menos a outra perspectiva do problema.
Ainda pensando em termos práticos, apesar de estarmos exportando petróleo como nunca, não iremos nos beneficiar deste aumento de receita por causa da PEC 241 que congela o orçamento da união por 20 anos. E ao conceder a exploração do precioso pre-sal às companhias estrangeiras, além do aumento do desemprego, corremos ainda o risco de ficarmos sem nossa reserva estratégica de petróleo em poucos anos.
Nos governos anteriores, o Brasil seguiu o sucesso norueguês com o pre-sal, destinando 100% dos seus royalties para a saúde e educação, a mesma Noruega que agora detém 25% do campo de Roncador na bacia de Campos, o Brasil perdeu, perdeu e vem perdendo, estamos fadados a um colapso em poucos anos. O golpe nos derrubou pirâmide de Maslow abaixo, antes visávamos o auto reconhecimento, e o pertencimento social, hoje estamos nos preocupando com o básico que é segurança, emprego e moradia.
Temos de mudar isto, mas não com o ódio, e sim com o amor…
Vamos citar um caso “hipotético”, bem hipotético, qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência, muita coincidência…
Imagine que uma determinada desembargadora tenha recebido de uma amiga pelo WhatsApp, uma informação falsa, ou até mesmo um comentário, sobre uma vereadora assassinada. O texto dialoga com os valores da desembargadora, inclusive por causa do viés de confirmação, a desembargadora relutaria a acreditar em uma outra versão da Informação. Com base na informação recebida, a desembargadora faz uma declaração no Facebook, e aproveita para acrescentar mais alguns detalhes, deixando-a mais convincente pela sua perspectiva.
Este texto falso é sobre o assassinato de uma vereadora que investigava os abusos da policia em uma comunidade, tudo hipotético é claro.
Um jornal e uma revista de grande circulação, repercutem a declaração da desembargadora com um título clickbait, ou seja, um titulo sensacionalista que chama a atenção para a leitura do artigo. Na verdade, é um titulo que dialoga com o viés da confirmação de muitos, que irão compartilhar o link sem ao menos ler a matéria.
E na matéria, no final, a desembargadora declara à repórter que não conhecia a vereadora antes do assassinato. Como assim, se ela não sabia nada da vereadora, como pôde dizer no Facebook que a vereadora era associada ao narcotráfico????
Ou seja, a desembargadora criou e disseminou uma fake news, que foi repercutida pela grande mídia, e posteriormente reverberada pela Internet.
Agora tomemos esta história pela luz da narrativa que esta sendo construida pela mídia e pelas instituições governamentais sobre as fake news, ou seja:
A fake news como objeto central da narrativa, tendo como seus produtores e disseminadores os “militantes” e os “oportunistas” e como consequência uma séria ameaça à democracia. (Extraido de estudo recente que fiz sobre a narrativa do combate às fake news)
Do estudo que fiz sobre a narrativa do combate às fake news, elaborado após a leitura de oitenta noticias em torno da narrativa do combate às fake news publicadas na internet, no período de 1º de Outubro de 2016 à 22 de Janeiro de 2018, extraio o seguinte trecho:
Para o Senador João Alberto Souza (PMDB-MA) elas são uma grande ameaça à democracia(1). Segundo ele, o indivíduo que espalha notícia falsa comete crime de difamação, a punição deve ser agravada porque o prejuízo passa a ser de toda a sociedade. Para o Ministro do TSE Tarcisio Vieira, as fake news criam “consensos artificiais” e “prestam um enorme desserviço à democracia”(2) e o Estado deve atuar para proteger o eleitor. Para combater esta séria ameaça o Ministro Fux, que assumirá o TSE em Fevereiro de 2018, acredita ser necessário até bloqueio de bens e detenção de quem produzir e disseminar fake news(3). Já para a Polícia Federal, nas palavras do delegado Eugênio Ricas, poderá ser necessário usar a Lei de Segurança Nacional, editada em 1983, no último governo do regime militar, para coibir as chamadas fake news nas eleições deste ano caso não seja criada uma nova lei para combate-las(4). Em nota no Jornal O Estado de São Paulo em 19 de Janeiro de 2018, o diretor geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, afirmou ter acertado com o FBI a participação de um grupo de especialistas em fake news e dark web para elaborar um diagnóstico da utilização de informações falsas no Brasil.
O atual presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, criou um conselho especialmente para tratar da questão das fake news e reúne dez representantes de diferentes orgãos, incluindo o Centro de Defesa Cibernética do Departamento de Ciência e Tecnologia do Exército Brasileiro, e a ABIN.
A revista Veja publicou em 12 de Janeiro uma edição com destaque sobre o tema, e em um dos artigos com acesso público intitulado “A ameaça das Fake News”(5) apresenta um recorte dizendo que: “83% dos Brasileiros se preocupam com a enxurrada de noticias falsas que circulam na Internet”, e identifica dois tipos de “propagadores de fake news à solta”: “militantes empenhados em atacar a reputação dos adversários políticos de seus candidatos e empresas ou indivíduos que fabricam notícias falsas com o intuito de ganhar dinheiro por meio dos anúncios — sobretudo vindos do Google AdSense, braço de publicidade do Google”.
Sob esta perspectiva – que é extremamente equivocada – como você acha que se dará o desenrolar desta história?
Mantras da irracionalidade são dogmas, conceitos e valores repetidos e assimilados por nossa sociedade que foram injetados em nossa cultura por estratégias de comunicação. São mantras que não nos pertencem, e que não resistem à uma analise. Muitos se surpreendem de repeti-los e ficam ainda mais surpresos em perceber que eles nunca foram questionados e que nunca foram construidos pelos indivíduos. O mundo a nossa volta esta cheio disto, aos poucos vamos revelando por aqui.
Vamos pensar um pouco em prosperidade, quem é prospero ou não em nossa sociedade e como avaliamos isto. Prosperidade é ter ou parecer ter? Prosperidade é ser ou parecer próspero? Somos prósperos ou meros coadjuvantes em um perverso sistema de poder? Mas afinal o que é prosperidade?
Prosperidade (do latim prosperitate) refere-se à qualidade ou estado de próspero, que, por sua vez, significa ditoso, feliz, venturoso, bem-sucedido, afortunado
Apolônio e Esnóbio
Imaginemos dois irmãos, Apolônio e Esnóbio. Apolônio nunca deu valor ao consumismo, mora na mesma casa no subúrbio há anos, é uma casa simples, mas muito confortável e espaçosa. Seu carro é um velho modelo 2005, mas está em boas condições, atende às necessidades de sua família. Apolônio leva uma vida confortável e sem sobressaltos. Esnóbio sempre foi ambicioso, mora em um apartamento em um luxuoso condomínio, a duas quadras da praia, seu carro é um modelo do ano, e leva uma vida agitada, trabalha muito e tem pouco tempo para a família, ao contrário de seu irmão Apolônio que tem a família em primeiro lugar.
Creio que você que esta lendo este texto já tenha feito juizo, então pergunto: Qual dos dois irmãos é o mais próspero: Apolônio ou Esnóbio? Não precisa responder agora, vamos continuar a história.
A esposa de Apolônio estava comentando com ele, que todo mês o irmão quer fazer uma retirada extra na empresa da família, eles são sócios em uma empresa de auto serviço. Apolônio já cansou de aconselhar o irmão à mudar seu estilo de vida, que se continuasse assim não haverá dinheiro suficiente para atender seus caprichos. Esnóbio invariavelmente respondia ao irmão que ele pensava pequeno e que nunca iria sair daquela casa do subúrbio e ia continuar andando com aquela “lata velha”. Apolônio não se importava, afinal nunca pensou em sair dali, a casa era boa, espaçosa e a vizinhança bem agradável. Como são sócios ambos fazem retiradas iguais, inclusive as extras. Além da sociedade com o irmão, Esnóbio da aula na faculdade a noite, ele enche os olhos dos alunos, como modelo de sucesso.
Agora você que esta lendo este texto tem condições de avaliar qual dos dois irmãos é o mais prospero? Então vamos continuar:
Apolônio comenta com a esposa que o irmão estava pagando quase 2 mil Reais por mês de condomínio, e ainda tinha a prestação do apartamento e do carro, que o irmão estava na verdada afundado em dívidas, trabalhava atrás do dinheiro e não na frente dele. Apolônio não conseguia aceitar o estilo de vida do irmão, achava que ele estava se tornando um escravo do consumo. Com sua casa e carros quitados, as retiradas de Apolônio estavam indo para aplicações da família, que todo ano viajava para o exterior, em especial este ano que o filho de Apolônio estava se preparando para fazer faculdade na França. O casamento de Esnóbio estava por um fio, sua esposa não podia aceitar o fato de não poder comprar um novo vestido para ir à festa da amiga socialite, e o filho do casal ainda não havia chegado do cursinho pré-vestibular, o menino estudava feito um louco para passar para uma faculdade pública, já que o pai falou que não iria pagar faculdade para marmanjo.
Veja você minha cara leitora e meu caro leitor, creio que não haja dúvida sobre quem de fato é próspero e quem não é. Nossa sociedade é assim, temos uma tendência enorme ao reducionismo, por conta disto somos vitimizados pelos mantras da irracionalidade. Esnóbio apesar de ter uma renda maior que Apolônio e apresentar sinais externos de prosperidade é na prática muito menos prospero que o irmão suburbano Apolônio. Imagino que não haja surpresa nesta revelação, mas vamos aos fatos.
A casa e o carro de Apolônio já estão quitados, apesar de ambos valerem 1/3 do valor do apartamento e do carro de Esnóbio, neste quesito o patrimônio de Apolônio é maior. O sistema é perverso, mesmo que Esnóbio tenha quitado 2/3 das parcelas do financiamento do seu carro, ele ainda esta devendo o valor do carro, mas o valor de compra e não de revenda, deste modo tudo que ele pagou até então no carro não teve impacto no seu patrimônio. O mesmo se dá com seu apartamento, ele esta pagando, mas ainda deve dois apartamentos. No caso de Esnóbio, ele não tem patrimônio algum, ele trabalha para girar a perversa roda do sistema bancário, que oferece crédito como se estivesse oferecendo deliciosas guloseimas para as crianças.
Desde que me entendo por gente vejo a tecnologia mudar o mundo à minha volta, os homens foram a lua, satélites e mais satélites, robôs nas fábricas, computadores, inteligência artificial, e muita ficção científica. Desde então a sociedade assistiu seu espaço ser invadido pela tecnologia. Tudo em nome do progresso que não poderia parar. Tivemos de assistir nossos postos de trabalho serem aniquilados, profissões dizimadas, e a tecnologia pouco a pouco ganhar o centro das atenções. Sindicatos, associações e outros representantes de coletivos foram a luta, mas sem sucesso, afinal o progresso não pode parar. O progresso é aliado do capital, o trabalho é despesa, o objetivo é o lucro.
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: a fita cassete vai acabar com a indústria fonográfica!
Pela ótica do capital esta tudo correto, quem lembra da reengenharia, um conceito até interessante, mas que fora usado como artifício para provocar a maior onda de demissões de todos os tempos. O capitalismo sempre foi focado no lucro, tanto que mão de obra até hoje é entendida como insumo, assim como os materiais, um orçamento sempre foi composto de insumos e lucro. Lucro este desejado, a palavra de ordem é competitividade, temos de ser competitivos, afinal o capitalismo é selvagem, e somente os mais competitivos sobrevivem. Entenda que não é nada pessoal, dizia o patrão ao demitir funcionários de longa data, é a busca pela competitividade e sobrevivência da empresa que esta em jogo, empresas não podem ter coração…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: O video cassete vai acabar com a indústria cinematográfica!
A Arte da Guerra do Pai rico, que virou a própria mesa antes do Safari de Estratégias do Príncipe, na busca de um monge que virou executivo. Até hoje não sabemos quem roubou meu queijo, e nem quem foi o Fora de Série que chegou no Ponto da Virada em Caminhos e Escolhas na busca de um Freakonomics. Mesmo que o Marketing seja Lateral ou vá além do Buzz, ou gerenciamos a experiência do consumidor ou tentamos entender a cabeça do Brasileiro. O líder do Futuro faz uma Liderança Radical, diz que Sobreviver não é o bastante e não gosta de Sundae de Almôndegas. Tanta coisa fora sistematizada para alavancar o progresso, para girar a roda da fortuna em prol da competitividade e do lucro.
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: O CD vai acabar com o LP!
Meados dos anos noventa, o fim do mundo estava próximo, o bug do milênio que assombrava todo mundo, na verdade era apenas mais um mercado construído em cima de dúvidas e incertezas. Estávamos sendo usados mais uma vez. As profecias diziam: o fim do mundo esta próximo! A Internet chegou, uma nova parafernália eletrônica que chega para divertir os nerds e conectar os acadêmicos, um espaço de poucos. A Internet chegou!
Como falavam em globalização! O mundo como uma maravilhosa aldeia global, onde todos consumiriam alegremente, anunciavam o inevitável fim da cultura local, e enalteciam as maravilhas de mundo globalizado. Na prática estavam alinhavando novos mercados, o progresso não pode parar! Aquele tênis bacana é produzido no terceiro mundo por mão de obra escrava com uma marca registrada nos “Staites” que valia mais do que custava o sapato, que não valia nada. Era o tal do insumo que ficou pequeno perto do lucro, a ciência do preço agora contava com um fator de subjetividade ainda não entendido, mas pouco importa, felizes consumidores pagavam lucros exorbitantes para ostentar seu mimo. As corporações cresciam, cresciam como nunca…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: Pirataria é crime!
B2B, B2C, G2B, G2C, A2Z; A2Z,G2B,B2C,G2C,B2B, e-learing, e-enterprise, e-commerce, e-gov, e-tudo. e-Siglas e letras 3 letras povoaram o vocabulário corporativo. A Economia Digital ensinava a Vender seu Peixe na Internet e tudo Fazia Sentido. Webonomics levou ao Net Gain, mas We the Media ainda não haviam estabelecido as Novas Regras da Comunidade. O capitalismo virou bits, o free shop ficou à dois cliques de distância, que beleza! Globalização! O mundo agora ficou pequeno, e todo mundo achando tudo muito lindo, não percebiam a intenção latente, a nova ordem era transformar empresas em mega corporações, maiores e mais poderosas que as nações…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Tínhamos de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: Agora quem manda são as corporações, afinal oferecemos aquilo que o fizemos desejar.
Descobriram o usuário, a Internet ficou popular, ficou fácil para qualquer um produzir, criar e compartilhar, deixem eles brincar diziam as novas nações-corporações, afinal o Culto dos Amadores não podem nos ameaçar. Mas as Novas Regras da Comunidade mostravam o Valor das Redes que através de seus Trust Agents corriam em busca de Socialnomics, mas na verdade estavam muito mais interessados no Group Genius. Esta sociedade conectada, alinhadas por ideologias eram vistas como excelentes oportunidades de negócios, afinal nichos e mega nichos sempre seduziram qualquer corporação em busca de novos mercados. Eles “brincavam”, faziam mashups, blogs, e se conectavam através de redes sociais. Excelente dizia o establishment, nosso plano de dominação vai de vento em popa…
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: O mundo de pontas esta se alinhando com o Manifesto Cluetrain.
Inteligência coletiva, cognição interativa, pensamento globalizado, juntos os usuários ficavam mais inteligentes, mais inteligentes que a soma das suas inteligências. Inteligência coletiva, crowdsourcing, dinheiro P2P, mobilização coletiva e o povo foi para as ruas sem um lider específico, sem uma pauta específica, a indignação mostrou sua cara. Era a crise da representativade que estava em jogo, era o modelo atual do mundo que estava em jogo, como diz Rushkoff, eles querem trocar o sistema operacional do establishment e dar um reboot geral.
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: O povo unido jamais será vencido!
Precisamos parar este trem diz o establishment preocupado, vamos estudar esta tal de Internet que agora quer nos pegar, vamos mudar a regra do jogo, vamos controlar as informações, basta dizer que pobres velhinhos são roubados na Internet, ou falar de pedofilia, ou ainda de gente pelada na rede, o velho discurso da pirataria não colava mais, mas TPP vem ai para nos vingar. Enquanto isto vamos dominar a infra-estrutura dizendo que Internet é telecomunicações, dizendo que Internet é um espaço de negócios e que deve seguir as regras do mercado, assim calamos nossos inimigos, e voltamos a lucrar como nunca.
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Eles vão ter de aceitar, afinal o progresso não pode parar…
Diziam: Quem manda no seu pais somos nós!!!
Hoje me surpreendi com um email do Scribd informando que um documento meu havia sido removido por violação de Copyright, fiquei imaginando como eu mesmo poderia ter me violado, ou quem supostamente deteria o copyright do meu conteúdo intelectual, a mensagem não é nada clara como você pode ver abaixo:
Ou seja, a mensagem não te informa o motivo e nem quem solicitou a retirada do meu conteúdo, e além do tom ameaçador não tem nenhuma informação adicional. Apenas descobri quem solicitou a retirada do documento quando cliquei no link do documento removido, dai pude ver que foi removido à pedido da ABDR.
Deste ponto em diante a tarefa estava em tentar adivinhar o que havia motivado o pedido de remoção do meu conteúdo pela ABDR sob alegação de violação de copyright, verifiquei que o texto original, publicado em 2008, continuava lá no Jornalistas da Web, assim como o texto revisado publicado aqui neste blog. No Scribd também encontrei a versão revisada do texto em PDF, bem como em outros blogs que reproduziram o texto. Então pude concluir que o que havia motivado a ordem de retirada não estava relacionada ao texto, foi quando abri o PDF que havia enviado ao Scribd e percebi na hora o que poderia ter motivado a ordem de remoção por parte da ABDR.
A foto de divulgação da capa de um livro foi motivo para apagar um texto inteiro!
Entendeu? Pois bem, todo o texto de minha autoria foi removido à pedido da ABDR (Associação Brasileira de Direitos Reprográficos) por causa desta foto da capa do livro de Chris Anderson usado como divulgação pelo editor do Jornalistas da Web!
Ou seja, a Mafia do Copyright não esta nem um pouco preocupada em prejudicar os conteúdos livres, se dentro de um conteúdo livro tiver algo que a mafia sinta-se prejudicada, ela não hesitará em aniquilar. Existem infinitas situações absurdas envolvendo a mafia contra a cultura livre, o caso emblemático do “dancing baby” onde a mãe foi processada por publicar um vídeo de 29 segundos que tinha ao fundo uma música da Universal Music, ou aqui no Brasil a Folha de São Paulo processou o blog humoristico Falha de São Paulo sob os mais esdruxulos argumentos de violação de copyright. Existem mil outros casos, a EFF tem até mesmo o Hall da Vergonha, mas a mafia ignora isto.
A Mafia do Copyright quer eliminar a concorrência
Agora vamos entender as motivações, no caso da Folha x Falha, a primeira argumenta que o blog humoristico Falha estava violando seu copyright por usar fontes semelhantes a sua e que o blog poderia ser confundido com o site jornalistico…. é eu sei que você esta caindo na gargalhada, mas é verdade. No meu caso, o Jornalistas da Web colocou uma foto da capa do livro do Chris Anderson para divulgação e ao imprimir em PDF a foto foi junta, e esta foto da capa deu o “direito” a ABDR de requisitar a remoção do meu texto, e veja que até aqui estou apenas supondo, pois ainda não fiz a minha contra-notificação e não sei o motivo oficial.
Na verdade a Industria de Intermediação cultural quer, além dos lucros imorais, é evitar que a sociedade se dê conta de que ela se tornara obsoleta, ou pior, quer na verdade eliminar o seu principal concorrente: Nós mesmos.
Ou seja, não querem perder os mais de 90% que ficam com o trabalho dos escravos da cultura sob o argumento que os custos de produção, divulgação e distribuição são elevados, e como podem sustentar este argumento com a Internet provando justamente o contrario?
A Mafia Autoral quer melar o Marco Civil da Internet
O Marco Civil da Internet, que nos defenderia, ao menos no caso de sites hospedados no Brasil e/ou de empresas com escritório no país, sofreu um forte lobby da máfia autoral, que inseriu um paragrafo 2º no artigo 15, dando-lhes o direito de requisitar remoção de conteúdo sem ordem judicial, ou seja, querem trazer para o Brasil este “direito” que eles tem de sequestrar qualquer conteúdo que mesmo que supostamente, viole copyright, não é preciso dizer o estrago que isto vai ser para a Cultura Livre.
Por fim deixamos a critica de Frank La Rue, relator especial de direitos humanos da ONU, ao paragrafo 2º do artigo 15 do Marco Civil
Este post não termina aqui
Este post não termina aqui, vou enviar minha contra-notificação e os manterei informados em detalhes.
Estamos vivendo um momento extremamente crítico, movimentos globais nas quatro arenas (vídeo abaixo): Legal, Comportamental, Técnica e de Governança estão atuando em conjunto colocando em prática diversas estratégias para o controle da rede. Os atores deste processo são facilmente identificáveis: Na esfera corporativa são os “atravessadores” do direito autoral e propriedade intelectual, as empresas de Telecomunicações, os bancos e a velha mídia. Na esfera governamental são as policias (em geral Federal), o judiciário, o executivo e o legislativo conservador. Estes atores atuam formando uma espécie de tripé que os sustentam, o Tripé do Atraso“, suas motivações são diversas, mas podemos reduzir a duas: dinheiro e poder.
Esta estratégia global de controle esta sendo conduzida com muita pressa, nas quatro arenas, e com planos de contingência em diversos níveis. Veja por exemplo que na arena legal tivemos a derrocada do SOPA no Congresso Americano e o surgimento do CISPA, o ACTA morreu na Comissão Européia, sendo negado pelo Parlamento Europeu, mas o TPP segue. O maior risco à liberdade na rede está justamente na arena da Governança da Internet, pois em geral a sociedade desconhece os princípios de Governança da Internet (vídeo abaixo, e um movimento efetivo nesta arena pode realmente tomar o controle da Internet.
Ainda dentro do conceito de Governança da Internet residem conceitos sutis e mal interpretados são eles o conceito de neutralidade e a a separação entre serviço de valor adicionado e serviço de telecomunicações. Muita gente confunde neutralidade da Internet, que é um conceito técnico que se resume em isonomia no tráfego de dados, com conceitos como o da imparcialidade, dentre outros. No vídeo a seguir eu explico o conceito da Neutralidade, um princípio de extrema importância para a Internet e que precisa seguir estritamente as recomendações do CGI.BR, para continuemos com a Internet livre e universal. Deixar que governos e/ou empresas regulamentem a neutralidade pode ser um grave perigo para a rede, uma vez que apenas interesses econômicos e de controle serão os motores desta regulação.
No primeiro vídeo falo do conceito e da importância de separar o serviço de telecomunicações do serviço de valor adicionado, no Brasil por exemplo as empresas de Telecomunicações jamais deveriam poder prover acesso, mas como o fazem, querem agora através de um discurso leviano passar a mensagem de que nunca houve estas duas camadas, e isto justifica por exemplo o esvaziamento do CGI.BR que é o orgão normatizador responsável pela camada de valor adicionado. No Brasil esta distinção foi estabelecida pela Norma 4/95 da ANATEL. O atual Ministro das Comunicações, o Paulo Bernardo, defende a mudança na Norma 4/95, mesmo sobre fortes críticas, uma vez que estas mudanças seguirem os interesses das empresas de Telecomunicações poderão trazer graves danos à Internet.
Coincidências a parte, a tendência em modificar dois importantes conceitos de governança: neutralidade e a distinção dos conceitos de valor adicionado e serviço de telecomunicações, parece fazer parte de um movimento global e local, a própria ITU (UIT) agência da ONU responsável pelas telecomunicações esta desde fevereiro discutindo a portas fechadas mudanças no ITR, o regulamento global de telecom. Do que a sociedade civil já sabe, questões muito arriscadas tem surgido, inclusive a tendência de trazer a governança para debaixo dos governos. A consolidação desta discussão se dará em dezembro em Dubai, e ativistas do mundo todo estão preocupados com os resultados, uma vez que o ITU discute basicamente com representantes dos governos, e não envolve outros atores da sociedade em seus debates. De forma preocupante vemos que esta tendência não esta ocorrendo apenas no Brasil e na ITU, nos Estados Unidos, o FCC por enquanto declinou de reclassificar a Internet como serviço de telecomunicações, mas ainda há risco. Resumindo parece estar havendo um movimento global para substituir o modelo multisetorial de governança, consolidado mundialmente como o melhor modelo, por um modelo focado apenas numa parceria entre o governo e as empresas de telecomunicações.
O Brasil possui um grande trunfo nesta luta que é o Marco Civil da Internet, considerado pelo Tech Dirt como um projeto de lei Anti-ACTA, e na verdade o Marco Civil pode nos proteger contra a maioria das ameaças, ou nos entregar de bandeja, tudo depende da redação que irá se tornar lei. Ciente disto o Ministro Paulo Bernardo em parceria com as Empresas de Telecomunicações fizeram um forte lobby e conseguiram esvaziar a sessão que iria vota-lo na Câmara dos Deputado no último dia 11/07. Ainda com base na redação mais recente, a regulamentação da neutralidade por decreto precisa ser mais bem detalhada, pois pode abrir uma brecha para a presidência simplesmente delegar esta função à ANATEL, através de decreto.
Ao que parece, o establishment tem pressa, muita pressa, pois eles sabem que seus argumentos e discursos envelhecidos não irão encontrar eco frente à geração digital, que os interpretam da mesma forma como interpretamos o discurso dos “caçadores de bruxas” da Idade média. O ano de 2012 é o ano onde milhões de nativos digitais completarão 18 anos, e esta onda seguirá ano apos ano até que uma nova cultura possa se estabelecer… será que vai levar tanto tempo?
Uma tese é que ao mesmo tempo em que as corporações e governos se mobilizam em um movimento transnacional para controlar a Internet, a sociedade civil se mobiliza para resistir, o aquecimento desta tensão poderá antecipar o fenômeno da Singularidade das Multidões, trazendo à sociedade conectada uma capacidade cognitiva e coletiva jamais imaginada, provocando em curtissimo espaço de tempo profundas mudanças na sociedade, incluindo a quebra em massa de velhos paradigmas e a instalação de novos valores, vivenciaremos um choque geracional tão intenso que representará uma ruptura no que hoje entendemos por sociedade, economia, cultura e política.
Hoje vejo a velha roda do lado de fora da gaiola e fico pensando, para que fui fugir da gaiola?…
Olho para o lado vejo hamsters felizes girando a roda como se não houvesse amanhã, suas gaiolas, muitas douradas são equipadas com um monte de tralha, quanto mais bonita e vistosa a gaiola, mais rápido gira a roda. Impressiona ver o hamster cansado se jogar da roda no sofá e ligar o Imbecilizador, onde uma programação audiovisual o leva para um mundo de sonhos e consumo, que mostra o quanto é bom consumir, consumir, consumir… Veja como são belos e felizes os hamster consumistas, veja só aquele hamster do lado, diz a esposa, eles tem um cagador turbo, grande e confortável, e nos aqui neste cagador pequeno, você não tem vergonha não?!
Vendo isto o hamster olha para o relógio e pula na roda de volta e corre como se fosse alcançar o próprio rabo, um desespero por um cagador… Chega finalmente o cagador novo na gaiola de nosso amigo hamster, um hamster sério e trabalhador que não tem tempo para muita prosa. Hoje é domingo, e o hamster vai tomar uma cervejinha e ver um futebol, afinal ele merece. Chega em casa bêbado e acorda de ressaca com a cabeça latejando toma um “estupidex” e vai para a roda, gira como ninguém, mas dai começa a pensar, para que pensar??? O hamster para, toma uma birita a volta para a roda, acha o maior barato girar junto com ela, toma outra e decide girar a roda ao contrario e logo toma um esporro do Bank hamster. Como assim, girar ao contrário, você tem noção do perigo que é ser diferente? Consuma, consuma! O bom e nobre hamster volta a girar a roda novamente, a esposa hamster respira aliviada, pois já esta pensando em pintar a gaiola de ouro. O cagador turbo já “orkutizou”, chique agora é ter a gaiola dourada, é o novo conceito em moradia diz a esposa hamster. Conceito do caralho! Resmunga o marido hamster pensando em como foi divertido girar a roda ao contrário, ria da cara do Bank hamster.
Neste domingo foi diferente, o hamster não foi tomar cerveja e nem assistir futebol, ficou apenas contemplando a roda pensativo… Preocupada a esposa hamster o reprimiu: Você não sabe que pensar é perigoso?! Em seguida ligou o Imbecilizador para tentar distrair o marido hamster, este bateu a porta e saiu sem dizer para onde ia. Mais tarde ele voltou com um livro debaixo do braço: “A roda” de Hamster Max. A esposa hamster aos prantos ajoelhou na frente do marido e implorou para que ele devolvesse aquele livro, ela lembrou o fim trágico de todos que provaram daquela droga. Olha a miséria meu amor, eles abandonaram a roda e ficam debatendo e estudando o tempo todo, nem mesmo possuem uma roda na gaiola, quando muito uma gaiola, são uns verdadeiros perdedores! A esposa implorou e o marido fingiu aceitar. Mais tarde ele pegou as ferramentas e montou um dispositivo na roda, agora ele pode pedalar e ler enquanto faz a roda girar, a esposa morria de vergonha afinal os maridos das amigas dela corriam elegantemente dentro da roda, já o nosso hamster parecia um pensador pedalando e debochando…
Nosso hamster saiu novamente e comprou livros e mais livros, lia e pedalava sem parar, a pobre esposa não sabia mais onde enfiar a cara. O hamster comecou a pensar novamente, a esposa coitada, não podia comprar aquela ração “premium plus ultra du kacete”, teve de comer milho. O nosso hamster, resolveu sair e bateu de gaiola em gaiola convocando os vizinhos para conversar sobre uma idéia que ele teve.
No dia seguinte a esposa hamster acordou assustada pois tinham um monte de hamster na frente da gaiola, e o marido falou, fica calma vamos nos mudar, e começaram a alinhas as gaiolas, colocando uma ao lado da outra, mas o pesadelo estava por vir…. bom pelo menos para a visão consumista da esposa hamster, para o nosso heroi um sonho sendo posto em prática… Ela comeca a ver que os outros hamsters estavam retirando a roda de suas gaiolas e colocando na frente e enchendo de terra…. chegam na gaiola de nosso hamster e ele encontra a esposa de malas prontas, dizendo você decide: ou a roda ou eu! Não preciso dizer que a Sra Hamster teve de ir para a casa da mãe dela. Enquanto isto os hamsters plantavam nas velhas rodas nosso heroi havia criado uma comunidade capaz de suprir-se sem a necessidade de girar a roda indefinidamente, ele percebeu que consumia um monte de bobagem inúteis, que na pratica ele não necessitava. O Imbecilizador foi trocado por um Inteligentador conectado na Internet. Pouco a pouco a idéia maluca de nosso heroi peludo foi sendo disseminada, o tempo vago agora era preenchido com leituras, debates e a produção de conteúdo para seus blogs, sem contar que tinham tempo de fazer o mais importante, de compartilhar amor e afeto e ver os filhotes crescerem e participar disto, sem ter de terceirizar com babas e escola como no passado.
Mas o Bank hamster não estava gostando nada disto, as redes de imbecilização falavam diariamente dos perigos da Internet e do compartilhamento. Precisavam calar os hamsters revolucionários! Os Bank hamsters discutiram várias estratégias e começaram a coloca-las em prática, primeiro junto com a rede de imbecilização tentaram confundir as pessoas. Diziam que os hamsters revolucionários eram produtores de “ratotóxicos”, e em nome da segurança trabalharam o mito de que as sementes plantadas em casa eram perigosas e poderiam ate mesmo produzir alucinações, por isto quem as consumia eram diferentes, agiam diferente, pensavam! Não colou! Muita gente estava trocando o Imbecilizador pelo Inteligentador e viram que a rede de imbecilizacao estava mentindo. Maldita Internet pensavam os Bank Hamsters, temos de eliminar a concorrência!
Os velhos e gordos Bank hamsters reuniram se em seu covil para discutir formas de parar estes hamsters revolucionarios. Chegaram a conclusão de que o maior perigo não eram aquelas tribos de hamsters “sem rodas”, poder estava mesmo é na Internet. Descobriram que os hamsters comuns usavam seus inteligentadores conectados à interner com a mesma eficiência dos imbecilizadores e sua rede decadente.
Perceberam que apenas os velhos hamsters, eram os poucos ainda controlados pelo sistema de imbecilização. Iniciaram a mais implacável campanha contra os Inteligentadores e a Internet, inventaram o “vicio em internet”, e para dar consistência ao factóide mostravam hamsters que haviam abandonado a roda por causa da Internet. Mostravam hamsters esclarecidos como sendo uma terrível consequência do excesso de informação, teve ate mesmo o Hamster Keen que escreveu um livro criticando os “sem roda” conectados, tentando provar que o modelo imbecilizante era melhor.
Vendo que não estavam surtindo efeito, os Bank hamsters se reuniram novamente, desta vez teremos de ser mais efetivos, temos de pensar numa forma de usar dogmas inquestionáveis para ter motivos para controlar a Internet, e dai surgiram os “maleficios” da rede foi um tal de falar em pedofilia e que hamsters velhinhos perdiam suas economias por causa de golpes virtuais. Isto parece ter colado, mas será o benedito que ninguém parou para pensar que não existe pedofilia na Internet, e que os velhinhos são vitimas do desconhecimento e não da Internet. O que tem na Internet é pornografia infantil, resultado de um crime de pedofillia cometido em algum lugar, combater a pornografia infantil somente não vai resolver o problema. A Universidade de Hamstarvard fez um estudo mostrando que o aliciamento de menores pela Internet era insignificante, e mesmo assim as vitimas em geral já foram vitimas de aliciamento presencial. A culpa não era da Internet e sim dos pais hamsters, que so se preocupavam em rodar a roda, e terceirizavam a criação dos filhotes! Se não fosse isto teriam tempo de conversar com seus filhotes para orienta-los na Internet, mas como se eles mesmo não sabem usa-la?
Os Bank hasmters estavam conseguindo avançar, disseminaram medo, incertezas e dúvidas. Novas leia para “proteger” os filhotes e o hamsters velhos surgiam, e eram combatidas pelos “sem rodas”, que passaram a usar a rede como um canal de contra-informação.
Mais uma vez os Bank hamsters se reuniram no covil, desta vez decidiram montar um verdadeiro plano de guerra, contrataram os melhores especialistas em Internet para desenvolver suas estratégias, perceberam que tinham de atuar em novas arenas, pois na legislativa era complicado, pois os “sem roda” sempre conseguiam ser ouvidos. Descobriram que regulamentar era mais fácil do que legislar, pois regulamento não precisa ser debatido. Mudaram de foco, na verdade abriram outras frentes, descobriram a governança da Internet, agora precisavam de uma forma de centraliza-la, assim tomariam o controle da Internet antes mesmo que os “Sem roda” pudessem fazer alguma coisa. E assim decidiram juntar esforços com as empresas de telecomunicações, dando a elas mais lucro em troca de mais controle da rede. Só bastava agora colocar o plano em prática.
Bank hamsters do mundo todo decidiram formar acordos internacionais para controlar a Internet, o controle é importante contra os “sem roda”. Redes sociais encantadoras foram cooptadas por reunir milhares ou até milhões de hamsters, formando verdadeiros jardins murados…. uma vez posicionados, em todas as arenas, os planos foram postos em pratica de forma simultânea, como se fosse uma verdadeira guerra, uma guerra desproporcional e com o objetivo de controlar o que antes era livre, uma guerra que tem por objetivo perpetuar o modelo da roda, o modelo que já não faz mais sentido. Não tem logica girar a roda continuamente, não queremos mais isto, fala o hamster revolucionario. Os ataques dos Bank hamsters são implacáveis, ao ponto do nosso revolucionário olhar para o lado e pensar: Quero voltar a ser um hamster burro, lobotomizado, não porque eu concorde com isto, mas porque já estou cansado desta guerra insana. Ao mesmo tempo percebe que sua mente não é mais a mesma, que agora ele é dono da própria subjetividade, e uma verdadeira dissonância cognitiva toma conta de seu corpo e sua alma, que o captura de seu momento de vacilo, para retornar a luta, a construção de um ideal, de um novo mundo do mundo dos hamsters sem roda….
Nota: Este texto foi criado num momento em que eu estava com um bloqueio de escrita, e brincando no Twitter produzi este texto, em pequenas pilulas de 140 caracteres em poucas horas.
Ao pensarmos em multidão imaginamos o caos, desorganização, confusão, contra produção. Assim foi por muitos anos no espaço da racionalidade. Práticas educacionais e corporativas buscaram na padronização o caminho para o progresso, alinhados à cultura da produção em massa da Revolução Industrial. Até mesmo o lema da nossa bandeira: Ordem e Progresso; parece nos remeter a esta lógica, uma lógica profundamente entremeada nos valores e princípios da sociedade do século XX. Praticamente uma verdade absoluta e intangível que serviu de base para a construção das estruturas sociais e organizacionais até então conhecidas: Hierarquia vertical, comando em cascata, broadcasting e o gênio solitário.
No final do século XX, os EUA abriram a Internet à humanidade, até então uma infra-estrutura tecnológica em rede que servia para a comunicação e armazenamento de dados entre acadêmicos e militares. Tim Berners-Lee adicionou à esta camada uma nova camada de comunicação, a WWW. A apropriação da WWW livre e a consolidação dos conceitos de usabilidade e acessibilidade, pavimentaram o que hoje chamamos de web 2.0. Se observarmos “fora da caixa”, tudo que evoluiu na verdade configurou na redução da curva de aprendizagem, e consequentemente facilitou enormemente o acesso, tornando as camadas tecnológicas da rede invisíveis. A partir dai a Internet transformou-se em uma rede de pessoas, iniciando um processo sem retorno de profundas mudanças em todas as esferas da sociedade.
Crowdsourcing, as multidões fazendo acontecer
O Software Livre é sem dúvida nenhuma o caso mais notável de crowdsourcing. É uma construção caótica de software, com uma organização sem lideres, e sem hierarquias, jogando por terra valores e princípios “inegociáveis” do século passado. Muitos ainda não entendem como é possível produzir desta forma, outros tantos nunca irão entender, pois teriam de destituir-se de velhos e sedimentados princípios e valores, e muita gente não esta disposta à isto. Ainda são do tempo do “Em time que esta ganhando não se mexe”, azar o deles? Não, esta resistência à mudança tem sido a mola mestra do ACTA e outras práticas daninhas à rede como o AI5 digital. Estes neoludistas enxergam a Internet como uma ameaça, e nós como uma oportunidade única. Estamos em rota de colisão.
A nosso favor estão as pessoas de mente aberta, como o Rob McEwen CEO da GoldCorp, uma mina de ouro Canadense, que em 1999 estava à beira da falência. Depois de encantar-se pelo espírito livre e desbravador do Linux, que ele assistiu em uma conferência no MIT. Apesar de seus funcionários e especialista dizerem que não era mais possível extrair ouro da mina, ele acreditou que alguém poderia ter a solução. McEwen criou o concurso Goldcorp Challenge, que prometia distribuir U$575.000 aos que tivessem as melhores idéias para extrair ouro. Rob compartilhou dados secretos, como plantas, mapas, estudos e tudo mais que fosse necessário. O resultado do concurso foi fantástico, além da economia, equivalente a três anos de funcionamento, foram identificados 110 pontos de extração, e metade deles jamais haviam sido identificados pela Empresa. A GoldCorp pulou de um faturamento de U$ 100 milhões por ano para U$ 2 bilhões.
O caso da GoldCorp é emblemático porque é um caso que os analógicos entendem, é um exemplo incontestável do poder das multidões. Outros casos interessantes estão se construindo à nossa volta, como os diversos projetos de crowdfunding, onde indivíduos investem e decidem coletivamente como o capital será aplicado. A Wikipedia é outro caso fantástico, bem como as próprias redes sociais, elas não são nada sem nossa participação, sem nos o Facebook, Orkut, Youtube e outros não seriam nada, apenas uma boa idéia. E o mais incrível e que continuamos a agregar valor à estas redes, pois não visamos o retorno material, nossas motivações são outras. O documentário Us Now nos mostra vários casos de crowdsourcing, até mesmo um time de futebol, o Ebbsfleet united, com mais de 30 mil donos e técnicos que decidem de forma colaborativa até mesmo a escalação do time. Us Now também mostra exemplos de auto-organização que apontam para novas formas de governo, de democracia participativa.
Na esfera do governo, temos projetos inovadores no Brasil, como as consultas públicas do Marco Civil da Internet , Reforma da Lei de Direito Autoral e outras. Estas consultas foram feitas de forma livre à população pela Internet, um caso digno de registro de crowdsourcing no processo legislativo. Por falar em processo legislativo, temos também no Brasil o e-Democracia, uma rede social ligada à Câmara dos Deputados, que permite discutir temas em destaques e propor novos temas para debate. Ainda não temos nenhum projeto de colaboração como o Challenge Americano, onde diferentes órgãos do governo, apresentam problemas à sociedade e recompensam financeiramente àqueles que apresentam as melhores soluções.
O Crowdsourcing.org é uma rede social especializada no crowdsourcing, e identifica basicamente sete grupos de estudo do tema:
Crowdfounding – Financiamento coletivo;
Cloud Labor (Trabalho em nuvem) – Aproveitamento de grupos virtuais de trabalho, disponíveis sob demanada para a realização de tarefas e projetos;
Collective Creativity (Criatividade coletiva) – Uso de grupos de talentos para desenvolvimento original de arte, design, mídia e conteúdo;
Open Innovation (Inovação aberta) – Uso de fontes externas à entidade ou grupo para gerar, desenvolver e implementar ideias;
Collective Knowledge (Conhecimento coletivo) – Desenvolvimento de células de conhecimento e informação a partir de grupos distribuidos de colaboradores;
Community Building (Construção de comunidades) – Desenvolvimento de comunidades através de grupos que compartilhem das mesmas paixões;
Civic Engagement (Engajamento cívico) – As ações coletivas que tratem de questões de interesse público.
Como vemos, ainda estamos começando a usar o poder das multidões, as pessoas estão começando a entender que juntas possuem um poder ilimitado, que não dependem dos intermediários e representantes. Governos e corporações também estão entendendo…
Individuo coletivo
Nos meus tempos de criança acreditávamos na figura do gênio solitário, filmes e desenhos animados nos mostravam cientistas isolados do mundo e acompanhados de um assistente burro, uma bela metáfora. É impressionante, mas hoje em dia muita gente ainda acredita no gênio solitário, tivemos nossas subjetividades subjugadas como sempre. Felizmente o mito do gênio solitário esta sendo derrubado nos tempos digitais do século XXI, avise aos “analógicos” da sociedade! Scott Berkun, ex-engenheiro da Microsoft, em seu livro “The Myths of Innovation” joga este conceito por água abaixo, e de quebra ainda enterra a idéia de que grande inovações vieram por epifania. Berkun explora uma questão muito importante, e que nos simplesmente sublimamos: Não estamos sozinhos, o ser humano é um ser social. Seja qual forma as idéias irão tomar, se produto material, imaterial ou bem cultural, elas são da coletividade. As idéias são construídas em coletividade, o “dono” dela tem sido aquele que consegue sistematiza-las ou utiliza-la para um propósito específico. O legado do século passado ainda insiste no fato de que as idéias são do primeiro a registrar a sua patente.
Somos parte da multidão, somos construtores da subjetividade coletiva, assim como nossa subjetividade é produto desta construção. Para ser mais correto, podemos afirmar que somos prosumidores de nos mesmos e ao mesmo tempo de todos nossos peers, que também são nossos prosumidores. No século passado isto era entendido pelo provérbio que dizia que “o homem é produto do meio”, mas o meio mudou, e o provérbio mostrou-se incompleto. Hoje podemos dizer que “o homem é produto do meio e o meio é produto do homem”, isto num ciclo crescente de construção cognitiva e coletiva do conhecimento. Quanto mais conectada a sociedade, mas visíveis ficam velhos conceitos que estão sendo subjugados, estamos quebrando velhas regras com uma voracidade incrível. Hoje entendemos que somos feitos de células, e a nossa “alma” de colaboração. É preciso entender que somos todos “eu” coletivo, que carregamos em nos um pouco de cada um, e vice versa.. Isto vale para tudo, saber, negócios, política e informação, ninguém é alguém sozinho. É preciso entender que o conhecimento pertence à sociedade, e que esta, e somente esta, tem a capacidade e o direito de transforma-lo de forma nunca antes imaginada na história da humanidade.
Os seis graus que nos separam
O importante fator das profundas e definitivas mudanças que estamos passando em nossa sociedade é o fato de estarmos novamente conectados em rede, novamente porque muito provavelmente estivemos conectados em rede quando ainda selvagens. A natureza irracional e burra esta repleta de exemplos de estruturas em rede, colméias, formigueiros, movimentos dos mares, planetas, e até mesmo nossa estrutura celular e neural! O homem civilizado cometeu um grande equivoco ao confundir a seletividade evolutiva com a organização estrutural das diversas sociedades, aprendemos equivocadamente que necessitamos de uma estrutura de poder vertical, poucos pensam e muitos executam, mais uma bela metáfora do capitalismo. Estão sempre buscando lideres em tudo…
Albert-László Barabási é um estudioso de redes, matemático, sistematizou esta estrutura e conseguiu provar matematicamente a teoria dos seis graus de separação. Segundo Barabási, apesar de seremos milhões conectados em rede, estamos de fato, distantes de qualquer outro por apenas seis pessoas. Barabási explica que as estruturas de redes são complexas e os hubs são indispensáveis ao funcionamento destas estruturas. Hubs por exemplo são indivíduos com alto capital social, ou sites e serviços populares. Os hubs são atalhos entre os milhões de nós da rede, de qualquer rede.
Fritjof Capra, compila no livro “A Teia da Vida”, várias contribuições da física, da matemática e da biologia para a compreensão dos sistemas vivos e, especialmente, de seu padrão básico de organização. Capra identifica a rede como esse padrão comum a todos os organismos vivos. “Onde quer que encontremos sistemas vivos – organismos, partes de organismos ou comunidades de organismos – podemos observar que seus componentes estão arranjados a maneira de rede. Sempre que olhamos para a vida, olhamos para redes. (…) O padrão da vida, poderíamos dizer, é um padrão de rede capaz de auto-organização”. Em seu livro “As Conexões Ocultas”, Capra tenta aplicar os princípios apresentados em “A Teia da Vida” na análise de fenômenos sociais – como o capitalismo global, a sociedade da informação, a biotecnologia e os movimentos contra-hegemônicos da sociedade civil.
A singularidade será das multidões
Conforme a Wikipedia, singularidade tecnológica é a denominação dada a um evento histórico previsto para o futuro, no qual a humanidade atravessará um estágio de colossal avanço tecnológico em um curtíssimo espaço de tempo. Vários cientistas, entre eles Vernor Vinge e Raymond Kurzweil, e também alguns filósofos afirmam que a singularidade tecnológica é um evento histórico de importância semelhante ao aparecimento da inteligência humana na Terra. Ainda não existe consenso sobre quais seriam os agentes responsáveis pela singularidade tecnológica, alguns acreditam que ela decorrerá naturalmente, como conseqüência dos acelerados avanços científicos. Outros acreditam que o surgimento iminente de supercomputadores dotados da chamada superinteligência será a base de tais avanços.
Na minha opinião a singularidade não será tecnologia, e sim das multidões, quanto maior a penetração da Internet na sociedade e quanto mais intensa for apropriação do crowdsourcing, mais rapidamente teremos as mudanças. Estas mudanças tenderão a ser de forma exponencial, não significa que mais um participante produza um incremento unitário, mas sim que este incremento leve em conta que o crowdsourcing é um processo retro-alimentando. Desta forma, nesta equação temos de considerar o que já fora construído e o potencial agregador e construtor do novo player, considerando inclusive seu capital social. Capital social este determinado em função da rede de relacionamento e do poder interativo e comunicacional deste indivíduo. Esta singularidade se dará na intensa construção cognitiva e coletiva do saber, potencializando ao máximo o conceito da Inteligência Coletiva sistematizado pelo filósofo Pierre Levy. Este fenômeno se dará possivelmente no momento em que a geração digital atingir a maturidade. Esta geração terá todos os conjuntos de afinadades, dogmas e valores para o processo pleno da construção e uso da Inteligência Coletiva, caracteristicas estas que nos imigrantes digitais não temos e nunca teremos, mas teremos o privilégio de vislumbrar o nascimento de uma nova sociedade infinitamente mais inteligente que a nossa, e profundamente interconectada, mudando radicalmente o mundo que conhecemos.
Uma vez entendido isto, podemos imaginar o tamanho do poder que a sociedade conectada poderá vir a ter, numa matriz dos poderes instituídos, este seria o quinto poder. Hoje temos os três poderes do Estado: Executivo, Legislativo e Judiciário que são poderes locais, e o quarto poder que é o corporativo que é enorme e transnacional e atualmente exerce uma enorme força sobre os Estados. Se levarmos em conta de que das 100 maiores economias do mundo, 51 são corporações. Dá para sentir o tamanho da força do quarto poder, eles simplesmente são mais poderosos que as nações. Entretanto o poder das corporações é avaliado em função do capitalismo, e da cultura da escassez. Douglas Rushkoff avalia que o capitalismo é na verdade o “sistema operacional” da sociedade, e que assim como ele no passado substituiu o “sistema operacional” vigente, nada impede que ele venha a ser substituído em breve, e a minha tese da singularidade das multidões prevê isto como citado no parágrafo anterior. Thomas Greco, em seu livro “The end of money and the future of civilization” coloca mais lenha na fogueira, mostrando que o modelo capitalista é auto-destrutivo e insustentável e que a partir da crise de 2008, a coisa só tende a piorar. Greco aponta na direção que estamos tomando. Mas o que virá depois do capitalismo? Segundo o Professor Giuseppe Cocco o que esta se construindo é o Capitalismo Cognitivo, uma forma de capitalismo que tem o conhecimento e a informação como principais riquezas e valoriza as competências cognitivas e relacionais.
Mesmo antes da troca do “sistema operacional” da sociedade, veremos o quinto poder chegar a um patamar de igualdade ao quarto. Se configurarem as previsões, as mudanças serão profundas e alavancarão o quinto poder como o maior poder da sociedade, ou seja, a própria sociedade conectada será o seu maior poder. Temos movimentos políticos e sociais acontecendo pelas multidões conectadas, o Mega Não e o Ficha Limpa no Brasil, 15-M na Espanha, o Stop Acta a nível mundial e troca de poder no Egito só para citar alguns. Os sinais estão por ai, e os envolvidos estão cientes e tomando suas providências, eles tem pressa. Em 2012 teremos a maior idade de uma parcela significativa da geração digital, eles tem pressa, muita pressa.
Rituais de magia branca de olhos azuis e amarela de olhos puxados ainda tentarão dar sobrevida ao defunto inutilmente. Seus comparsas, a mídia golpista (PIG) tentarão ocultar o cadáver, mas a sociedade conectada, o quinto poder, irão mostrar a todos onde esta o corpo fétido. O establishment irá negar enfáticamente sua culpa no assassinato:
– Foram os emergentes!
– Foram os emergentes!
Eles dirão na mais manjada estratégia Maquiavélica, afinal o Inferno são os outros ja dizia Sartre.
Seus orfãos, os Bancos e Mega Corporações irão tentar, através do legado da privataria promovida pelo neoliberalismo, instalar o “neocolonialismo“, tentando extrair vorazmente da turma de baixo suas riquezas. Entretanto o povo de baixo já não é mais tão subserviente ao império, e a queda 2.0 da nobreza colocará o mundo de cabeça para baixo.
O capitalismo cognitivo, onde as pessoas são o centro e não o dinheiro, vazara de baixo para cima, trocando o “sistema operacional” da sociedade como prefetizou Rushkoff, e veremos uma profunda e gratificante mudança na sociedade, onde o pensar e agir coletivo é a normalidade como bem diz Shirky.
A nota acima foi inspirada pelo infográfico da divida americana, que mostra a divida total de 114,5 trilhões de dolares. Segundo o infográfico, um cidadão médio levaria 92 anos para acumular U$ 1 milhão, logo seriam necessário que 114.500.000 de americanos trabalhem 92 anos para pagar a dívida. Como a estimativa de vida do Americano esta em 78 anos, uma regra de três simples nos leva ao número de 135.051.282 cidadãos, o que equivale a quase 44% da população daquele país. Some-se a isto a crise que assola a Europa, onde a dívida impagável da Grécia é apenas a ponta do Iceberg e veremos um quadro dantesco.
Thomas Greco em seu livro “The End of Money and the Future of Civilization” ja preconizava isto, afinal o capitalismo vive de endividamento, somos todos endividados e não prosperos como nos fazem crer. Estamos sempre trocando de dívidas, e isto leva a um ponto onde o endividamento se torna uma escala logarítmica, que tende ao infinito, promovendo uma verdadeiro “stall”.
Então prepare-se vamos entrar em uma grande turbulência, a aeronave vai cair, mas muitos sobreviverão…
Nota: Depois de publicar este texto aos sete ventos sem me certificar do valor da dívida americana, fui informado que ela é de U$ 15 trilhões e fui averiguar e vi que na verdade 114,5 trilhões de dolares é o valor emprestado a descoberto pelos bancos americanos, o que na prática acaba dando no mesmo. A figura acima mostra dois “edificios ao lado da estatua da liberdade, o menor é equivalente à pilha de cédulas de U$ 100,00 da dívida americana e o maior que o World Trade Center é o total do empréstimo à descoberto dos bancos americanos.