A espetacularização do combate à pirataria

Confesso que estava torcendo para que o processo movido contra o The Pirate Bay fosse um tiro na água, a industria de intermediação cultural precisava encontrar um freio, mas infelizmente a justiça Sueca considerou os donos do site culpados. Na verdade, conforme Ronaldo Lemos, a decisão aumenta o escopo dos direitos autorais e assim começa a passar por cima de direitos individuais, como a privacidade.

Assim como no caso do Napster, os resultados são muito mais negativos para a Industria de intermediação cultural do que os benefícios diretos de uma ação como esta, mesmo que os valores extorsivos e utópicos cobrados nestas ações fossem exequiveis, ainda sim, a balança penderia contra ela. Na verdade a intenção dos representantes da industria de intermediação cultural não é ressarcir-se do pseudo e majorado prejuizo, e sim a prática secular da execução em praça pública:

Execução em praça pública
Execução em praça pública

O objetivo de FOUCAULT, em Vigiar e Punir[bb], é descrever a história do poder de punir como história da prisão, cuja instituição muda o estilo penal, do suplício do corpo da época medieval para a utilização do tempo no arquipélago carcerário do capitalismo moderno. Assim, demonstrando a natureza política do poder de punir, o suplício do corpo do estilo medieval(roda, fogueira etc.) é um ritual público de dominação pelo terror: o objeto da pena criminal é o corpo do condenado, mas o objetivo da pena criminal é a massa do povo, convocado para testemunhar a vitória do soberano sobre o criminoso, o rebelde que ousou desafiar o poder. O processo medieval é inquisitorial e secreto: uma sucessão de interrogatórios dirigidos para a confissão, sob juramento ou sob tortura, em completa ignorância da acusação e das provas; mas a execução penal é pública, porque o sofrimento do condenado, mensurado para reproduzir a atrocidade do crime, é um ritual político de controle social pelo medo.
Juarez Cirino dos Santos (PDF)

É uma prática repressiva comumente utilizada pela Indústria de intermediação cultural, os “alvos” são criteriosamente escolhidos levando-se em conta o impacto e o potencial de marketing, dentro  desta estratégia a escolha do The Pirate Bay foi perfeita.

Entretanto esta prática tem surtido cada dia menos efeito, questões como ética e honestidade vem sendo colocadas em xeque por quem deveria dar o exemplo, e como já previa o Manifesto Cluetrain, as pessoas juntas estão ficando mais sabidas que as corporações, e consequentemente menos sujeitas às suas manipulações. As corporações já parecem saber disto, mas como os duendes de Quem mexeu no meu queijo[bb], tentam sobreviver no seu super ultra lucrativo modelo de negócios, que há muito faz água, na esperança de que um dia tudo voltará a ser como antes, nem que eles tenham de dar uma “ajudazinha”.

Curioso mesmo é o tamanho do poder que a Indústria de intermediação cultural possui, poder este que pretende ser ampliado pelo secretissimo ACTA. Mesmo levando-se em conta que quanto maior o mito midiático, maior a subserviência da sociedade e consequentemente maior o poder em combate-lo, ainda assim acho o poder da Industria de intermediação cultural desproporcional.

Na verdade existe um tremendo discurso hipócrita que começa no conceito de direito autoral, enquanto a manipulada sociedade acredita que o pobre músico passará fome se suas músicas forem pirateadas na Internet, o que ocorre é que há muito o pobre músico cedera seus direitos à gravadora. E dependendo do quanto “leonino” é este contrato, o músico deixa de ter qualquer autoridade sobre a sua obra intelectual. Pergunto ai quem é o maior vilão da história?

Na verdade a Industria de Intermediação cultural quer, além dos lucros imorais, é evitar que a sociedade se dê conta de que ela se tornara obsoleta, ou pior, quer na verdade eliminar o seu principal concorrente: Nós mesmos.

Publiquei este artigo também no Xô Censura e no Trezentos

Ensaio sobre a beleza

Venho desenvolvendo um trabalho de gerenciamento na reforma do Theatro Municipal, um belissimo edifí­cio histórico no centro do Rio de Janeiro, e ir ao centro para mim é uma eventualidade, e por ser fora da rotina é relativamente prazeroso. Costumo observar pessoas, o tempo todo, sou um observador nato, presto atenção em tudo que consigo: Nas pessoas, nos lugares, nos veículos, paisagem urbana, e tudo mais que estiver no meu campo visual, ou seria melhor dizer no meu campo sensorial? Afinal temos cinco sentidos para interagir com o mundo e obviamente um estimulo acaba chamando outro. Não costumamos cheirar o que vemos ou tentamos ouvir o que tocamos, muito menos tocar, o que na verdade gostarí­amos, e estamos vendo, mas estaríamos invadindo o espaço de outra pessoa, e isto deve ser consentido.

Definir o que é belo é uma missão complexa, o belo não pode ser associado apenas aquilo que vemos, pois afinal se fosse assim, os portadores de deficiência visual não teriam o direito de achar nada belo. A beleza é um atributo sensorial, o cego julga a beleza com o tato, com o olfato e a audição. Talvez definir que belo é aquilo que nos proporciona prazer sensorial, seja o mais próximo da definição efetiva que possamos chegar.

O cheiro agradável, o sabor delicioso, a textura suave, o som emocionante ou paisagem incrí­vel, são sinônimos de beleza, ou seriam os seus componentes?   O atributo sensorial é na verdade o chamariz, e um belo chamariz provoca uma reação em intensidade proporcional, atrai, chama a atenção, mas não é tudo, acho que a percepção da verdadeira beleza esta na conjunção dos sentidos, o que chamamos popularmente de “quí­mica”, algo como “rolou uma quí­mica” para justificar um intenso relacionamento.

Esta quí­mica é na verdade uma harmônica conjunção destes sentidos, uma mistura perfeita, que percebemos como a beleza. A complexidade é muito maior de que simplesmente a mistura sensorial, não se trata de alquimia, existem outros componentes como a emoção e o prazer que acabam retroalimentando esta percepção, percepção esta que varia de um indivíduo para outro.

Tentando ser mais claro, é como se a percepção do belo tivesse além do aspecto sensorial, o tempo, relacionamento e repetição. Analisando por ai temos que a percepção da beleza vai do evidente para o sutil com o passar do tempo. Isto explica por exemplo a preferência por alimentos doces e com consistência e sabor mais evidentes na infância e preferência por alimentos com consistências, docura e sabores mais sutis na fase adulta. Lembre-se que adolescentes escolhem seus parceiros por padrões meramente Aristotélicos, a beleza precisa ser evidente, ja o homem maduro percebe as mais discretas sutilezas na mulher, enxerga muito além das formas, é uma percepção muito mais elaborada. Isto não quer dizer por exemplo que o homem maduro não seja atraido pela beleza Aristotélica, mas isto deixa de ser a única regra, o fator tempo, repetição e relacionamento expandem a percepção do belo.

Esta lançada a questão, afinal, o que é a beleza para você?

Acessibilidade, a mesma mancada 10 anos depois

Há pouco mais de dez anos, tempo em que o ICQ bombava e a conexão era em 14.400 bps, uma turma de jovens entusiastas: Eu, o Nando Pereira, e a Keka Marzagão faziamos experiências com o Flash, alias era o que mais faziamos naquela época. Dai surgiu a ideia de criar um site em Flash para deficientes visuais, o projeto “Blindness”.

Era um projeto aberto, dentro do Flash Brasil, e todo mundo poderia participar, a interface era negra e com molduras duplas sensiveis, que se acionadas no sentido de fora para dentro, a gravação da voz de minha irmã falava: – Entrando, caso contrário falava : – Saindo. Na época, o Flash não suportava MP3, nem mesmo video, fizemos uma montagem com o Real Flash, onde o Flash através de artifícios executava um audio no formato Real Audio. Quadrados com gravações em audio davam as noticias.  Na época, em 1997, nem se falavam em usabilidade e acessibilidade e la estavamos nos orgulhosos de nossa obra, que no nosso ver extendia os tentáculos da web aos portadores de deficiência visual. Estávamos fascinados e prontos para anunciar ao mundo nosso projeto genial.

Mas antes disto, o Nando Pereira sugeriu fazermos alguns testes de campo, e foi atrás do pessoal da UFRJ do Intervox, que entendiam do assunto, foram eles os desenvolvedores do DOSVOX, programa de leitura de tela, e muitos eram portadores de deficiência visual. A primeira resposta que o Nando recebeu não fora muito animadora, os portadores de deficiência visual não usam o mouse, o mouse é um dispositivo de apontamento, e para apontar é preciso ver, de forma que eles utilizam basicamente o teclado, uma vez que mesmo que o teclado não possua recursos de braile em suas teclas, a posição das mesmas nunca muda, facilitando a memorização.

Tendo em vista o enorme erro que cometemos, a unica saida era senão, abandonar o projeto, que apesar de muito bacana, não tinha funcionalidade prática alguma para o público alvo, os portadores de deficiência visual. O projeto ficou algum tempo disponível no site, como um case de equivoco, e depois simplesmente o tiramos do ar.  Tal equivoco nos serviu de lição, eu vivo falando destas mancada em minhas palestras, falei dele até na classica palestra da Dinastia do Flash no Brasil que proferi online em 2006.

Para minha surpresa, recebi um email do meu amigo Caparica, onde o Jornal da Paraíba apresentava uma interface bem parecida com a do defunto projeto Blindness, incrédulo fui conferir e verifiquei que haviam resucitado o monstro, só que agora provido de mais recursos, tais como sintetizador de voz e menu alfabético. Onze anos se passaram, e conseguiram repetir a mancada!

O projeto do Jornal da Paraíba, foi anunciado no próprio jornal como inovador, bom alem de não ser inovador como ideia, também não é inovador como mancada, afinal ja haviamos cometido a mesma besteira em 97.  Mas veja o que falam na noticia:

[..]O Jornal da Paraíba lança mais um projeto inovador: a primeira edição digital para deficientes visuais do país. A novidade, que será lançada na quarta-feira (8), a partir das 8h no Garden Hotel, em Campina Grande, vai disponibilizar diariamente o conteúdo completo do jornal através de um recurso multimídia que oferece aos deficientes visuais a oportunidade de ouvir as notícias na íntegra, da mesma forma que são publicadas na versão impressa. Uma iniciativa pioneira que deve facilitar a vida de mais de três milhões de pessoas com limitações visuais no Brasil.[..]

[..]O coordenador de Métodos e Sistemas do JORNAL DA PARAÍBA, Washington Lima, responsável pelo desenvolvimento do projeto, conta que a tecnologia do sistema foi toda elaborada na própria empresa com o objetivo de apresentar à sociedade um produto que permitisse ouvir as notícias a partir de uma tela com leitura eletrônica.

“O setor de desenvolvimento criou uma tela sintetizada que emite sons a partir do movimento do cursor, denominado módulo de leitura eletrônica. Através deste recurso, o mouse passa a ser fundamental para quem quer se atualizar via internet, mas não tem visão ou não teve oportunidade de aprender a ler”, explica Washington Lima sobre o mais novo projeto de responsabilidade social do veículo.[..]

Acho que erraram nos dois alvos, o portador de deficiência visual não utiliza mouse e o analfabeto não saberá ler os botões.

O grande MAQ, Marco Antônio de Queiroz, o chamo de grande, pois é uma pessoa espetacular, um exemplo de determinação e persistência para contornar os obstáculos que a vida colocou no seu caminho, é um consultor em acessibilidade, e portador de deficiência visual. Quando inicia suas aulas de acessibilidade, a primeira coisa que ele manda fazer é tirar os monitores e mouses dos laboratórios.

Meu amigo Caparica, alem do link para a “novidade” do Jornal da Paraiba, ainda me mandou um link para um tópico no Forum Acesso Digital, e eis que encontro uma mensagem do MAQ a cerca do projeto:

[..]Nenhum cego tem a experiência de entrar no Windows ou Linux sem ativar seu leitor de telas, pois estaria inteiramente perdido sem ele. Assim, o fato de contarem que nós entremos no jornal sem o nosso software já é algo inteiramente fora do padrão. Se um de nós estivermos em uma lan house, sem nosso leitor de tela em um pen drive, como chegaremos até o jornal, mesmo que neste já haja sintetização de voz? Somos dependentes da navegação via teclado em conjunto com nosso leitor de tela. Sem esse, ficaríamos dependentes de quem enxerga para chegar até o jornal. Lá no jornal, como os procedimentos para manipulação da sintetização, fundamental para nós, é toda diferente do que estamos acostumados, ou seja, por via do mouse, ficamos dependentes de alguém que enxergue para ir nos dizendo como fazer cada jogada, leitura, etc. Quem sabe os amigos não incluém em sincronia com o mouse, a navegação via teclado e, assim, o jogo e a leitura  poderiam ter um acesso universal?

Nenhum cego tem o costume de utilizar o mouse, nossa navegação é via teclado. Alguns de nós, nem mesmo tem mouse. Isso de não ter mouse e monitor é um radicalismo de alguns, alguns que moram sozinhos e tem como amigos, em sua maioria, pessoas também cegas. Mas, tudo bem, vamos que alguns se impolguem tanto que entrem na página do jornal, desliguem seus leitores de tela e comecem a manipular os comandos e sintetização do jornal. A curva de aprendizagem será enorme, pois toda ela é baseada na experiência de um usuário que enxerga, pois arrastar algo com o mouse clicando ao mesmo tempo é coisa que eu, por exemplo, desde 1995 na internet, nunca fiz com um mouse! No entanto, é coisa corriqueira para quem enxerga. Não seria mais interessante aproveitarem  a nossa experiência de teclado e criar um link que cada vez que déssemos enter o volume fosse aumentando?[..]

Pronto, e agora Jornal da Paraíba? Podia ter ficado sem este “mico preto” e ter economizado uma grana do lançamento do inovador recursos, para tal bastaria ter feito o que qualquer profissional de marketing, faria, estudar melhor o público alvo.

Entropia negativa e a crise existencial

O Orlando publicou um interessante post no Netnografando, repito aqui alguns trechos e comento a seguir:

[..] Na nossa luta diária pela sobrevivência quem alcança o poder para falar também tem o poder de calar. Blogueiros Profissionais estão fechando bons negócios, sendo contratados para iniciativas em Social Media, montando novas empresas, mas não blogam mais. [..]

[..] Constatei numericamente o que já vinha percebendo. O SimViral (11,4 posts por semana) é disparadamente o campeão dos blogs que acompanho. A maioria está na média de 4 posts por semana. Já a turma da Blog Content está assim: Inagaki (3,5), Edney (2,6) Ian Black (1,6), Gustavo Jreige (0,2).[..]

[..] Blogueiros Pró = Organizações; Google = Organização; Google = Entropia negativa; Entropia negativa = Blogueiros Pró. [..]

Uma ótima reflexão do Orlando, para mim ela tem várias leituras, é quase um manual de planejamento pessoal, deixa eu explicar:

Eu tive uma experiência de vida que segue o caminho inverso destas teoria, trabalhei por 13 anos em Engenharia, fazia projetos, acompanhava Obras no Rio e Costa Verde, viajava muito. Achava obra um saco, mas era o meu ganha pão. Na ansia de tornar meu trabalho “tragável” desenvolvi a técnica de enxergar o lado bom das coisas: Se tinha de viajar, levava a namorada, se tinha de ir à obra, ia cedo para “voar” de tarde e coisas assim. A minha busca por prazer onde só tinha desprazer me levou a construir uma gestão eficiente, descartando bobagens e vaporizando estratégias micro-políticas corporativas. Tudo me baseando numa filosofia que tinha numa placa que herdei de minha avó que dizia: “Se o destino lhe der um limão, faça uma limonada”

Voltando ao post do Orlando, um dos casos mais gritantes de entropia negativa ele não citou, que foi o caso do Fugita, ele praticamente desapareceu. Ele pode não estar percebendo, mas esta sofrendo um processo lento e gradual de queda no share of mind, e pior pode estar ficando desatualizado. Curioso é que como você falou, o corporativismo provoca esta entropia negativa.

No caso específico dos blogs pessoais destes blogueiros citados, eles serão suplantados por novos blogs, de novos blogueiros, seus fãns, ávidos por escrever e produzir conteúdo de qualidade, baseado nos blogs que eles idolatram.

Esta observação que o Orlando citou não é um caso isolado, boa parte da população parece sofrer da síndrome da entropia negativa no tocante ao prazer, por conta da entropia positiva no trabalho. Se levarmos para o lado social, os que já passaram dos 30 devem perceber que aos 20 viviam em intensa entropia, uma balada após a outra, novidades em sequência, puro prazer, a melhor fase de nossa vida, àquela que ficará para sempre em nossa memória. Depois vem a familia, o trabalho, filhos e quando percebemos trocamos de persona, aquele cara descolado virou um coroa careta. Quando tentamos contato com a nova juventude, percebemos que ficamos desatualizados, girias, conceitos, cultura, hábitos, tudo diferente, entramos em choque não sei se mais pela diferença cultural ou pela constatação que ficamos tempo demais afastados do “mundo”.

Este cenário pode se repetir em diversos contextos, seja ele profissional, educacional, pessoal, digital, não importa qual. O que importa é como o Orlando levantou, a existência de uma entropia negativa e que vai acabar provocando uma entropia positiva em outro extremo, seja isto bom ou ruim. O problema em si não está nesta transição entrópica, mas sim no tempo e na frequência que ela dura. Se ela fosse freqüente, não teríamos choques, se tivessemos condições de transitar com facilidade entre estes dois estados, melhor ainda.

Voltando para o exemplo corporativismo x blogs, ou profissão x lazer, podemos ver que algumas empresas perceberam não por esta ótica, mas costumam dar um tempo a seus funcionários, no Google 20% do tempo para projetos pessoais, uma empresa Brasileira (esqueci o nome) instituiu o “dia do endredon” onde o funcionário tem o direito de faltar um dia na semana. E contrariando todas as expectativas estes funcionários tornam-se mais produtivos.

Os alquimistas já diziam: A diferença entre o remédio e o veneno está na dosagem.

Pense nisto…

Mainstream x mystream e o cauda longa da comunicação

A dicotomia nova x velha midia esta tomando ares maniqueistas, e o pior, é uma comparação que não devia nem existir, é como comparar agua e óleo. A velha midia com seu estilo tradicional e corporativo acusa a nova mídia de amadorismo, e esta compara a velha midia com os dinossauros, e por ai segue um improdutivo desenrolar de alfinetadas. Enquanto a discussão levanta poeira, um importante exercício que citei no meu último post deixa de ser feito: “Temos de correr o risco de enxergar o que não queremos ver, e com isto ganhar o precioso tempo hábil para nos reconfigurarmos e seguirmos o trem da evolução, para não sermos pegos de surpresa e sermos atropelados por ele.

É preciso levar em consideração que uma grande mudança nas relações pessoais e econômicas foi provocada pela internet. Esta mudança foi sistematizada por Chris Anderson, em seu best seller “A Cauda Longa“. A internet possibilitou uma capilaridade nunca antes vista, atingindo nichos renegados e muitas vezes totalmente desconhecidos. A principio o estudo de Anderson provocou surpresa, mostrando a todos que a cauda longa é maior do que o mainstream, e engorda cada vez mais por conta daqueles que viviam no mainstream e agora podem se juntar às suas tribos. É preciso levar em conta que a imprensa tradicional esta focando no mainstream, e que a imprensa social na cauda longa.

Existe um outro elemento importante, que é a informação, abundante no ciberespaço, é o catalizador da evolução. O crowdsourcing é a personificação desta evolução. O cidadão conectado tem pressa, muita pressa, a instantaneidade é o resultado, ele quer saber agora, o que acontece agora, quer interagir com a noticia. O Jornalismo cidadão é visto como ruído pelo público mainstream, mas é extremamente eficiente para seus apreciadores, e isto a velha mídia precisa entender e estudar.

Existem outros elementos, temos de montar um cenário complexo para entender o que acontece e principalmente montar a estratégia para a reconfiguração da mídia tradicional. Eu não acredito que ela vá morrer, acredito sim, que ela em alguns anos não será nada parecida com que vemos hoje em dia.

A constante nas organizações modernas é a própria mudança

Uma imagem Sempre que nos defrontamos com fatos que ameaçam nosso status quo, buscamos comportamentos e fatos semelhantes no passado. Isto nos faz crer que estamos presenciando um “remake”, e de certa forma aliviam a ameaça. Ninguém esta imune a isto, é um comportamento comum, eu mesmo tentei negar para mim mesmo por dois anos, o estouro da bolha da internet. Spencer Johnson escreveu seu best seller “Quem mexeu no meu queijo[bb]“, que acredito eu, deva seu maior sucesso à identificação do leitor com seus personagens e sua história.

Sintetizando o livro “Sobreviver não é o bastante” de Seth Godin[bb], a mensagem que fica é “A constante nas organizações modernas é a própria mudança“.

Kotler cita em seu livro, Marketing para o século XXI[bb], que Akio Morita tinha uma estratégia de criar três equipes para todos seus produtos: Uma para o seu desenvolvimento propriamente dito, outra para desenvolver um produto melhor e uma terceira para torna-lo obsoleto. Esta saudável prática de canibalismo corporativo vem sendo sistematicamente evitada sob todos os aspectos, é utilizada apenas por empresas antenadas.

Em caso recente, no 4o Congresso de Publicidade, mudaram o nome do painel de “O modelo brasileiro de remuneração das agências de publicidade” para “A Valorização, a Prosperidade e a Rentabilidade da Indústria da Comunicação”.

Mas por quê isto tem de ser assim? Temos medo de mudar, e atacamos tudo que nos remete à esta necessidade, principalmente no Brasil, onde o empreendedorismo não é uma prática tão valorizada quanto um bom e seguro emprego numa estatal. Para quê mudar? Não se mexe em time que esta ganhando? Não mesmo ? Ou seria melhor dizer: Em time que esta ganhando a mudança é uma constante ?

Quando estamos nesta discussão, se a web é ou não o bicho papão que ameaça nossa tranquilidade, a minha opinião é de que primeiro temos de ser imparciais, e em seguida aumentar nosso ângulo de visão, ou como dizem os Americanos, ativar nossa visão de passaro. Temos de correr o risco de enxergar o que não queremos ver, e com isto ganhar o precioso tempo hábil para nos reconfigurarmos e seguirmos o trem da evolução, para não sermos pegos de surpresa e atropelados por ele.

Foto: Foto obtida no banco de imagens Stock.Xchng produzida por Zoran Ozetsky

Pérolas da cibercultura, um post que vale por um cursinho

Depois do meu último post, me convenci de que realmente precisamos de novas ferramentas e novos conceitos para entender o que esta acontecendo hoje no mercado da comunicação. Para isto decidi reunir e publicar aqui os links para as principais pérolas da cibercultura na minha opinião. São elas definições, conceitos, textos e até e-books completos.

Redes

O entendimento de redes no sentido mais amplo, e não técnico, é teoria fundamental para o entendimento de tudo na cibercultura. É necessário entender que somos “nós” desta rede, e que nossos grupos são “clusters” e que tudo em termos de rede possui comportamento em rede, com grande capilaridade e com grande entropia.

Um entendimento técnico necessário é o proprio conceito original da Internet, criada na época da Guerra Fria, sua estrutura foi concebida para resistir à um bombardeio atômico, e desta forma pavimenta o conceito hoje conhecido como Mundo de Pontas (World of Ends).

Uma boa dica para entendimento de redes é o e-book “Redes – uma introdução às dinamicas da conectividade e da auto-organização” publicado pelo WWF Brasil.

Comportamento

Uma das mais sensacionais pérolas do comportamento no ciberespaço é o Manifesto Cluetrain (O manifesto do trem de evidências) que trata de forma simples e direta o comportamento social e de consumo na Internet. Veja também o post “Cluetrain 10 anos depois” publicado no Buzz Makers.

Outro texto muito interessante é o Mundos em colisão, que narra de uma forma simpática o choque cultural que se reflete como a dicotomia “nova x velha mídia” ou “real x virtual” passando pelo contraste “Copyright x Creative Commons” com bastante propriedade. Por falar em Copyright x Creative Commons, um bom e-book sobre isto é o Cultura Livre (uma excelente tradução do Free Culture). A cultura open source faz parte do DNA do ciberespaço, já o habitava no seu núcleo, na sua camada técnica, e foi fundamentalmente o propulsor da WWW.

Por falar em Free, este será o novo livro do Chris Anderson, o autor do Cauda Longa. O Free promete ser um profundo estudo sobre a cultura atual, onde empresas lucram cada vez mais cobrando cada vez menos, ou até nada. Na Wired tem um PDF que já da uma ideia de como será o livro, mas se preferir pode ler na web mesmo.

Existem ainda os clássicos teóricos da comunicação como Manuel Castells e Marshal McLunhan que não podem ficar de fora.

Midias sociais

Não podemos deixar de falar da teoria dos seis graus de separação, que fundamenta diversas redes sociais, onde em sintese, você esta ligado à qualquer outra pessoa no mundo, por outras seis. Existem outras, inclusive a que descrevi aqui mesmo no blog, relacionando Maslow e as midias sociais.

O assunto não esgota aqui, é apenas um começo, mas te garanto que boa parte já foi citada, convido você à completar a lista ai nos comentários.

update 02/05 – O Marco Gomes fez um post sensacional, praticamente um manifesto, se você leu os textos acima com cuidado, veja a personificação do estudo no post: Eu faço parte da revolução

O novo geek e Maslow

Há vinte anos, o computador era um totem sagrado, que habitava o hermético e gelado santuário da tecnologia. Mouses ainda caiam em ratoeiras e interface gráfica,…., hein ? Era necessário aprender complexos comandos para fazer alguma coisa com estes computadores, e padronização era um nome feio, quase utopia. Na esfera da computação pessoal, nem mesmo sistema operacional os PCs tinham, ao ligar apenas o cursor do Basic piscava na tela. Jogos e programas vinham em revistas como a Microsistemas, mas não eram em CD e nem em disquete, eram códigos fonte para digitar! Quem entendia de computador eram caras esquisitos, que falavam coisas esquisitas e em geral eram a antintese do playboy, eles eram conhecidos por Nerds, ou Geeks.

Hoje em dia o computador virou suco, pulverizou-se, tornou-se ubíquo. Os novos geeks são sociáveis e conectados, usuários compulsivos de gadgets, e principalmente os que permitem esta conectividade. Como diz Scott McNealy, Chairman da Sun, “Era da informação é coisa do século XX, coisa do passado, ja estamos na Era da participação“. O novo geek esta sempre encontrando um bom motivo para uma boa socialização presencial, os primeiros bons motivos foram os Barcamps, e dai uma infinidade de “camps” surgem a cada dia, “botecamps”, “chopcamp”, “o bar do camp”, e por ai vai. Mas o mais interessante é que boa parte dos novos geeks brasileiros fazem esta interação on e off line, e muitas vezes viajam de um estado para outro para uma boa confraternização. Todas as confraternizações são cobertas em tempo real pelos participantes, e quem esta de longe muitas vezes chega a sentir que esta na mesa, participando dos papos animados, e desgutando um belo chopp, ou participando de alguma desconferência.

Os geeks continuam esquisitos, mas agora são uns esquisitos sociáveis e isto faz a maior diferença, o que aconteceu? Cadê aquele geek anti-social do século passado? Como explicar o que aconteceu? Alias o que aconteceu? Aconteceu alguma coisa? O que aconteceu foram mudanças, evoluções tecnológicas que foram sendo absorvidas e transformadas em ferramentas sociais.

O visionário digital do século passado era indispensávelmente da area tecnologia, hoje as características sociais estão tão intrissicamente ligadas à tecnologia, que os visionários digitais do século XXI certamente são ligados às areas humanas. Assim como a internet deixou de ser fim, para ser meio, a sua utilização se da cada vez mais por pessoas comuns.

Piramide de Maslow das midias sociais

Existem algumas teses que possuem ampla gama de aplicações, como a regra de Pareto, a curva de sino e porque não a pirâmide de Maslow para tentar explicar este fenômeno ?

No conceito original, a pirâmide de Maslow é utilizada de forma estática, ou seja, escala-se degrau por degrau, ou dinâmica, que dependendo da situação, pode-se transitar entre os degraus e até mesmo estacionar entre dois deles. Vamos adotar uma analise estática. Desta forma é simples, os dois primeiros degraus representam os patamares determinantes ao ingresso à midias sociais, e hoje em dia são rapidamente percorridos:

  • Conhecimento tecnológico – Hoje em dia, com interfaces cada vez mais intuitivas, o conhecimento tecnológico é um degrau irrelevante, facilmente transposto por qualquer um que tenha o minimo de conhecimento.
  • Conexão, acesso – Com o advento da inclusão digital e das Lan houses populares, e da queda nos preços do acesso banda larga, conexão e acesso estão faceis para muita gente.
  • Interação, participação – É o momento em que o usuário começa a interagir em midias sociais tais como redes sociais, foruns, listas de discussão, instant mensagers, e até mesmo comentando e/ou criando blogs. É o momento em que alguns usuários partem para a interação física, nos eventos geeks.
  • Estima, reconhecimento – Agora o usuário quer reconhecimento, inicia um blog, uma comunidade, ou até mesmo torna-se um usuário extremamente participativo nos foruns e listas de discussão. O usuário busca reconhecimento e investe pesado nisto.
  • Auto realização – Sua presença no ciberespaço está garantida, ele já é reconhecido, e tornou-se uma celebridade. É prosumer, faz parte de um ou mais nucleos sociais. Torna-se um compulsivo por mashups e redes sociais, tem perfis em quase todas, e por incrível que pareça consegue manter tudo atualizado. Neste momento existe por diversas razões o trânsito entre o degrau abaixo, é natural, pois manter-se no topo é infinitamente mais dificil do que chegar lá.

Esta é uma hipotese, esta aberto a discussão, vamos iniciar um estudo antropológico do ciberespaço ?

Folks Marketing e o jeitinho Brasileiro

Folks Marketing, ou Marketing Popular são estratégias de Marketing utilizadas pelos comerciantes populares. Um dos mais notáveis é o David, da Banca do David no centro do Rio de Janeiro, que se tornou um requisitado consultor de marketing.

Meu interesse pelo assunto, foi despertado quando percebei que a abordagem do vendedor de sinal de transito estava mudando do “Moço compra um pra me ajudar” para táticas mais especializadas:

Outro dia eu a a minha esposa paramos no sinal e fomos abordados com um simpatico sorriso do vendedor que falava algo. Abrimos a janela e ele logo mandou: Mas que lindo casal, parece a Julia Roberts com o Mel Gibson, longe disto, mas com isto conquistou nossa atenção e ofereceu sem muita dificuldade um produto que acabamos comprando. Pensamos, puxa vida, que cara criativo.

Dias depois, em outro sinal, muito distante do primeiro, uma vendedora nos abordou com a mesma tática, e a minha esposa perguntou: Onde voces estão aprendendo isto? A moça desconversou e se despidiu falando: A competição é grande, temos que melhorar sempre.

Lancei a discussão na comunidade Marketing no Brasil e a discussão foi produtiva, outros cases apareceram, como flores no retrovisor em Recife, ou do vendedor de protetor solar de Fortaleza que sabia todas as informações dos seus produtos, o engraxate de terno, celular e tapete vermelho que dobrou seu faturamento, e agora o barraqueiro em ipanema que mantem uma trilha refrescante até a sua barraca (foto abaixo).

Praia VIP

Ainda na discussão na comunidade Marketing no Brasil, Solon consegue provar que os empreendedores populares fazem uso do Mix de Marketing (4 Ps) completo. Vendo toda esta iniciativa, me animei em criar um grupo de voluntários de Folks Marketing dentro do projeto Perspectiva, com o intuito de criar metodologias para ensinar Folks Marketing para estes fantásticos empreendedores. Uma proposta bem interessante para estudantes e profissionais de marketing.

Este artigo eu publiquei originalmente no Blog Propaganda & Marketing